O MARACANÃ E O FLAMENGO


Semana passada o Maracanã fez 70 anos. Será mesmo? Dá pra dizer que o Maracanã é o mesmo? Dá pra dizer que aquele Maracanã que existia até 2010 ainda existe?

O Maracanã não era apenas o maior estádio do mundo, também sempre foi o mais democrático. Lá ricos e pobres se misturavam, gente de todos os tipos e as cores faziam a maior festa democrática de um país que nem sempre foi democrático. São incontáveis as imagens da geral do estádio com pessoas pobres, sem muitas condições com poucos dentes e um radinho de pilhas no ombro roendo as unhas, sofrendo e vibrando igual as pessoas dos locais mais nobres do estádio. Epa, local mais nobre? Não, não existia local mais nobre que a geral, erro meu.

Sim, nem sempre dava pra ver o jogo legal de lá, tinha risco de arrastão, tomar saco de mijo na cabeça, mas era a geral!! Local que a bola caía e o pessoal em vez de devolver jogava pelada com ela, onde as torcidas se misturavam sem brigas, apenas no ideal de acompanhar seus times.

Era a magia de um lugar mágico. Palco de alguns dos maiores momentos da história do futebol. Local de choro, riso, emoção, eterno. Do silêncio ensurdecedor que se ouviu em 1950, do pronunciamento ruidoso que infelizmente o país não ouviu pedindo pelas crianças em 1969, local de gol espírita, de barriga, de exorcismo de fantasmas de 21 anos, local épico e como eu disse, mágico. Magia de sair de um túnel escuro com água no chão e dar de cara com uma luminosidade fantástica de um gigante repleto de cores e cantos. Quem foi um dia ao antigo Maracanã nunca esquecerá dessa visão.

Aquele Maracanã não existe mais.

Não serei intransigente, evidente que melhorou em muita coisa. Os banheiros agora são muito melhores, ninguém mais pisa em água, existe conforto, mais segurança e isso tudo é muito importante. Não perdeu sua força, seu magnetismo, mas não tem mais magia.

Como aquele que sempre foi seu ator principal. Nem sempre com dinheiro, nem sempre com grandes times, nem sempre vencedor, mas sempre lá com sua gente, sua força, seu magnetismo e também sua magia. Não existia nada mais bonito e democrático que ver o Flamengo, sua raça e sua gente no Maracanã.

Mas o Maracanã e o Flamengo estão diferentes.

Assim como o Maracanã o Flamengo está mais bonito. Rico, poderoso, organizado, com um elenco fantástico pronto para continuar a história que vem fazendo, uma dinastia não vista nem nos anos 80. O Flamengo nunca foi tão bem gerido, tão poderoso, tão temido, poucas vezes deu tanto orgulho esportivo ao seu torcedor quanto agora.

Ms pelo menos nesse momento, como o Maracanã, perdeu a magia.

Sua gente não está mais no estádio, ficou caro acompanhar o Flamengo, o desdentado com radinho de pilha deu lugar ao bem nascido que faz selfie com Iphone, onde antes era a geral hoje é o ingresso mais caro do estádio. A torcida que não pode ir mais ao Maracanã só pode agora chegar perto de seu amor em aeroportos na contratação de jogadores ou festas na rua por títulos, por sua sorte e competência tem sido frequente. 

Mas o Flamengo que sempre foi do povo agora se alia aos poderosos, faz troca de favores, empurra o pé na porta e força a volta do futebol em meio a uma pandemia e em troca o governo aprova uma MP que lhe favorece e consegue patrocínio milionário de um banco estatal. O Flamengo virou cúmplice do que existe hoje de pior no país.

E juntos, Flamengo e Maracanã que tanto escreveram páginas lindas, escreveram quinta passada a página mais triste de suas histórias, seja em separado ou em conjunto.

O Maracanã não merecia aquela festa melancólica de 70 anos, o Flamengo não merecia viver sua melhor fase esportiva em sua pior fase humana. Nós não merecíamos ver isso.

Aliás, nem vimos, não foi mostrado.


O Maracanã e o Flamengo é aquele casal que deu certo e precisa rever sua relação.


Sua relação com a gente. 



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