DINASTIA: CAPÍTULO XX - NOS EMBALOS


Pepe Granata perdeu seus filhos. Pepino morto afogado na própria piscina. Benito assassinado pelos irmãos e seus comparsas. Domenico nunca mais apareceu mesmo com toda a luta do Barão para lhe dar um enterro digno e Enrico, integrante de esquadrão da morte, foi preso, se converteu na cadeia tornando-se pastor, mas mesmo assim foi esfaqueado enquanto dormia. Morte Instantânea. Muitos inimigos.

Pepe Granata construiu um império. O banqueiro de bicho mais poderoso, um dos maiores empresários, deputado influenciando diretamente muitos políticos, juízes, elegendo, financiando, recebendo favores.

Venceu como queria, como prometera ao perder Beatriz sob a alegação que era pobre e não poderia lhe dar um futuro decente. Vingou-se, foi além do que imaginava. Destemido, corpo fechado, mas pagou preço alto por isso.

Perdeu todos os filhos, uma neta e sua esposa. Nunca se apaixonou por Cecília, mas tinha na mulher uma companheira, uma cúmplice. Pensava todos os dias em Beatriz, no amor de sua vida. Mas teve um bom casamento com Cecília. A mulher mais bacana, amorosa e amiga que conheceu e sofria sua perda.

Deprimiu-se, deixou os negócios de lado e vagava pela casa. Sentia o peso da idade, dos mais de sessenta anos. Perguntava-se se tudo valeu a pena.

Até que um dia juntando roupas da esposa para doar encontrou um caderno.

Quando pegou o mesmo e parou para analisar viu que era um diário.

Abriu para ler o diário de Cecília. Horas lendo sobre a vida dos dois depois de casados, tudo que ela sentia. Pepe se emocionou com a leitura. A mulher falando dos filhos, netos, da vida.

Emocionou-se com Cecília falando dele. Do homem forte, corajoso, contundente, bom pai e bom avô com quem se casou graças a uma relação sexual descuidada. No fim, quando ela escrevia sobre o dia que começaria levando sua neta ao dentista Cecília, como se pressentindo o que ocorria, escreveu.

“Pepe realizou meu sonho, ao seu lado consegui saber o que é felicidade”.

Pepe deixou cair algumas lágrimas, fechou o livro dando um beijo na capa e dizendo “te amo minha Cecília”. Ficou mais um tempo sentado, quieto quando o neto Luigi entrou no quarto.

“Nono, a mama pediu pra lhe avisar que está na hora da janta” disse Luigi.

Pepe enxugou as lágrimas e respondeu “sim bambino, estou descendo”. Luigi perguntou se o avô estava triste e ele respondeu.

“Estou feliz como há muito não me sentia”.

Isabela pegara o comando da organização da casa e dessa forma Pepe, ela os filhos da mulher com Pepino, Luigi e Ricardo, de Pepino com Bianca Luisa viraram uma família e se reuniram para jantar.

Enquanto comia Pepe lembrou-se do diário e o diário fez o homem se lembrar de porque tinha ido para o Rio de Janeiro. Era a volta do Barão de Feital.

Era o ano de 1975 e mesmo Pepe com sessenta e três anos voltava a comandar os negócios. Com rédea curta, seu jeito durão e um sorriso quando aparecia alguma adversidade. Comprou bancas do bicho, aumentou seu império, fez de sua escola de samba campeã do carnaval.

Com um grande amor pelo neto mais velho. Luigi em sua adolescência era um garoto bonito, cabelos loiros longos, adepto da calça boca de sino como os jovens da sua época. Adorava tocar violão em festinhas e seria ele o novo “imperador Granata” quando estivesse pronto.

Sempre andava com o avô. Curioso perguntava por tudo, se interessava, mostrava vocação para os negócios.

