DINASTIA: CAPÍTULO XVII - JUVENTUDE TRANSVIADA


O ano é de 1954. Ano conturbado para o Brasil. O silêncio reinava na mansão dos Granata. Dora, Cecília e Mariana quietas, Constância chorando e as crianças Benito, Domenico e Enrico brincavam.

Pepino, um adolescente na flor da idade desceu as escadas animado e assoviando. Cecília perguntou ao filho aonde ele ia com tanta felicidade e o rapaz respondeu a uma festa.

Cecília indagou “Festa? De quem? To sabendo de festa nenhuma?”. Pepino olhando no espelho e ajeitando o cabelo respondeu que era aniversário de uma colega de colégio e já estava atrasado.

Sua avó, Dora se indignou e levantou “Moleque, o presidente desse país acaba de morrer e você vai a uma festa?”.

Era o dia 25 de agosto de 1954. Dia do suicídio de Getúlio Vargas.

Pepino respondeu que o presidente podia estar morto, mas ele bem vivo e Dora pediu que Cecília não deixasse Pepino sair. Naquele instante Pepe Granata, o Barão de Feital desceu as escadas e perguntou o que ocorria.

Dora gritava que era um absurdo Pepino querer ir para uma festa na noite que o Brasil chorava a morte do presidente. Pepe olhou bem o filho e respondeu que não via nada demais.

Dora espantada perguntou a Pepe como ele não via nada demais e Pepe alegou que Getúlio era um bandido, seu exército fora o responsável pelo pai parar numa cadeira de rodas e o extermínio da família de Mariana.

Dora ficou sem palavras e Pepe se virou para o filho. Disse bem sério que não queria mais o garoto envolvido em confusões. Pepino respondeu “eu não busco confusões, elas que me perseguem”.

Pepe não achou graça e Pepino prometeu não se envolver em problemas. Pediu a chave do carro ao pai que se recusou a entregar alegando o rapaz ser menor de idade.

Pepino deu um beijo no pai, outro na avó e prometeu rezar por Getúlio durante a festa. Saiu da casa enquanto a avó lhe chamava de atrevido.

Do lado de fora entrou em um dos carros do pai e fez ligação direta. Zaqueu entrava na mansão e viu o que o rapaz fazia. Foi até o menino e provocou “Já vai fazer besteira né?”. Pepino que estava abaixado fazendo a ligação se levantou e respondeu “nada, estou indo rezar pelo Getúlio”.

O carro pegou e sorrindo Pepino contou para Zaqueu “Viu? Lá do céu nosso presidente já faz milagres”. Deu tchau e partiu.

Pepino era debochado, provocador, brigão e extremamente sedutor. Era uma espécie de James Dean tendo um grande fã clube. O mais velho dos quatro filhos de Pepe Granata, o herdeiro natural de seu império.

Uma grande festa ocorria no clube do Fluminense, nas Laranjeiras. Era a festa de quinze anos de Bianca Fontenelle, filha de Abrão Fontenelle, um dos grandes magnatas da cidade.

A festa já estava cheia. Pessoas da alta sociedade dançando embaladas por uma orquestra enquanto Pepino e os amigos Josué e Felipe andavam na toda num carro bebendo e rindo em direção ao evento.

Josué lembrava da última festa que foram e acabaram com a mesma parando todos na delegacia. Pepino riu e respondeu que não podia mais vacilar, pois o pai estava de olho. Felipe também rindo alegou que o Barão tinha coisas mais sérias pra se preocupar que com ele.

Pepino gargalhou e contou que aquele império um dia seria todo dele e gastaria a grana toda com farra. Os três jogaram suas garrafas pelas janelas espatifando na calçada e em disparada foram para a festa.

Estacionaram em frente ao clube, pentearam seus cabelos pela última vez e entraram.

Quando aqueles três rapazes de calças jeans, camisas brancas e jaquetas de couro entraram na festa o burburinho foi um só “lá vem confusão”. Pepino entrou no salão e de cara pegou uma taça de champanhe de um garçom.

Abrão olhou a chegada do grupo e se irritou. Rubens, namoradinho de Bianca olhou e também não gostou. Abrão puxou Rubens e perguntou “Viu quem chegou?”. O rapaz respondeu que sim e o homem completou “Não gosto desse moleque, nem dele nem do bandido de seu pai”.

Rubens perguntou se Abrão queria que ele fizesse algo e Abrão respondeu “tire esse filho de carcamano daqui”. Os três rapazes já dançavam animadamente quando Rubens chegou perto de Pepino.

Rubens puxou Pepino que respondeu não querer conversar com homens, apenas com “bonecas” e Rubens mandou que ele parasse de gracinha que tinha algo a dizer.

Pepino perguntou o que era e Rubens respondeu “O dono da festa quer você fora daqui”. Pepino riu e respondeu que a festa era de Bianca e ela não pedira nada. Acenou para a moça que envergonhada fingiu não ver.

