Capítulo XII - Uma nova vida

Cheguei ao Rio de Janeiro no dia 16 de julho de 1950. A cidade continuava linda como tinha deixado quase dez anos antes. Estranhei as ruas vazias e vi uma grande aglomeração em um bar. Cheguei perto para ver o que ocorria e tinha muitos homens em volta de um rádio, nesse momento lembrei que era dia da final da Copa do Mundo entre Brasil x Uruguai.
Cheguei sorrindo cumprimentando a todos e perguntando quanto estava o jogo. Nesse exato momento o locutor narrava que Gigghia ganhara na corrida de Bigode, tocou para Schiaffino e o Uruguai fez um gol. Um homem com cara séria disse que o Brasil vencia por 1x0 até eu chegar e perguntar. Sei lá, mas parecia que ele me culpara por aquele gol. Sorri e disse para não se preocuparem porque o Brasil jogava pelo empate.
O jogo continuava tenso e eu tentando animar o povo falando palavras otimistas. Eles não pareciam muito felizes com minha presença nem meus comentários. Tentando aliviar minha situação comentei que o Brasil não perderia aquele jogo, seria campeão do mundo porque tinha um grande time a começar pelo goleiro Barbosa que era o melhor do mundo.
Assim que fiz o comentário elogiando o Barbosa aos 34 do segundo tempo Gigghia novamente ganhou de Bigode e em vez de cruzar chutou e fez o segundo gol uruguaio com falha do Barbosa. Todos me olharam eu dei um sorriso sem graça e comentei que ainda dava pra empatar. Mas não empatou, o jogo acabou o Brasil perdeu a copa e um clima de funeral tomou conta do bar e o clima só foi quebrado pelo doido idiota aqui.
O idiota em vez de ficar quieto comentou “ah gente, vamos parar de drama, afinal foi só um jogo de futebol”. Nunca corri tanto na minha vida, os homens atrás jogando garrafas em mim se revezavam nos gritos de “pé frio dos infernos” e “uruguaio filh.. da put..”
Minha volta ao Rio de Janeiro não começava bem. Mas mesmo assim decidi fazer um passeio pela cidade, mais tarde fui a outro bar.
Estava tomando minha cervejinha quando entraram vários homens alcoolizados fazendo muita festa. Não entendi muito que falavam porque se comunicavam em espanhol. Até que prestando mais atenção entendi que comentavam lances da partida. Olhei e tinha uma taça de campeão na mesa, era a seleção do Uruguai. Totalmente bêbado cheguei à mesa deles e parei para olhar. Eles me olharam então falei “seus uruguaios filh..da put.. por causa de vocês quase morri hoje”, falei e saí do bar sem eles entenderem nada. Senti-me um herói nacional.
Estava tão bêbado que dormi nas areias da praia de Copacabana. Acordei com o Sol no meu rosto e vi que tinha que fazer alguma coisa. Levante-me, tirei a areia do meu corpo e fui para o único lugar que poderia, a pensão de dona Li.
Entrei na pensão joguei a mala no chão, abri os braços e falei “Dona Li !!!”. Ela me olhou como querendo identificar quem era até que comentou “Doido?”. Com o sorriso no rosto e os braços abertos disse “sim, dona Li!!”. Ela chegou perto e começou a me encher de tapas dizendo que eu tinha sumido do nada tinha lhe deixado preocupada e saí devendo um mês de aluguel.
Pedi desculpas, comentei que tive alguns problemas no cabaré que fizeram que eu desaparecesse peguei minha carteira e dei um bom dinheiro a dona Li. Pedi desculpas pelo mês atrasado e junto com o que devia dei mais algum devido aos transtornos.
Ela contou o dinheiro. Viu que era uma excelente soma abriu os braços sorrindo e disse “meu doidinho preferido!!”, dessa forma ela me perdoou.
Contei da minha vida para ela. Como tinham sido meus anos longe e perguntei como estava tudo por lá. Ela respondeu que tudo ia muito bem. Perguntei por Luciana e Susana, ela respondeu que Susana foi embora logo depois de mim. Graças à belíssima apresentação na rádio Nacional ela conheceu um empresário francês que a levou para uma temporada de shows em Paris e acabaram se casando e ela ficou por lá. Perguntei então por Luciana.
Dona Li respondeu que por uma incrível coincidência Luciana estava na pensão passando uns dias e perguntou se eu queria vê-la. Respondi que claro que sim que morria de saudades da Lu, ela falou para que eu esperasse que iria chamá-la.