Um dia Isabela apareceu com uma novidade. Um namorado. Chegou à mansão Granata apresentando Leonardo Simão, um produtor musical da época que usava cabelo black power e era muito conceituado. Isabela tinha Pepe como um pai e por isso quis a aprovação do mesmo.

Leonardo era boa praça, ótima conversa e logo levou um vinho para o Barão. Conhecia a Itália, conversaram bastante sobre o país, ainda contou que seu pai lutou na revolução constitucionalista e
dessa forma “ganhou” o velho.

O namoro ficou sério e Leonardo pediu Isabela em casamento. Pepe sentiu tristeza por saber que sua família partiria, mas mesmo assim brindou aos noivos e fez uma grande festa na mansão para celebrar o casório.

No dia do casamento Luigi anunciou à mãe que não partiria, ficaria com o avô. Isabela não concordou, tentou convencer o filho a ir junto, mas o jovem bateu pé firme. Não teve jeito, Isabela cedeu e Luigi ficou na mansão com o avô e a irmão Luisa enquanto Isabela e Ricardo foram morar na casa de Leonardo.

Luigi tornou-se o melhor amigo de Pepe, seu cúmplice e dividia sua vida entre aprender o ofício do avô e curtir as coisas boas coisas que o Rio de Janeiro oferecia a jovens de sua idade. Todos os dias ia para praia conversar com sua turma em um trailer ou pegar onda no arpoador. Era adepto também do voo livre, fazia parte da geração saúde, apesar de ser consumidor de maconha.

E de noite ia para boates com os amigos e uma carteira de identidade falsificada para parecer maior de idade. Frequentava as discotecas da moda requebrando ao som de Bee Gees, Gloria Gaynor, Donna Summer, Jackson 5 entre outros.

Figurinha carimbada da noite carioca, várias vezes tendo seu rosto em colunas sociais Luigi Granata mesmo tão jovem era considerado um dos bons partidos da sociedade e o fato de nunca ser visto com namoradas atraía muito mais atenção das moças.

Nessa época Leonardo teve a ideia de aproveitar a notoriedade do enteado. Ele procurava alguma situação para ganhar dinheiro com música jovem no Brasil e num dia pensou “por quê não um grupo musical novo?”.

O primeiro nome que pensou foi no enteado que às vezes arranhava como cantor. Queria mais um rapaz e uma moça. Fez seleção e conseguiu juntar o trio a que deu o nome de “ritmo quente”.

Luigi garantiu a atenção necessária ao trio pelos fatos que disse acima e por ter um sobrenome polêmico. Ser neto de um bicheiro cuja família se envolvera em uma guerra pouco antes e por toda a nebulosidade que envolvia Pepe e Pepino fazia com o que muita coisa viesse à tona e pela primeira vez tocassem na polêmica sobre a passagem de Pepino pela Itália.

Pepe não gostava de exposição e sabia que para seus negócios quanto menos o sobrenome aparecesse melhor e essa foi à causa das primeiras desavenças entre avô e neto. Pepe exigia que Luigi saísse do trio enquanto o rapaz alegava que vivia um sonho e não poderia deixá-lo.

Em uma discussão Pepe irritado perguntou o que o neto queria afinal, ser cantor ou comandar os negócios da família. Luigi respondeu que cada coisa tinha o seu momento e na hora certa pegaria os negócios.

Pepe revidou que a vaidade e a vontade de ser famoso não combinavam com o tipo de negócios que a família conduzia e completou “não se deixe perder pela vaidade”.

Luigi ouviu os conselhos, mas não deu atenção. O grupo fazia sucesso e se apresentava por todo o país. O rapaz conseguiu milhares de fãs e se deslumbrava com isso. Mas ao contrário de seus companheiros de palco não se interessava por ninguém.

Era acompanhado de Alice e Gilmar. Um casal de irmãos bem apessoados, carismáticos e talentosos que ao contrário de Luigi sabiam aproveitar bem o momento. Eram tempos pré-AIDS, do amor livre e tanto um quanto outro tinha fila de fãs depois dos shows para “conhecerem melhor”.

