QUINZE ANOS: CAPÍTULO II - JANEIRO


Antes de contar mais de minhas aventuras de adolescente deixem eu me apresentar melhor.

Como disse acima meu nome é Joaquim Quintanilha de Castro Neto e como vocês podem perceber pelo meu último nome tenho o mesmo nome que meu avô..nossa que inteligente eu sou..

Mas não tenho o mesmo nome do meu pai que se chama Ednaldo, mas é mais conhecido como “China”.

Pelos amigos e parentes de meu pai sempre fui conhecido como “Chininha” e do lado materno Quinzinho, o que acabou ficando.

Nasci no Rio de Janeiro em 9 de agosto de 1974, mesma data que nasceu minha avó, lógico alguns bons anos antes e tinha quatorze anos no período que relato nessa história. Morava na Ilha do Governador desde que nasci.

Na verdade nasci em um hospital da Tijuca, mas a casa ficava na Ilha..não moraria no hospital pra sempre né? Nem aquele menino que morava dentro de uma bolha viveu.

No meu convite de aniversário de um ano de idade estava escrito “nasci no dia da vovó e tenho o nome do vovô” quer dizer, meu mesmo tinha porra nenhuma.

Filho único tanto da parte da minha mãe quanto de meu pai, apesar de que já mais velho soube que meu pai tivera uma filha com outra mulher que morreu com dois anos, sem primos de minha idade acabei virando o “queridinho” da família. Primeiro bisneto, neto, filho e sobrinho.

Minha bisavó mãe de minha avó Lieida, dona Ema, morreu quando eu tinha cinco anos. Aproveitei pouco, mas soube aproveitar esse convívio com ela.

Minha bisavó sempre comprava lancheirinhas pra mim e fazia pastéis deliciosos. Sua partida foi a primeira vez que convivi com a morte. Convivi outras vezes já adulto e de forma mais traumática.

Minha avó tinha duas tias chamadas Oneida e Nair. Elas já passavam dos oitenta anos de idade e as vezes eu ficava no apartamento delas na Tijuca. Faziam bolinhos maravilhosos que chamavam “docinho da vovó” e contavam histórias que presenciaram no início do século XX.

Inclusive histórias que passaram dentro do palácio do governo do Rio de Janeiro. Eram parentes de Alfredo Backer que no começo do século passado foi presidente da província do Rio de Janeiro.

Além delas tinha a Joaquina, senhora humilde que não sabia ler e escrever e que por décadas foi empregada delas. Com o tempo acabou incorporada pela família e as três viraram minhas bisas.

Sempre tive um convívio muito maior com o lado materno da minha família, conheci e conheço muito pouco do lado paterno, inclusive meu pai.

As mulheres da minha vida, que me moldaram foram minha avó e minha mãe.

Com a minha avó me interessei por cultura. Aprendi a ler livros, a gostar de ir a cinema, teatro. Sou leonino como ela e somos parecidos em algumas coisas e que fez com que batêssemos de frente várias vezes. Nunca fomos de abaixar a cabeça e sempre tínhamos uma resposta firme pronta pra quando atacados.

Com ela aprendi que através da palavra podemos magoar e ferir mais que com os punhos. Ela sabia fazer isso como ninguém através de cartas que escrevia. Eu de uma geração mais moderna aprendi e hoje faço isso através de e-mails, redes sociais e programas de mensagens instantâneas.

Com ela adquiri cultura e personalidade forte.

Com minha mãe veio o lado mais sensível. Minha mãe sempre foi uma mulher doce, tinha ares de um personagem de roteiros trágicos como o teatro sempre adorou criar.

Sofreu muito na vida, deixou muitas lágrimas rolarem de tristezas e decepções e apesar de aparentar alegria e ser uma pessoa determinada sempre me pareceu uma pessoa triste.

Coisa que depois de adulto tive certeza.

Era como disse doce, escrevia poesias e diários que nunca mostrou a ninguém escondendo em gavetas. Quando triste trancava-se no quarto ouvindo Roberto Carlos e ai de quem lhe incomodasse. Sempre foi minha companheira, minha melhor amiga, o amor de minha vida.

De minha mãe herdei o bom caráter, o respeito às pessoas, a ser um passional no amor. Acabei me tornando escritor graças a cultura adquirida com a minha avó e a sensibilidade que herdei de minha mãe.
Pronto, mostrei um pouco de mim vamos então a janeiro de 1989.

Estava eu na sala no começo do ano jogando river raid desesperado porque estava perto de bater o recorde, mas meu tanque de combustível estava vazio e eu não conseguia recarregar quando minha mãe pediu que eu desligasse o atari e ligasse a tv pra ver notícias do Bateau Mouche.