Fiquei entusiasmado. Muito tempo não via Luciana que sempre foi uma mulher linda, quente, fogosa e liberal. Pensava que já tinha uma cama para eu me aconchegar no Rio de Janeiro. Nisso dona Li desce e diz que ela já estava vindo e também estava com muita vontade de me ver. Sentei para esperar ansioso, ouço passos na escada e quando vejo Luciana surge.
Surge e surge vestida de freira! Entendi nada e perguntei o que acontecia. Luciana aproximou-se beijou minha mão e com jeito sereno disse que estava muito feliz em rever um amigo de tão longa data. Dona Li sorriu e cheia de orgulho contou que Luciana agora era irmã Luciana, havia alguns anos atrás aceitado a fé Cristã e entrado para um convento onde vivia atualmente passando o dia todo rezando e lendo a Bíblia.
Luciana contou que como pessoa pura e casta que era.. perguntei.. “pu o que?” ela respondeu “pura” falei “ah ta” e baixinho disse “tinha entendido puta”. Luciana fez cara de quem não tinha entendido e perguntou “Como? O que você disse?” respondi “nada não, continue que a história é linda”.
Luciana continuou e contou que achou que aquele era o melhor caminho e se entregar o Senhor era o que de melhor tinha feito na vida. Agora era serva de Nosso Senhor Jesus Cristo, tinha encontrado a luz e a paz.
Dona Li enxugava as lágrimas dos olhos. Só consegui falar “bonita história” nisso a senhora conta que tem que adiantar o almoço, mas para que nós ficássemos a vontade, respondi que tudo bem e ela saiu.
Luciana e eu ficamos sozinhos nisso falei “poxa Lu to muito feliz por você..”, nem consegui completar o raciocínio Luciana se aproximou de mim me enchendo de socos, tapas e me xingando de todos os nomes possíveis, quase todos impublicáveis e impensáveis na boca de uma freira. Segue o diálogo com “irmã Luciana”.
Luciana: Seu filh..da pu.., viad.., pau..no c.., arrombad..!!!
Doido: Calma irmã Luciana
Luciana: Calma é o caralh.. seu merd.., como você namorava comigo e com a Susana ao mesmo tempo e depois sumiu seu bost..
Doido: Tive problemas com meu pai, me perdoe por tudo
Luciana: Vai se fud..sua bich.., você me paga, ta me devendo e antes que me esqueça,          FILH..DA..PU..!!!
Nisso dona Li volta e nos convida à mesa. Luciana sorri, ergue as mãos ao céu e fala “vamos à mesa Doido comer o alimento nos ofertado pelo Senhor”. Encaminhou-se para lá e eu fiquei pensando em como uma freira sabia tantos palavrões e como Jesus devia estar ruborizado na cruz.  
Almoçamos, instalei-me no meu quarto e ouço batidas na porta, abro e é a Luciana.
Ela me empurra pra dentro. Fecha a porta e me empurra pra cama subindo em cima de mim. Falei para que ela parasse com isso, ela não podia era uma freira e que pelo menos tirasse o hábito. Ela com a meiguice peculiar respondeu “tiro porr.. nenhuma seu merd..quem manda nessa porr..sou eu e você ta me devendo”. Não consegui argumentar nada, ela beijou minha boca mordendo meus lábios. Expressei um “ai” tomei um tapa na cara, um “cala a boca” e praticamente fui estuprado por uma freira.
Luciana acabou comigo, fiquei morto. Ela se levantou saiu e voltou com um saquinho na mão. Perguntei o que era aquilo ela derramou o saco na mão, eram milhos. Fiz cara de quem não estava entendendo e ela candidamente falou para que nos ajoelhássemos e rezássemos porque pecamos contra o Senhor. Ainda tentei argumentar que eu não havia feito nada e tinha sido praticamente violentado e ela com muita meiguice falou “Ajoelha porr..!!!!”. Ajoelhei.
Rezamos Pai Nossos e Ave Marias a noite toda. No dia seguinte Luciana voltou para o convento e meus joelhos doíam muito. Voltei a trabalhar com seu Joaquim e ao mesmo tempo estudava para prestar vestibular. Apesar de ser péssimo em matemática sonhava com engenharia, batalhei muito e passei para a universidade.
Evidente fiquei feliz demais. Mandei carta pra Sandra contando a novidade e ela me respondeu escrevendo que todos na cidade já sabiam do meu feito e estavam orgulhosos. Na carta que mandei perguntei se ela tinha notícias de Aloemi e na resposta ela contou que não, que nunca mais ninguém na cidade ouvira falar dela e nunca mais ela apareceu por Tremembé.
Segui assim minha vida, estudando, trabalhando. Fiz um grande amigo na faculdade, o Caio. Íamos sempre a praia e a noite pros bares e cabarés do Rio de Janeiro que sempre foram meu fascínio.