Rubens irritado alegou que era o namorado e falava por ela. Pepino deu um tapinha no ombro do rapaz e virou-se mandando que ele se divertisse. Rubens gritou que ele tinha cinco minutos para ir embora e Pepino não deu ouvidos.

A festa continuou com tensão no ar. Pepino se aproximou de Bianca e cumprimentou a moça. Bianca trêmula disse que não era para ele ter ido e não lembrava de ter lhe convidado. Pepino sorriu. Um sorriso sedutor e afirmou que mexia com a moça.

Bianca desconversou e começou a andar contando ser loucura dele. Pepino lhe puxou o braço e disse “mexo sim, você nem consegue me olhar nos olhos”. Bianca sem olhar nos olhos de Pepino pediu que o rapaz fosse embora e o rapaz respondeu que iria, mas ainda seria seu namorado.

Bianca saiu andando e Pepino atrás. Rubens apareceu por trás falando “italianinho, já mandei que fosse embora”. Pepino ignorou e Rubens continuou “Pensa que tenho medo de você só porque seu
pai é um bandido?”.

Pronto, se tinha algo que tirava Pepino do sério era chamar seu pai de bandido. Pepino virou-se de uma vez só dando um murro em Rubens que voou longe. A confusão tomou conta do salão. Rubens levantou-se partindo pra cima de Pepino e a confusão foi generalizada.

Josué e Felipe entraram na briga, outros convidados também e até os garçons entraram na briga. Abrão pediu e a orquestra continuou tocando mesmo com todos brigando. Pepino sacou seu canivete e rasgou o rosto de Rubens dizendo “leve consigo pra toda a vida a marca do italiano”.

A polícia chegou e levou todo mundo pra delegacia.

Chegando na delegacia o delegado falou “De novo Pepino?”. O jovem apenas sorriu e o delegado completou perguntando “E o Barão? Como está?”.Sorrindo Pepino respondeu que estava bem e o delegado mandou que colocassem o rapaz no xadrez que provavelmente Zaqueu ou Manuel logo pagariam a fiança.

Pepino, Josué e Felipe foram para uma cela junto com outros brigões enquanto Rubens parou em um hospital. O tempo foi passando e nada de Zaqueu ou Manuel chegar na delegacia para soltar o rapaz que se preocupava.

Felipe perguntava ao amigo o que acontecera e se o pai desistira dele. Pepino mandou que parasse de falar idiotices, pois, o pai nunca desistiria. Os outros presos começaram a debochar de Pepino e uma grande pancadaria se iniciou na cela com os guardas apartando.

Pela primeira vez Pepino dormiu na cadeia e só na manhã seguinte alguém apareceu para soltá-lo. Foi Manuel que pagou a fiança e soltou os rapazes.

Pepino reclamou da demora para soltarem e o homem respondeu que tiveram contratempos. Pepino perguntou quais e Manuel respondeu que Pepe sofrera um atentado.

Pepino exclamou “Outro? Já está ficando chato!!”. Felipe se assustou e perguntou se o Barão morrera. Pepino riu e respondeu que era evidente que não, o pai tinha “corpo fechado” e já era o terceiro atentado só naquele ano.

Despediram-se do delegado que disse “Dê lembranças ao Barão” e na rua Manuel confirmou que Pepe sobrevivera. Felipe e Josué estarrecidos só ouviam a conversa dos dois e a pergunta de Pepe a Manuel sobre qual fora o atentado da vez.

Manuel calmamente enquanto entravam no carro contou que o carro de Pepe fora metralhado, mas ele não tomara nenhum tiro, só o chofer tinha morrido. Pepino lamentou a morte dizendo que estava difícil encontrar quem quisesse dirigir para o pai.

Antes de Manuel ligar o carro pra partirem Josué comentou que se a família recebia tantos atentados como eles podiam garantir que não tinha uma bomba naquele carro. Pepino comentou que era verdade e se tivesse morria porque ao contrário do pai não tinha corpo fechado.

Manuel contou que só tinham uma maneira de saber e ligou o carro. O veículo funcionou normalmente e ele rindo comentou “é, não tinha”.

Manuel e Pepino retornaram a mansão e no escritório da casa encontraram Pepe irritado ao telefone e Zaqueu sentado a sua frente. Gritava no aparelho “Manda botar preço que eu compro!!”.

Pepino perguntou a Zaqueu qual era o problema e este respondeu que o pai perdera na votação para entrar no Carioca Country Club. “Só recebeu bolas pretas” completou Zaqueu.

Pepe desligou o telefone irritado e Zaqueu perguntou o que fora resolvido. O Barão respondeu que não tinha jeito mesmo de entrar no clube.

Sentou-se, acendeu um charuto e Manuel perguntou se ficaria por aquilo mesmo. Pepe deu uma baforada e respondeu que acabara de comprar o terreno em frente para fazer o Granata Country club. Faria seu próprio clube ali na frente dos grãs finos.

Pepino riu e Pepe levantou-se para dizer que não aceitaria almofadinhas em seu clube, ali só seriam aceitos suburbanos e favelados, gente do povo. Manuel riu e comentou que ele não existia.