Nessa dela me encher o saco acabei batendo e puto desliguei o vídeo game e liguei a tv. Nela passava noticiário da televisão com o naufrágio do barco Bateau Mouche no reveillon que ocorrera dia anterior.

Bateau Mouche (Wilkipédia) - O Bateau Mouche IV foi uma embarcação de turismo que naufragou na costa brasileira no dia 31 de dezembro de 1988, mais precisamente na Baía de Guanabara, no Rio de Janeiro, quando estava a caminho de Copacabana. Das 142 pessoas a bordo, 55 morreram. Acredita-se que a embarcação estivesse superlotada, além de apresentar uma série de falhas.

Minha mãe ficou sentada na sala pasma assistindo a reportagem do naufrágio enquanto minha avó me chamava no andar de cima pra ajudar na bagagem. Subi e ela estava com três malas fechadas, parecia que iríamos nos mudar de vez e não passar apenas alguns dias em Maceió. Minha avó sempre foi exagerada com isso.

Pegamos as malas e minha mãe chamou um táxi.

Enquanto esperávamos o veículo minha avó recomendava a Mauro e Batista, amigos de minha mãe, que tomassem conta da casa e dessem comida aos cachorros. Minha mãe tinha um namorado chamado Pinheiro que era fuzileiro naval e acabou fazendo amigos entre os fuzileiros, entre eles Mauro e Batista que acabaram sendo os mais chegados à nossa família.

Minha mãe montou um time de voley com eles que era a única mulher, chamava-se “Tô que tô” graças ao bar da esquina de minha casa que tinha esse nome e bancou as camisas do time. Pinheiro estava em sua cidade de férias e Mauro e Batista se prontificaram a tomar conta da casa.

Na minha cabeça aquilo daria merda, mas voltemos a viagem.

O taxista era o mesmo que sempre pegávamos e ele foi papeando com minha avó até a rodoviária. Minha avó adorava conversar seja com conhecidos ou não e a Freguesia, bairro da Ilha do Governador onde morávamos, é um bairro familiar que lembra cidades do interior onde todos se conhecem. O jornaleiro, taxista, dono da pizzaria, o farmacêutico, o carteiro, gari. Todos que trabalhavam na Freguesia ou tinham comércio na área eram íntimos dos moradores.

Como no caso do taxista.

Chegamos à rodoviária em cima do laço e com aquela rodoviária lotada das pessoas voltando do reveillon carioca foi um desespero para chegarmos até nosso ônibus, mas conseguimos na hora que ele partia.
Pedimos desculpas e entramos. Minha mãe e minha avó sentaram juntas e eu ao lado de uma senhora enorme com um bebê chorando.

E seriam trinta e seis horas assim.
           
Tomei um remédio chamado “dramim” que atua contra enjoos. Desde pequeno eu enjoo com viagens e tomo esse remédio como prevenção. Até hoje é assim e sempre que tomo durmo quase que imediatamente.
Então nem vi muito a mulher ao meu lado discutindo o tempo todo com o restante da família que estava em outras poltronas e o bebê chorando, nem vi a hora que ela discutiu com o pai da criança e me contaram que só faltaram se bater.

Tomava o remédio de oito em oito horas e só acordava para descer nas paradas e me alimentar. Nessas horas ocorria minha maior preocupação em uma viagem que era perder o ônibus. Insistia com minha mãe e minha avó para que se apressassem e as duas calmamente se alimentavam, iam ao banheiro e só depois caminhavam ao ônibus.

Por curiosidade a única vez que ocorreu de perder o ônibus foi comigo sozinho anos depois, portanto a culpa foi minha. Eu que tinha tanto medo de perder foi quem causou o problema.

Mas essa é outra história.

Chegamos a Maceió debaixo de forte Sol e uma senhora nos esperava.

Chamava-se Emeridiana e ela conheceu minha avó em uma viagem de turismo que fizeram juntas. A senhora era bem alegre e veio correndo abraçar minha avó e a gente como se fôssemos conhecidos de anos.
Apertou minha bochecha e disse que eu era um “menininho muito bonito. Duas coisas que detesto, ser chamado de menininho e apertarem minha bochecha.

O marido se Emiridiana se apresentou, chamava-se Ari e pra minha sorte pegou a mala mais pesada e nos chamou para ir embora. Mostrou sua caminhonete e entrou para dirigir com minha avó ao lado conversando animadamente. Emiridiana e minha mãe subiram na caçamba tranquilamente e eu gelei.

Gordo sempre se ferra nessas horas. Respirei fundo e botei meu pé pra alavancar. Consegui subir, mas deve ter sido uma das cenas mais grotescas da história da humanidade. Ari dirigiu por Maceió mostrando aquelas praias maravilhosas. Minha mãe fechava os olhos para sentir a brisa no rosto e eu sentado na beirinha da caminhonete olhava pro chão e me preocupava em não cair.