Uma noite conversava com o Caio andando pela rua quando ouvi uma menina gritando. Nos aproximamos para ver e notamos que dois caras importunavam a moça mexendo com ela. Eu como sempre metido a herói me meti e falei para que deixassem a moça em paz     
Eles não estavam com muita vontade de diálogo. Um deles tirou um canivete do bolso e mandou que eu “partisse pra cima”. Notei que estava entrando numa fria e falei que não tinha canivete. Caio tirou um do bolso e me entregou, eu contrariado agradeci. O Homem me desafiava e mandava que eu atacasse falei baixinho pro Caio que não sabia brigar com canivete da mesma forma ele me respondeu “se vida quis dar uma de herói”. Então topei o desafio e parti pra cima.
Depois de um ameaçar muito cortar o outro o meu adversário partiu pra cima de mim e feriu meu rosto. Caí e nisso a moça pegou sua bolsa e como fez Luciana anos antes deu um monte de bolsadas nos dois homens até que eles saíssem correndo. Com dor, sangrando me perguntei por que ela não havia se defendido antes.
Ela se aproximou de mim abaixou e deixou os seios perto do meu rosto, aquilo já me animou. Pegou um lenço, passou na boca e limpou o sangue do meu rosto, adorava ter aqueles seios perto de mim, mas ao mesmo tempo me apavorava a idéia de ficar com uma enorme cicatriz. Ela parou de limpar e falou “milagre”, não entendi o porque dela ter falado e Caio completou que não tinha ficado marca nenhuma, meu rosto estava como antes.
Levantei e falei pro Caio que levaria a moça em casa. Ele foi embora e fomos andar. Ela contou que se chamava Karina e morava ali perto, descobri que estudava na mesma universidade do que eu e contei que era uma surpresa pra mim porque nunca havia lhe visto. Ela riu e falou que devia ter mulheres lindas atrás de mim e por isso não tinha reparado, respondi que não, que ela era linda e teria reparado sim, principalmente naqueles olhos. Eu queria ter dito principalmente naqueles olhos e naqueles seios, mas achei que poderia pegar mal.     
Deixei Karina na porta do prédio. Ela me beijou o rosto e entrou, quando me virei para ir embora ela voltou, deu um longo beijo na minha boca e disse “até amanhã na faculdade”. Entrou e eu pensei que uma nova história pra mim estava começando.
Cheguei na pensão, fui para meu quarto e no espelho me olhei. Passei a mão no meu rosto e ele realmente estava limpo, sem cicatrizes, marca nenhuma. Estranhei já que jurava que o corte tinha sido profundo, curioso peguei a foto da carteira, aquela que entreguei nas mãos da cigana Regina. Olhei e no susto deixei que a foto caísse no chão. Nela eu estava com uma cicatriz. 
Eu e Karina começamos a namorar. Ela me apresentou sua família. Seu pai o Sr. Marco Aurélio Nogueira era oficial do exército muito ligado ao ex presidente Getúlio Vargas, amigos íntimos. O coronel, como nos o chamávamos, ajudou bastante na campanha que Getúlio voltasse ao poder e na reta final eu ajudei também ganhando a confiança do meu sogro.     
 Os anos foram passando e o namoro ia muito bem. Não conseguia me esquecer de Aloemi, mas também não tinha mais notícias suas. Com três anos de namoro eu e Karina ficamos noivos, festa que ganhou as colunas sociais do Rio de Janeiro. Eu ainda morava com dona Li, gostava de lá. Mas seu Joaquim faleceu após uma derrota do Vasco no último minuto para o Flamengo e por indicação do coronel virei gerente de uma empresa alimentícia enquanto estudava.
Meu sogro era Flamengo fanático e eu mesmo não sendo muito fã de futebol torcia também para o clube, essa foi a fase que mais fiquei próximo de futebol indo a todos os jogos do Flamengo com o coronel. O time de 1953 do Flamengo era jovem, mas um esquadrão, Garcia; Marinho (Tomires) e Pavão; Jadir, Dequinha e Jordan; Joel, Rubens, Índio, Benitez e Esquerdinha. Esse time ainda contou depois com craques do nível de Zagallo, Evaristo, Dida e Babá. O Flamengo foi bicampeão em 1954 e fez surgir o famoso “samba rubro-negro” de Wilson Batista.
O Flamengo joga amanhã eu vou pra lá
Vai ser mais um baile no Maracanã
O mais querido tem Dequinha, Rubens e Pavão
Eu já rezei pra São Jorge, pro Mengo ser campeão