Como diria Renato Russo em “Faroeste Caboclo” Gilmar “comia todas as menininhas da cidade” em festas com orgias e drogas. Alice não curtia pó, mas não se importava se era homem ou mulher, o que vinha ela agradecia enquanto Luigi trancava-se no seu quarto e se isolava.

Luigi gostava de se olhar no espelho, se admirar. Ficava de sunga na frente do mesmo olhando seu corpo, se tocava e dançava sozinho, em um ritual narcisista.

Uma noite depois do show bateram em sua porta e ele atendeu assim, só de sunga. Quando viu era Alice bêbada com uma garrafa de champanhe. Perguntou o que a mulher queria e ela respondeu que “brindar ao disco de ouro”.

Perguntou por Gilmar e a moça entrando sem ser convidada respondeu que se divertia com algumas fãs. Alice sentou-se em um sofá perguntando se iriam beber ou não.

Luigi pegou duas taças e Alice encheu as mesmas. Ergueu sua taça e disse “ao nosso sucesso”, Luigi brindou com a moça e naquele instante Alice lhe roubou um beijo.

Luigi se desvencilhou perguntando o que significava aquilo e Alice respondeu que “só fariam um amor gostoso, sem compromisso”. Luigi pedia para a mulher parar, que não tava afim e Alice insistia dizendo que “seria legal”.

Irritado Luigi levantou e gritou que ela parasse. Alice enfurecida se levantou e gritou que nunca ninguém recusara sexo com ela e Luigi emendou “não to afim, me respeite”.

Alice se sentindo humilhada pela recusa gritou “Viado!! Você é viado por isso nunca ta com mulher, por isso não me quis!!”. Luigi assustou-se com o que Alice respondeu e gritava que não era viado. Com a gritaria Leonardo apareceu no quarto perguntando o que acontecia e Alice gritou que Luigi era viado.

Transtornado Luigi se aproximou de Alice com a mão espalmada ameaçando bater na moça e Alice encostou seu rosto na mão do rapaz dizendo “vai, me bate seu viadinho de merda, mostra que pelo menos pra isso você é homem”.

Leonardo interveio e pediu que Alice saísse do quarto. A moça saiu ainda chamando Luigi de viado e o rapaz transtornado sentou no sofá. Leonardo pedia que ele se acalmasse. O rapaz respondeu que não tinha como, ela iria acabar com sua imagem e Leonardo fechou a porta dizendo que tinha como acalmá-lo.

Tirou um papelote de cocaína e espalhou o pó sobre uma mesa, Luigi agradeceu e respondeu “não transo drogas, só maconha”, mas Leonardo insistiu que faria bem ao rapaz. Ele acabou aceitando e experimentando.

Pela primeira vez Luigi usava cocaína e foi lhe ofertada pelo próprio padrasto.

Luigi tornou-se um consumidor voraz da droga também experimentando heroína e ácido. Alterava momentos de euforia com “bad trip” que atrapalhava o trio muitas vezes em suas apresentações. Sua relação com Alice depois do episódio no quarto nunca mais foi a mesma. Leonardo lhe dava broncas ameaçando de expulsão do grupo e Luigi ria respondendo que era um Granata e se quisesse seu avô lhe matava.

Única pessoa que ele ainda se dava bem era Gilmar que não estava nem aí para nada e só queria curtir. Mas mesmo com o rapaz Luigi já não se sentia tão a vontade. O jovem não conseguiu esquecer Alice gritando que ele era gay e se recusava a concordar com a moça mesmo não sentindo interesse por mulheres.

Mas Luigi começou a ver Gilmar de um modo diferente e isso perturbava o rapaz. Luigi se tornava cada vez mais irritadiço e dava mais problemas a Leonardo. Em um show subiu ao palco totalmente sem condições ao misturar álcool e cocaína, em outro nem apareceu.

