QUINZE ANOS: CAPÍTULO IX - AGOSTO
Estava estudando feito um condenado. Nem nas férias tive descanso então resolvi radicalizar.
Inventei que estava doente numa manhã quando minha mãe e vó saíram e resolvi aproveitar a vida. Liguei para um amigo bobalhão, nerd, que o pai tinha uma Ferrari e mandei que ele me buscasse em casa. Ele me buscou, fomos até o colégio e lá dei um jeito da Ericka sair da aula do professor Martins e nos acompanhar.
Tivermos um grande dia. Almoçamos em lugar chique nos passando por outras pessoas e não pagando, fomos a museu, alto de prédios ver a vista, jogo de futebol e até cantei em um evento que rolava no centro da cidade.
O problema todo foi quando pegamos a Ferrari de volta e o meu amigo viu que a quilometragem estava mexida, ele surtou coitado.
Deixei a Ericka em casa e corri pra minha para conseguir chegar antes de minha mãe e minha avó. Corri muito, passei por casas, carros, até o de minha mãe e quando cheguei em casa dei de cara com o professor Martins.
Ele todo rasgado, sapatos arrebentados e cara de quem teve um dia péssimo disse que finalmente me pegara e eu iria repetir a sétima série. Nesse instante o Marco Aurélio saiu de dentro da casa e disse que estava preocupado comigo e demorei a voltar do Paulino Werneck, o hospital da Ilha do Governador.
Eu corri para minha cama antes que mãe e vó entrassem e deitei na cama enquanto o professor Martins entrava derrotado em um ônibus escolar e todos os alunos lhe olhavam assustados.
Pena que perdi essa cena.
Deitei na cama e senti alguém me cutucando, era minha mãe, mas não era pra me dar uma sopinha por eu estar doente, mas porque eu estava dormindo mesmo. Foi tudo um sonho, como sempre.
Mas acordei com a sensação que a vida é muito curta e ela tem que ser aproveitada.
Agosto começou com força total. Além de meu aniversário de quinze anos teria eleição do grêmio estudantil e não sei por qual motivo montaram uma chapa e decidiram me colocar como presidente. Coisa da Raquel que articulou a criação da chapa e achava que eu era o mais bem preparado.
Bem, começamos a campanha. Nossos adversários eram da oitava série e sempre tivermos certa rivalidade com eles, desde que éramos da quinta série. Muitas juras de porrada e estranhamentos e por ser o pessoal da oitava quem enfrentava me empenhei ainda mais e tive ajuda da galera da sétima, até do Nelson, meus amigos entraram de cabeça na campanha.
Raquel então era a principal entusiasta e passávamos o dia juntos fazendo campanha o que levava a comentários dos outros sobre namoro nosso.
Nada..tentei de tudo no ano anterior namorar a Raquel e consegui nada, ela só queria minha amizade mesmo. Mas fazia bem ao ego.
Um dia Ericka me perguntou se eu estava namorando com a Raquel e respondi que não. Ela deu um sorrisinho de canto de boca e respondeu “sei”. Será que ela estava com ciúmes? Meu coração não aguentaria tanta emoção.
Raquel com cara enfezada passou por mim e disse que precisava falar comigo. Ela continuou andando e Ericka falou “vai que sua namorada tá te chamando”.
Eu fui e Raquel reclamou que tínhamos uma campanha para fazer e eu não podia perder tempo com paqueras.
Incrível, será que elas estavam com ciúmes? Uma com ciúme da outra? Muita emoção para esse pobre coração.
Na realidade era nada demais, mas eu via a situação com as duas vestidas de vermelho, eu de malandro e elas cantando “o meu amor, tem um jeito manso que é só seu..” como na peça “Ópera do malandro” do Chico Buarque. Imaginei as duas cantando “eu sou sua menina viu? E ele é o meu rapaz, meu corpo é testemunha do bem que ele me faz”.
Pretensão..
Mas não chegava apenas a eleição do grêmio estudantil, também chegava o meu aniversário. Dia 9 de agosto eu faria 15 anos. Viraria um adulto, o mundo se abriria para mim, eu seria uma nova pessoa..
..nada, eu só estava interessado em minha festa.
Chamei o colégio todo, iria fazer um festão e durante a semana anterior só se falava no evento. No dia eu esperava ansioso os convidados de roupa nova e comida e bebida que não acabavam mais e eles iam chegando.
E eles chegavam, um a um, a casa foi ficando cheia e eles chegavam cada vez mais...