Pra ficar bem com o coronel era só falar do Flamengo com ele e irmos ao Maracanã.
Uma madrugada bebi com o Caio até tarde em um bar de Copacabana. Deixei meu amigo em casa e de carro passei pela rua Tonelero quando vi uma cena estranha. Presenciei em frente um prédio um atentado. Atiraram em dois homens sendo que um caiu no chão. Dei marcha ré no carro e fugi, parei em um orelhão e liguei para a polícia.
No dia seguinte a notícia do tal atentado já estava na manchete de todos os jornais. Mataram o major Rubens Florentino Vaz e acertaram o pé de Carlos Lacerda, Lacerda era jornalista, ex deputado federal e maior opositor de Getúlio Vargas. O atentado foi atribuído a Alcino João Nascimento e o auxiliar Climério Euribes de Almeida, membros da guarda pessoal de Getúlio,
chamada pelo povo de "Guarda Negra". Esta guarda fora criada para a segurança de Getúlio, em maio de 1938 logo após um ataque de partidários do integralismo ao Palácio do Catete. Resumindo, Getúlio estava encrencado.

A crise foi feia, foi séria. Meu sogro como muito amigo do presidente ficou preocupado. Os jornais e as rádios davam em manchetes, todos os dias, a perseguição aos suspeitos. Alcino foi capturado no dia 13 de agosto. Climério foi finalmente capturado, no dia 17 de agosto, pelo coronel da Aeronáutica Délio Jarim de Matos que, posteriormente, chegaria a ser ministro da Aeronática. Gregório Fortunato, chefe da guarda pessoa do presidente foi acusado de ser o manante do atentado contra Lacerda, o clamor popular, da imprensa e de militares era para que Getúlio renunciasse.
Uma cinco da manhã de 24 de agosto de 1954 dona Li bateu na minha porta dizendo que tinha telefonema pra mim.

Acordei com muito sono preocupado com o que poderia ter ocorrido. Atendi e era meu sogro do outro lado da linha. Ele pediu para que eu fosse ao Palácio do Catete, sede do governo, levar um recado importante ao presidente e que ele o encontrasse à tarde  “no local de sempre” que ele tinha a solução para todos os problemas.

Argumentei com o coronel que nunca me atenderiam e eu nem chegaria perto da entrada do palácio. Ele respondeu para que falasse seu nome e que isso me daria acesso ao presidente. Não podia recusar pedido do meu sogro, me arrumei e fui para o Catete.