Depois de muito andar chegamos na casa do casal na beira da praia de Jatiuca, uma coisa espetacular. Areia branca, mar azul e uma casa muito bonita. Aquilo ali devia ser sucursal do paraíso.

Emeridiana apresentou seus filhos. Arizinho que não parava de falar e Alice que tinha uns dez anos de idade e cara de mal humorada. De repente chegou uma senhora correndo. Era a mão de Emerediana que abraçou a todos gritando feliz da vida e na minha hora apertou minha bochecha falando “que gordinho bonitinho”.

Pronto, pior que me chamar de menininho era chamar de gordinho.

Fui apresentado também ao pastor alemão da família que pelo semblante ao me olhar pareceu não gostar muito de mim. A família estava toda completa, apresentada, pronto já podíamos almoçar porque eu estava verde de fome.

Mas ainda faltavam pessoas.

De repente uma loirinha linda apareceu de dentro da casa. Ela tinha 17 anos e um sorriso como poucas vezes vi igual.

Pronto, estava apaixonado.

Fabíola, era esse seu nome, foi apresentada a todos nós e na minha hora comecei a torcer baixinho “aperte minha bochecha, aperte a minha bochecha”. Ela só deu um sorriso, beijou meu rosto e perguntou se eu estava bem.

Nesse momento agi como Clark Gable em “E o vento levou” puxei pelos braços e disse “melhor agora baby” tascando-lhe um beijo apaixonado.

Mentira...olhei todo tímido e respondi “tututututudo”..assim mesmo, gaguejando.

Eu era um idiota...

Naquele instante chegou a Fabiana, irmã gêmea da Fabíola e também nos cumprimentou. Bonita como a irmã, mas nessas coisas do coração não se manda e o meu já estava com Fabíola.

Entramos, almoçamos e depois fomos para a sala bater papo. Os adultos ficaram em um canto conversando, as crianças foram brincar e eu e Fabíola bater papo no sofá.

O papo fluiu com ela com muita naturalidade. Parecia que nos conhecíamos há anos e olha que eu sempre fui muito tímido no trato com as mulheres, mas eu tinha uma vantagem quando vencia essa timidez. Meu humor. Sempre fui um cara bem humorado, de tiradas e isso fazia as mulheres rirem e fazer uma mulher rir é um grande passo quando queremos algo.

Passeamos de noite. Fabíola e eu sempre conversando e no fim ela se despediu de mim com um beijo no rosto me desejando boa noite e indo dormir.

Deitei pensando naquela menina maravilhosa, aquele sotaque delicioso. Queria a Fabíola pra mim, mas ela era três anos mais velha e nessa fase mulher dificilmente dá margem a meninos mais novos. Fora que eu era gordo, ela devia ter um monte de gatos a seus pés.

Dormi e no meio da madrugada me deu vontade de ir ao banheiro. Levantei e dei de cara com Fabíola bebendo água.

Ela com o copo na mão me viu e continuou bebendo a água. Vestia um baby doll preto curtíssimo com uma das alças caída na altura dos seios. Fabíola com olhar malicioso encostou o copo no rosto e perguntou se eu queria. Não pensei duas vezes e fui ao seu encontro. Coloquei o copo na mesa e lhe dei um beijo apaixonado, forte. Depois peguei Fabíola no colo e coloquei sobre a mesa fazendo amor com ela ali mesmo sem me importar se seria pego ou não.

Enquanto fazia amor com ela minha mãe fez carinho na minha cabeça e me mandou levantar que iríamos à praia.

Abri os olhos e sonolento dei de cara com ela pedindo que eu não demorasse. Ali me toquei que a história toda da água era apenas um sonho e pedi a minha mãe que fosse à frente que eu não demoraria. Ela tinha que ir antes. Não podia me ver naquele estado.

Fomos todos à praia em frente. Fabíola linda de biquíni mandava que eu tirasse a camisa e fosse com ela até a água. Eu branco feito um fantasma de sunga, camisa branca, chapéu e óculos escuros respondi que já iria.
Peguei uma cadeira de praia e abri debaixo de uma sombra onde fiquei lendo o jornal. Fiquei um bom tempo ali naquela situação patética até que senti me puxarem.

 Era Fabíola irritada mandando que eu saísse daquela sombra e fosse com ela pra água.

Tentei argumentar, mas deu em nada. Tirei o chapéu, óculos e camisa mostrando meu corpo escultural e de mãos dadas com ela caminhei em direção a água. Areia escaldante que me fazia andar na ponta dos pés.
Entrei na água e ela estava geladinha, transparente dando para ver os peixinhos nadando. Olhava Fabíola brincando na água com aqueles seios perfeitos querendo furar o bíquini e me contorcia para que ela notasse nada de errado.