..é..eles, só homens, nada de mulheres.
Quando fui ver tinha mais de setenta homens na minha casa e nada de mulher. Incrível, mas nenhuma mulher que convidei compareceu apenas os caras e eles já reclamavam perguntando pelas meninas. Eu não sabia o que dizer.
Quando o clima já ficava pesado meu tio Flávio, casado com minha tia Rachel que veio de Curitiba, sacou uma ideia genial. Ele disse que alugara um filme pornô e colocaria pra gente.
99% daqueles meninos da festa eram virgens e nunca viram um filme pornográfico e o alvoroço foi grande.
Flávio colocou a fita no videocassete e os meninos se espalharam pela sala. Sentaram no sofá, em cadeiras, no chão, mais de setenta garotos tensos esperando que a fita começasse.
E de repente começa um filme do Mickey Mouse. Os garotos furiosos começaram a jogar bolinhas de papel na TV e o Flávio pediu que se acalmassem que era brincadeira pondo assim a fita verdadeira.
E o que se “ouviu” depois foi um grande silêncio. Como eu disse anteriormente nunca nenhum menino tinha visto cenas daquelas e estavam todos paralisados olhando. Meu tio notou e mandou que todos colocassem as mãos ao alto e que estavam proibidos de ir ao banheiro.
Eu também nunca tinha visto e por dentro pensava “então é assim?”. Desde aquele filme algo mudou em mim, na minha vida. Eu chegara a conclusão que estava na hora de fazer sexo.
O filme acabou e os meninos ficaram todos lá sentados como em transe. Flávio avisou que o filme acabara e podíamos levantar, mas ninguém ouviu.
O jeito foi colocar o som pra tocar do lado de fora e assim os meninos foram levantando um a um.
Quando eu ia saindo o tio Flávio me entregou um embrulho e disse que era seu presente pra mim. Quando abri era uma caixa de camisinhas, nunca vira uma de perto.
E mais ainda eu chegava a conclusão que tinha que transar.
Do lado de fora percebi que uma mulher pelo menos chegara. Junto com um amigo da minha mãe, também fuzileiro, chamado Ricardo chegou sua esposa, a Daya.
O casal por dois anos pelo menos foi muito amigo de nossa família e nos víamos praticamente todos os dias e a Daya era uma mulher linda de apenas vinte e dois anos, na flor da idade. Cara de menininha, seios grandes e firmes. Posso dizer que a partir daquele momento ela começou a ser atriz principal de meus pensamentos mais impuros, vem a mente de vez em quando até hoje e se eu fizer um ranking desses anos
todos de quem mais homenageei ela está em primeiro lugar.
Mas apenas a Daya não bastava, precisávamos de mais mulheres e de nossa idade.
Em uma atitude desesperada os garotos viram três meninas andando na rua e correram atrás chamando para entrar. Papo vai, papo vem e conseguiram convencer que entrassem.
Elas entraram e ficou um clima estranho. Parecia um monte de lobos querendo atacar as “chapeuzinhos vermelho”. Com o tempo elas se sentiram mais em casa e até dançaram com os convidados.
Menos comigo, claro, que sempre me dou mal.
Enquanto Luis Felipe sentava ao lado de uma das meninas, mais calada e perguntava se ela estava triste sem conseguir resposta as outras duas dançavam alegremente e eu dançava com um cabo de vassoura ao som de Whitney Houston cantando “one moment in time”. Música da novela “O salvador da Pátria”.
Sonhando com a presença de Ericka, que não apareceu.
No fim da festa ficamos eu, Marco, George, Gustavo, Rodrigo e Luis Felipe devorando os salgadinhos que sobraram, rindo dos acontecimentos da festa e assistindo o filme pornô.
Grandes amigos, grande festa.
Na segunda-feira minha festa foi o comentário principal do colégio com os meninos em código falando do filme pornô que assistimos e lamentando que as meninas não compareceram.
Agora com idade nova, quinze anos, eu tinha que correr atrás de uma eleição para vencer.
A campanha entrou em reta final e o colégio estava dividido entre eu e o garoto da 8° série até que foi marcado um debate entre os dois candidatos.
Eu estava muito nervoso no dia e perguntei a Raquel o que eu deveria fazer. Ela olhou nos meus olhos e disse “seja você mesmo”. Perguntei se era isso mesmo que eu devia fazer e Raquel respondeu “Claro que não, isso é política, minta”.
A Raquel hoje é senadora e ministra mostrando que tinha grande talento pra política, mentira é não, sei lá...