Realmente o nome do meu sogro abria portas, mesmo com horário tão cedo consegui entrar, estava no salão do palácio quando ouviu-se um estampido seco, uma grande confusão tomou conta do palácio. Tentei descobrir o que acontecia mas me empurraram para fora do palácio dizendo que depois entrariam em contato.

Aquele estampido era um tiro. O presidente Getúlio Vargas havia se matado. Eu nunca fiquei sabendo qual era a solução que meu sogro havia arrumado para o problema e lá ia eu a mais um enterro.

Uma grande comoção tomou conta das rua. Jornais oposicionistas como “O Globo” foram depedrados, Lacerda teve que sair do país e nós fomos a São Borja no Rio Grande do Sul para o enterro. A cidade também era a cidade natal do coronel.

Assistia ao enterro ao lado de Karina quando notei que uma menina  não parava de me olhar, vestia roupa de normalista, bonita. Fiquei meio envergonhado deviava o olhar, mas ela não parava de me encarar como se me comesse com os olhos. Mais tarde reunidos na casa da família do coronel descobri que se chamava Silvana e era prima da Karina.

Nessa mesma noite acordei de madrugada para beber água e quando entrei na cozinha me empurraram para a parede e me beijaram, era a Silvana. Cochichei que ela era louca e poderiam ver. Mas nem me deu ouvido e continuou me beijando, transamos ali mesmo.

Voltamos ao Rio e não conseguia parar de pensar naquela menina louca de São Borja. Alguns meses depois qual não foi minha surpresa ao chegar na casa de Karina e dar de cara com Silvana. Minha noiva se aproximou toda feliz de mim, me beijou e disse que a prima iria estudar no Rio de Janeiro e morar lá e se não era ótimo. Respondi sem graça que sim e ela com olhar safado falou “oi Doido”.

É, o pára raio de confusões voltava a todo vapor envolvido com a prima de minha noiva. O tempo foi passando e  mantive os dois casos, até que não teve mais como fugir pois já eram mais de cinco anos de namoro, dois de noivado. Eu e Karina fizemos uma festa e marcamos a data do casamento pro dia 4 de abril de 1956.     

Chegou o dia do casamento e por uma grande ironia do destino naquele dia ocorreria a final do campeonato carioca entre Flamengo x América, a chance do Flamengo ser tricampeão carioca. Enquanto eu estava morto da noitada de despedida e solteiro com Silvana meu sogro era uma tensão só não pelo casamento, mas pela final do carioca.

Estou me arrumando na pensão de dona Li quando ouço uma buzina. Chego na janela e vejo que era um ônibus e reconheci Sanda e Gustavo na janela acenando. Corri e abracei minha irmã e meu amigo querido. Com eles vieram todas as meninas que trabalhavam no Moulin Rouge, dona Áurea e as meninas da zona, desde que fui embora de Tremembé nao os via e isso me emocionou.

Gustavo contou que era deputado federal e Sandra que o nosso cabaré era um grande sucesso, tanto que já abrira filiais em mais três cidades. Perguntei como estava Tremembé e falaram que evoluia a olhos vistos. Sandra perguntou se eu estava feliz, respondi que sim, mas não estava.

Sentia falta de Aloemi. Muito tempo havia se passado, mas o amor não. Imaginei muito me casar mas com ela, era ela que queria receber no altar vestida de branco levantar o véu e falar que era linda, ainda perguntei a Sandra se ela tinha notícias de Aloemi, minha irmã respondeu que não.

Estava pensativo na sacristia quando Sandra entrou. Perguntou se eu estava bem mesmo e respondi que sim. Minha irmã ajeitou minha gravata e disse que eu nunca aprendi a dar um nó direito, ri mas foi um riso meio triste.  Ela notou,me deu um beijo no rosto e falou no meu ouvido “sempre há tempo de desistir”.

A igreja estava engraçada. De um lago a alta sociedade carioca. Pessoas respeitadas, formadoras de opiniões, chiques e com cara de esnobes, eram os convidados de Karina. Do outro as putas de Tremembé, minhas convidadas. Notava-se um certo desconforto dos convidados de Karina que não paravam de olhar, mas os meus pareciam se divertir e até flertavam com alguns homens do outro lado que se animavam, mas disfarçavam quando notavam que suas mulheres olhavam.        