O mar estava uma delícia e não saí mais dele. Minha família, Fabíola e sua família entravam e saíam da água e eu continuava feliz da vida.

Em um momento quis impressionar Fabíola e comecei a pegar jacaré. O termo “jacaré” é usado no Rio quando decidimos nadar a onda até seu fim.

Até que veio uma onda forte que me atropelou. Parei no fundo da água e quando voltava veio outra me derrubando de vez e parei na areia com a sunga nos joelhos e com a bunda de fora.

Foi um dia muito divertido. Nada divertido foi depois.

Voltamos para a casa, tomei um banho e depois percebi que tomara Sol demais. Meu corpo todo ardia demais e ninguém poderia nem assoprar perto que doía tudo. Minha mãe passou creme em mim e fiquei todo branco. Branco e ardido.

Acabou que nem pude aproveitar o Sol nos dias seguintes. Ficava sozinho em casa com dona Carmelita, avó de Fabíola, que se tornou uma grande fã minha rindo de tudo que eu falava, mesmo coisas que eu nem achava graça.

Ela dizia que eu era engraçado até de mau humor, coisa que com a vida percebi que era verdade.
Eu não conseguia me declarar a Fabíola, algo característico por toda a minha vida foi essa timidez em relação às mulheres. Meu silêncio fez com que eu muitas vezes perdesse mulheres que eu amava pra amigos, inimigos, todo mundo em geral.

Os dias passaram e eu sarei podendo voltar a praia. Preparei-me todo para ir com os outros e quando coloquei o pé pra fora da casa começou a chover e não foi uma simples chuva. Uma chuva que durou cinco dias sendo que eu tinha apenas mais uma semana em Maceió.

Cinco dias, o que faltava para Fabíola ir embora. Ela tinha um curso para fazer numa cidade vizinha e ficaria quatro dias fora. Quando voltasse eu já teria ido embora.

Na noite anterior a sua partida fomos todos a um parque e ela comia algodão doce enquanto eu chupava drops. Estava nervoso porque queria revelar o que eu sentia, tentava arrumar coragem para me declarar.
Fabíola percebeu que eu não estava normal e perguntou se ocorria algo. Respondi que não e ela pegou na minha mão comentando que ela estava gelada.

Não sei se estava realmente gelada, mas ficou muito depois que ela pegou. Além de gelada minha mão começou a tremer e a moça preocupada perguntou o que eu tinha e pediu que eu contasse.

Decidi que era o momento, eu tinha que contar. Coloquei um drops na boca e em pensamento resolvi que assim que engolisse contaria que estava apaixonado por ela e queria seu amor para sempre. Virei pra ela e disse que contaria.

Só que me engasguei com o drops.

Comecei a ficar verde, amarelo, azul, branco me mostrando um grande patriota. Fabíola perguntou se estava tudo bem e eu já roxo tossia, tentava respirar apontando pra garganta. Ela então entendeu o que ocorria e se desesperou chamando a todos.

O restante do pessoal chegou e seu Ari deu uma porrada nas minhas costas que fez o drops ser arremessado longe. Enquanto Arizinho ria de mim Fabíola acariciou meu cabelo e mandou que não lhe desse mais sustos porque eu era como um irmão pra ela.

Como um irmão..aquilo acabou com a minha vida, meu mundo. Abaixei os olhos e agradeci.

Na caçamba da caminhonete voltando para a casa Fabíola perguntou o que eu contaria na hora que engasguei. Sem graça e me sentindo derrotado respondi que era nada, bobagem minha.

Deitei sabendo que não veria meu amor na manhã seguinte e talvez nunca mais visse. Deixei uma lágrima cair e dormi.

No meio na noite sinto alguém entrar no meu quarto. Mexem no meu ombro e quando abro os olhos descubro que é Fabíola. Ela senta na cama e faz carinho no meu cabelo.

Olha pra mim com muito carinho, passa a mão no meu rosto e pede que eu nunca me esqueça dela. Respondo que nunca me esquecerei. Ela me dá um beijo no rosto, muito próximo a boca. O beijo mais próximo a boca que tive até então e vai embora fechando a porta.

No dia seguinte acordo e ela já partira. Fico sem saber se aquilo foi um sonho ou realidade.

Os dois dias seguintes foram sem graça. Fui à praia, passeei, mas não tirava o pensamento de Fabíola. No fim dos dois dias a família da moça nos leva até a rodoviária e se despede de nós pedindo que voltássemos e prometendo nos visitar.

Tomei meu dramim e o ônibus partiu rumo ao Rio de Janeiro. Nunca mais voltei a Maceió e eles nunca foram ao Rio. Nunca mais vi a Fabíola.

Mas parti com a certeza que cumpriria a promessa que fiz naquela madrugada em meu quarto.

Eu nunca lhe esqueceria.



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