Sentia desejo por outro homem, não queria admitir e sofria.

Depois de mais um show que se apresentou sem condições e recebeu uma sonora vaia da platéia Luigi foi direto ao hotel sem querer conversar com ninguém. Trancou-se no quarto e não abriu a porta mesmo com Leonardo batendo diversas vezes na mesma querendo falar com ele.

Luigi bebia, cheirava, afundava em sua viagem solitária. De novo bateram na porta, mas uma outra voz foi ouvida “abre cara, quero falar com você”. Era Gilmar.

Luigi decidiu abrir a porta e o rapaz entrou. Perguntou o que ocorria com Luigi e falou várias coisas. Luigi não prestava atenção em nada, só no rosto do rapaz e em um momento não aguentou dando lhe um beijo na boca.

Gilmar se afastou de Luigi e deu um soco em seu rosto dizendo “Alice tava certa, você é viado!! Nunca mais se aproxime de mim sua bicha!!”. Saiu enfurecido deixando Luigi no chão.

No dia seguinte Leonardo, Gilmar e Alice se reuniram na sede da gravadora para tratar da demissão de Luigi quando este entrou na sala sem ser convidado. Leonardo pediu pro rapaz se retirar enquanto ele se aproximava de Gilmar e lhe dava um murro com soco inglês na mão.

Gilmar caiu atordoado e Luigi continuou lhe esmurrando. O rapaz parecia possuído, ninguém conseguia lhe parar só foi parado quando a segurança lhe pegou. Gilmar desmaiado no chão estava com o rosto desfigurado e seguro pelos seguranças, sendo retirado Luigi gritou “faz show com o rosto assim filho da puta!!”.

O caso virou um grande escândalo. Luigi foi demitido do trio e Pepe lhe tirou da cidade por alguns dias para evitar a imprensa, não antes lembrar que a vaidade não combinava com o negócio.

Luigi depois de um mês fora voltou e disse ao avô que queria ser o novo “chefão”. Pepe sentindo o neto mais determinado e focado voltou a carregá-lo a todos os lugares e ensinar. Luigi passou a andar armado e com seguranças.

Sozinho no escritório do avô olhando a contabilidade foi procurado pelo irmão Ricardo.

Tempo que não se viam, Luigi deu um abraço em Ricardo perguntando o motivo da visita e reparando que o irmão estava com olho roxo. Perguntou o que ocorria e pela mãe.

Ricardo sentou e contou que Isabela tivera uma discussão forte com Leonardo por causa de Luigi e o padrasto agredira a mãe, ele tentou intervir e levou um soco.

Luigi perguntou pela mãe e Ricardo respondeu que estava internada em um hospital, mas não era nada grave. Ricardo completou que preferia falar com o irmão sobre o assunto porque se falasse com o avô fatalmente ele tomaria alguma atitude pior.

Luigi ouviu a tudo e mandou o irmão se tranquilizar que resolveria o problema e não contaria a Pepe.

Luigi foi até o apartamento de Leonardo e ele abriu com um copo de uísque na mão. Bêbado Leonardo perguntou o que “o viadinho queria”. Luigi entrou e disse que queria apenas saber uma coisa perguntando “você bateu na minha mãe?”.

Leonardo riu e respondeu “bati, por quê? Vai me bater com soco inglês?”.

Luigi falou que só aquilo que ele queria saber e sacou uma arma dando cinco tiros no padrasto.

Calmamente foi para casa e esperou que a polícia batesse na mansão atrás dele.

Algemado, com a imprensa presente a vaidade de Luigi ia até a estratosfera. Com o ego inflado sorria para os flashes, voltava a ser celebridade como sempre gostou. Pepe ao lado dizia em seu ouvido que não se preocupasse que lhe soltaria e Luigi gritou para que a imprensa guardasse.

“Podem fotografar, eu sou um Granata”.


CAPÍTULO ANTERIOR:

A GUERRA

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