Entrei no palanque pro debate tenso, mas vi que meu adversário também estava e aproveitando as aulas de teatro que fiz consegui me acalmar e encarnar um personagem.
A cada pergunta um sorriso, alguns segundos para começar a responder e fala pausada, tranquila respondendo algo que tinha nada a ver com a pergunta, mas com tanta convicção que os eleitores ouviam aquilo que queriam. Eu estava pronto para concorrer a presidência da República !!
No fim mostrei documentos provando que o menino meu opositor se dizia torcedor do Vasco, mas era América e tinha vergonha de assumir deixando meu adversário sem respostas.
E minhas últimas palavras foram “Eu tenho um sonho!! Em que todos os alunos são tratados como iguais. Brancos, negros, índios, homens e mulheres com recreio de uma hora de duração e podendo sair mais cedo!! Não perguntem o que o colégio pode fazer por você e sim o que você pode fazer pelo colégio!! Deus salve o AME!!”.
Fui ovacionado. Aplaudido por professores, diretora, até pelo meu opositor emocionado com lágrimas nos olhos. Menos lógico pelo professor Martins que só olhava.
Ganhei com 90% dos votos e evidente que não cumpri nada que prometi. O cargo era apenas figurativo, pra dizer que os alunos tinham voz, mesmo que rouca.
Comemorei com meus amigos de fé numa festa junina, que na verdade era agostina que ocorria na rua de minha casa. Enquanto meus amigos estavam lá comemorando eu estava puto porque o Vasco tinha contratado o Bebeto e naquela noite ele vestira a camisa do bacalhau.
Eles lá se divertindo com todas aquelas coisas bacanas de festa caipira e eu irritado. Acabou que um deles deu ideia de passearmos de jardineira e como eu queria passear mesmo topei.
Pra quem não sabe jardineira era um tipo de ônibus que existia na Ilha do Governador nos anos oitenta. Ele era todo aberto e só existia na orla. Gostávamos de andar nele porque dava pra dar “calote”. Como era todo aberto era só alguém entrar ou descer que podíamos descer por trás.
Vai ver por isso acabaram com a jardineira.
Pegamos uma e fomos passeando pela orla. O problema que o ponto final chegava e nada de alguém entrar ou descer para descermos e darmos o calote. Acabou que tivemos que pagar.
E não tínhamos dinheiro para volta. E agora? O que fazer? Só passavam ônibus comuns e tivemos que pegar um na torcida que alguém entrasse perto do lugar que descíamos e assim darmos o calote.
Mas ninguém entrava e toda hora o cobrador perguntava se não iríamos pagar e passar pela roleta, respondíamos que já iríamos fazer isso.
Mas não fizemos. O ponto final chegou e o cobrador perguntou se tínhamos dinheiro, respondemos que não.
Ele irritado mandou que passássemos por baixo da roleta numa das maiores vergonhas da minha vida. Só não foi maior do que a que passei em setembro e contarei depois a vocês.
Voltamos a festa junina com “caras de bunda”. Além de ter que aturar o Bebeto no Vasco virei caloteiro.
Um dia estarrecido via pela tv que o Raul Seixas tinha morrido quando minha mãe contou que iria a Curitiba ajudar minha tia Rachel em alguns problemas e essa viagem poderia ajudar com minha avó que ainda estava em depressão devido o divórcio com meu avô.
Resumindo, eu ficaria um final de semana sozinho em casa.
Na minha cabeça eu daria uma festa igual aquela do Tom Hanks em “a última festa de solteiro” com amigos, prostitutas, dança do ventre e jegue infartando. Meu sonho sempre foi dar uma festa assim.
Mas a realidade foi bem diferente. O fim de semana chegou e fiquei sozinho em casa sem nada pra fazer, um desastre.
Almoçava todo dia em um barzinho perto de cada e passava a tarde jogando video game. De noite minha mãe ligava perguntando se estava tudo bem e eu respondia que sim.
Pior que estava realmente tudo bem. Quem dera eu estivesse na situação do Tom Cruise no filme “Negócio Arriscado” em que tem que salvar o ovo de vidro da mãe que foi sequestrado por um cafetão enquanto ele tem a Rebeca de Mornay e lindas prostitutas pra lhe satisfazerem.
Mas eu só tinha o Marco Aurélio que disse que passaria na minha casa.
Domingo, dia anterior da volta das duas ao Rio Marco chegou com o George a tiracolo e fomos jogar video game. Mãe do Marco piorara da doença e ele não estava bem, foi bom para passarmos o tempo e eu “curtir” meu fracasso.