Era o que me fazia rir no altar porque estava triste, só conseguia pensar em Aloemi e no que minha irmã havia dito, será que era a hora de desistir? Eu teria mesmo coragem de casar com uma mulher que não amava? Nisso entra Karina com o coronel, estava linda, mas eu só pensava em Aloemi e se devia desistir ou não. O ”sempre há tempo de desistir” não saía da minha mente.

Silvana veio como dama de honra. Chegou no meu ouvido e falou que eu estava gostoso, o coronel me entregou Karina, nos viramos para o padre e a cerimônia começou.  

Não ouvia nada que o padre falava, pensava em Aloemi e no que fazer. Ele me perguntou se eu aceitava a mão de Karina em casamento e eu estava tão distraído que não ouvi. Ele gritou “Doido!!”, olhei assustado e ele repetiu a pergunta, demorei uns cinco segundos respondi que sim e abaixei a cabeça. O padre fez a mesma pergunta para Karina, eu de cabeça baixa, triste, mas deu para ouvira resporta..ela respondeu não.

Um grande alvoroço tomou conta da igreja. Levantei a cabeça assustado e ela reforçou o não. O padre perguntou o porque daquela resposta. Karina virou-se pra mim e pediu desculpas, disse que estava apaixonada e mantinha um caso duranto os últimos anos, pensou muito e não poderia ir contra seu sentimento, contra seu amor.

Assustado perguntei quem era o seu amor. Nisso um anãozinho levantou da primeira fileira e disse que era ele. Na hora não reconheci, mas depois percebi que era o anão que fazia anotações do jogo do bicho. Karina se ajoelhou e disse que o amava, os dois se beijaram apaixonadamente ao som de “ooohh” do público e meu olhar espantado. Karina pegou o anãozinho no colo e griou “vamos meu amor, vamos ser felizes” e saiu correndo da igreja.

Sentei no altar com cara de bunda. Dona Li, dona Áurea, Gustavo e Rodrigo chegaram perto de mim e perguntaram se eu estava bem, com cara de bobo respondi que sim e dona Li perguntou se a festa estava mantida e se poderiam ir até o salão comer o bolo e os salgadinhos. Respondi que sim que poderiam e eles foram, a igreja ficou vazia. O coronel Marco Aurélio se aproximou de mim, sentou ao meu lado, me abraçou e disse que me considerava como um filho, que nada mudaria entre nós e que eu sempre poderia contar com ele. Fiquei emocionado e agradeci.

Nisso Caio entra correndo na igreja com um radinho na mão contando que o Flamengo havia vencido o América por 4x1, três gols do Dida e era tricampeão carioca. O Coronel deu um pulo no ar e os dois se abraçaram gritando “tricampeão”. Meu agora ex sogro falou para o Caio para eles irem pra rua comemorar. Caio ainda argumentou “ e o Doido?”, o coronel respondeu “deixe esse chifrudo pra lá, vamos comemorar!!” e os dois saíram abraçados gritando tricampeão.

Continuei sentado no altar quando Silvana apareceu e sentou do meu lado. Olhei para ela e falei que agora estávamos com o caminho livre e poderíamos assumir nosso caso. Silvana respondeu me pedindo desculpas e falou que não sabia ser a oficial só amante e só tinha se interessado por mim porque eu era noivo de sua prima e como tinha acabado a relação a nossa também acabava ali.

Ainda tentei argumentar. Mas ela me deu um beijo no rosto e disse “boa sorte gostoso”, levantou e caminhou para a saída da igreja, ainda consegui ouvi-la comentando “será que esse anão é bem dotado?”

E ali fiquei eu sozinho no altar no dia do casamento trocado por um anão. Olhei para minha mão, estendi o dedo indicador e coloquei o polegar pra cima, apontei para meu coração e falei “saio da vida para entrar pra história” atirei e me joguei no altar.        

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