Pepe chegou perto de Manuel, colocou a mão em seu ombro e mandou que comprasse a melhor sunga que encontrasse. Manuel respondeu que não tinha mais idade para nadar em piscina e Pepe comentou que era uma ordem, queria ver o amigo no clube.

Pepino riu, Pepe notou sua presença e pediu para os amigos saírem.

Pai e filho a sós. Pepe calmamente encheu um copo de uísque, bebeu um gole, colocou sobre a mesa e extremamente irritado gritou perguntando o que o filho fizera daquela vez.

Pepino respondeu que não tinha culpa e irritado Pepe gritou “não tem culpa, não tem culpa..Você nunca tem culpa, impressionante isso!!”. Pepino pediu desculpas e Pepe bebeu mais um gole de uísque antes de voltar a falar “você começa a trabalhar amanhã” disse o Barão.

Pepino olhando para baixo respondeu que seria bom começar a entender o negócio do pai e Pepe disse que não, ele começaria como apontador.

Pepino se assustou e pediu “tudo menos isso”. Pepe respondeu que o filho tinha que ver que o dinheiro não vinha fácil, era árduo pra se ganhar e ele mesmo, seu pai Salvatore e o avô Benito muito tiveram que fazer pra conquistar. Vociferou.

“Você terá que fazer por merecer”.

No dia seguinte Pepino estava lá na banca do centro de Feital trabalhando como apontador, fazendo o jogo das pessoas orientado por Zaqueu. Foi assim durante vários dias para poder pegar a prática.

Uma tarde foi com os amigos em uma lanchonete. Colocou uma música na junkie Box e sentou com Josué e Felipe reclamando que o pai estava no pé.

Felipe mandou o amigo se acalmar que o pai apenas queria que ele tomasse jeito. Pepino avistou Bianca sozinha sentada em uma mesa e respondeu que tomaria, mas um milk shake e pediu que o amigo pedisse enquanto ele falasse com a moça.

Josué pediu que não fosse, era confusão na certa, mas Pepino foi.

O rapaz pegou uma flor sobre uma mesa e entregou a Bianca pedindo desculpas pelo ocorrido em seu aniversário. A moça reclamou que ele acabou com sua festa e olhando em seus olhos Pepino pediu perdão.

Bianca olhou fundo para Pepino por alguns segundos e desviou o olhar pedindo que ele parasse. Pepino sorriu e comentou que a menina realmente gostava dele e ela pediu que ele não fizesse perguntas difíceis.

Rubens chegou e logo empurrando Pepino mandando deixar sua namorada em paz. Pepino rindo argumentou que ela que teria que decidir e Bianca pedia para os dois pararem.

Josué e Felipe se juntaram para impedir a briga e Pepino ironizou que a marca de seu canivete ficara bonita no rosto de Rubens. Rubens devolveu perguntando como era ser uma pessoa que ficava o dia todo anotando jogos do bicho.

Pepino se irritou e deu um soco em Rubens que tentou devolver, mas as pessoas separaram os brigões. O dono da lanchonete pegou uma arma e gritou que não permitiria brigas em seu estabelecimento.

Rubens propôs então um pega na descida da floresta da Tijuca e quem vencesse ficaria com o carro do outro. Pepino então propôs que quem vencesse ficasse com Bianca. A moça gritou que não era mercadoria, mas Rubens concordou.

Duelariam aquela noite na floresta.

Pepino despediu-se da família cedo e foi deitar. Pepe estranhou e comentou com Cecília que respondeu que o filho tomara juízo. Pepe não acreditou muito, mas achava melhor assim.

Do quarto Pepino pegou os lençóis e fez uma corda para descer pela janela. Desceu e pegou o carro sem ninguém perceber.

Pegou Josué e Felipe pelo caminho e foram para a floresta.

Chegando ao local todos já esperavam. Rubens encostado em seu carro ironizou que estava quase dormindo e pensou que o rival tivesse desistido.

Pepino passou andando por Rubens e contou que não, pelo contrário, faria questão que o rival lhe visse beijando Bianca. A moça gritava para os dois pararem com aquela palhaçada enquanto Felipe mandava começar o duelo.

Os dois entraram em seus carros e se posicionaram, quem chegasse embaixo primeiro era campeão. Com os dois a postos Felipe autorizou a partida.

Os dois aceleraram e a disputa estava difícil, com os dois emparelhados. Um passava o outro e próximos da chegada um caminhão apareceu na direção contrária.

Pepino e Rubens estavam emparelhados, Rubens na pista do caminhão que buzinava. Pepino gritou para o rival frear e Rubens fez o mesmo.

Nenhum dos dois freou e Rubens bateu em cheio no caminhão.

Pepino parou o carro e desceu para tentar acudir Rubens. Mas antes que chegasse perto o carro do jovem explodiu.

Pepino foi jogado ao chão e aterrorizado via o carro ser lambido pelas chamas.

Rubens estava morto.


CAPÍTULO ANTERIOR:

BARÃO DE FEITAL

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