Lá pelas tantas comentei que perdia assim a grande chance de perder minha virgindade e que outra chance assim só deveria ter trinta anos depois quando Marco comentou “se pelo menos você tivesse ido ao Peixão”.
Parei de jogar e olhei para o Marco perguntando “Peixão? O que é isso?”. Marco contou que era o “puteiro” que ficava ali perto da minha casa na praia.
Foi aí que dei um salto da cadeira. Como assim? Eu vivera quinze anos na mesma casa do mesmo bairro e não sabia que tinha um local desses ali perto? Se soubesse tinha perdido minha virgindade aos oito anos !!
Enquanto Marco ria da minha situação puxei meu amigo pelo braço e disse que iríamos para lá naquele instante sem tempo a perder.
Puxei George também que reclamou que era sua vez de jogar.
Andamos um pouco e chegamos ao local. Lá fiquei extasiado. Era o paraíso, o local que sempre sonhei com mulheres belíssimas prontas para me transformar em um homem de verdade...
..ok, exagero de virgem. Era uma birosca que tinha duas mulheres.
Sentamos tímidos sob os olhares de uma gordona e uma desdentada. A desdentada até que era jeitosinha e fiquei de olho nela.
Pedimos cerveja enquanto a gordona perguntou se tínhamos idade para beber, mudamos para refrigerante e ela nos trouxe três guaranás.
Eu era o único ali com intenção de transar, George estava doido para ir embora e Marco perguntou para mim o que eu faria. Eu respondi que a desdentada era interessante e meu amigo chamou as duas.
Primeiro fez uma social conversando um pouco e elas perguntaram nossos nomes. George deu o seu e Marco respondeu que se chamava Sidney o que deixou George enfurecido perguntando porque ele tinha que dar o nome certo e Marco mentir. Começou a gritar que ele não se chamava Sidney e sim Marco Aurélio.
Logo após Marco disse que eu queria fazer um programa com a desdentada e perguntou quanto ela cobrava. Para minha surpresa a mulher disse que estava cansada e não queria fazer e ficamos sem saber como agir.
Ok eu já tomara fora de muitas mulheres na vida e ainda tomaria bastante, mas de prostituta era demais!!
Falei pro Marco que queria a gordona então e ele falou com a mulher que disse que não era segunda opção, eu já tinha escolhido a outra e ela não iria servir como reserva.
É, uma situação no mínimo inusitada.
Marco era bom de lábia e papo vai, papo vem conseguiu convencer a desdentada a fazer o programa.
Sinceramente eu não sei o que me deu mais pavor se foi em todas as vezes que me declarei a alguma mulher ou naquela que eu recebi um sim.
Fui com ela para os fundos da casa recebendo desejo de boa sorte de meus amigos e entrei em um quarto pequeno, poeirento com uma cama apenas com colchão.
A mulher mandou que eu desse o dinheiro e dei depois tirou a roupa ficando completamente nua na minha frente. Eu que nunca vira uma mulher nua ao vivo na vida fiquei embasbacado, sem reação.
Ela deitou-se e perguntou se eu ficaria ali parado em pé. Rapidamente tirei a roupa e deitei. Ela perguntou se eu ficaria de meias e tênis daí percebi que tirara tudo menos isso e me livrei.
O restante nem preciso dizer. Não teve sinos, não teve música romântica ao fundo pra celebrar o momento com mulher que eu amava, foi apenas perda de virgindade.
Saí de lá com sorriso no rosto, nem parecia que eu acabara de dar uma de São Jorge e enfrentado o dragão. Marco perguntou se estava tudo bem e respondi sorrindo com a cabeça que sim enquanto George dizia graças a Deus que podíamos ir embora e ele jogar vídeo game.
Voltamos para casa e no dia seguinte minha família chegou além de eu ter aula.
Andava pelo corredor do colégio quando encontrei a Ericka. Cheio de coragem cheguei perto de minha amada e lhe desejei bom dia dando um beijo em seu rosto e continuando a caminhar.
Cheio de pose, de auto-estima, muito homem. Eu me sentia como aquele moleque do filme com a Sylvia Kristel “uma professora muito especial” onde ela é empregada da casa e seduz um garoto de quinze anos, como eu. Só faltou que eu escutasse a canção do Rod Stewart ao fundo.
E era grande a vontade de dizer a todos que eu tinha transado.
Eu era o cara.
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