PRIMAVERA PORTELENSE, INVERNO NO GATO MOLHADO
* Coluna publicada no blog Ouro de Tolo em 26/5/2013
E a
esperança venceu em Madureira. Um dia mais tranqüilo que se prometia na rua
Clara Nunes, mas tenso. Não apenas tenso para quem estava lá lutando por um
sonho, mas para sambistas, portelenses ou não, de todo o país que pararam no
domingo 19 de maio de 2013 para acompanhar o que ocorria nas eleições da
Portela.
Muitos
corações unidos em uma só vontade, trazer a maior campeã do carnaval de volta
ao lugar que é dela. A disputa foi árdua, emocionante, eu tive que sair e toda
hora enchia o saco do dono do blog tenso com a demora do resultado e ele veio.
Três
votos. Apenas três votos. Para os pessimistas o susto e o pensamento que quase
o Nilo ficou. Para os otimistas o susto, mas o grito de liberdade e a
estrondosa vitória em um sistema eleitoral viciado e preparado para a
perpetuação de um comando escuso, sombrio e terrível para a Portela.
Uma
vitória consagradora, emocionante. Fiquei arrepiado e com olhos marejados
depois ouvindo pela rádio Arquibancada o momento do anúncio e os depoimentos
com voz embargada pelo choro da felicidade de amigos que prezo tanto. Ri e
entendi perfeitamente a emoção do amigo Pedro Migão ajoelhado no vídeo mostrado
pela Globo. Sou emocional, sou passional, passei por muitas emoções no samba e
fico feliz de verdade quando vejo amigos passando por isso.
É a
primavera portelense. A liberdade, o Sol que há de brilhar mais uma vez, que
apesar de você amanhã há de ser novo dia e todas as músicas possíveis para se
cantar que lembram a liberdade.
Nilo
partiu num rabo de foguete para nunca mais voltar. A Portela não será mais
subtraída em tenebrosas transações. Dará certo? Não sei. A Portela passa pelo
mesmo momento que meu Flamengo, o Flamengo do Migão e acho que ali está dando
certo. Partindo da premissa da teoria de Tiririca que pior que está não fica e
confiando nas pessoas que estão agora no comando da Portela acho que vem essa
virada.
Não acho
que será rápida. A nova direção passará percalços, terá que mapear uma dívida
que promete ser indecente e como toda administração de pessoas sérias
equacionar essa dívida. Nosso Migão é agora do conselho fiscal e como
entendedor de economia será um dos responsáveis por ajudar as finanças
portelenses. Conhecedor de sua capacidade e do seu amor pela Portela desejo boa
sorte.
Confio
tanto nessa nova administração da Portela que no começo do ano recebi sondagem
para fazer samba na escola caso a oposição vencesse e farei.
Fiz uma
tentativa no carnaval 2003 de fazer samba para a Portela. Minha primeira
tentativa fora da Ilha, com parceria de amigos, mas sem nenhuma estrutura. Só
acostumado com Boi da Ilha (mesmo já tendo vencido o Estandarte de Ouro) e na
administração Carlinhos Maracanã que anda meio esquecido, mas é fato que foi
tão desastrosa quanto do Nilo.
Na época
tinha a opção covarde de cortar samba na fita, fato que privilegia compositores
com maior poder aquisitivo em relação a outros. Não tínhamos grana e fomos
cortados dessa forma. O samba não era grande coisa, mas podia ter ido pra
disputa.
Esse ano
volto com uma parceria estruturada, com passagens por Beija-Flor, Imperatriz e
Mangueira, campeão na União da Ilha e acredito que mais amadurecido para
entender a Portela.
Não será
fácil. A Portela é uma espécie de seleção brasileira do samba. A casa dos
mestres, dos melhores compositores e estou indo pra aprender com esses mestres.
Evidente que não sou bobo, estou me cercando bem e faremos samba de qualidade.
Mas ali é outro nível e eu e meus parceiros queremos chegar a esse nível.
É tempo
de colher as flores da primavera portelense.
Até
porque não são em todas que podemos colher flores, nem mesmo passam por
primavera. Outras estão em pleno inverno e não acredito que saiam dele tão cedo
como é o caso da Acadêmicos do Gato Molhado.
A
Acadêmicos até vem sendo administrada por pessoas inteligentes, com influência
e é inegável seu crescimento nos últimos anos. Acontece que você ser
inteligente, influente e bom gestor não faz de você o “pica das galáxias”, uma
pessoa imune a erros e melhor que as outras.
A Gato
Molhado vem pecando em seus concursos de samba-enredo, seu calcanhar de
Aquiles. Começou dando preferência aos sambas do filho do diretor de carnaval e
do cantor da escola. O cantor é aquele que não assina sambas, mas está em todos
vencedores e acaba ganhando duas vezes, como compositor “por fora” e na parte
retida do direito de arena dos compositores pela escola. É um rapaz muito
inteligente. Está no meu dinheiro e o de
vocês também.
Ano
passado a Gato Molhado quis mostrar que seu concurso era sério e não deu samba
nem pro filho do diretor nem pro cantor, justo no ano em que vieram melhor. O
presidente bateu no peito, disse que quem mandava era ele e escolheu o pior da
final.
Tomou pau
na avenida, como tomou nos outros anos. Mas o presidente é malandro e sempre
culpa outras situações. A desse ano escolhida pelo presidente gato molhadense
foram as alas comerciais.
Agora pra
2014 a Acadêmicos do Gato Molhado inova. O presidente chama compositores de
fora da comunidade para fazer samba na agremiação, melhor, indica com qual
parceria esses compositores devem se acertar. Isso provocou uma situação única
na fauna nacional. O engarrafamento de pombos.
Vários
pombinhos branquinhos, bonitinhos, vindos da Europa, de Niterói, da Zona Norte
do Rio se enfileiraram em uma porta e bateram nela pedindo para entrar e se
protegerem do frio do inverno gatomolhadense.
Mas na
verdade o presidente queria um pombo específico e avisou a parceria. Essa já
tinha acertado com outro e teve que mudar para assim atender o presidente.
Dessa
forma o presidente montou a parceria para esse ano. Montou a dedo, mas faltava
um. Tirou um integrante de uma outra parceria e levou para essa.
Assim
chegou Mané Toquinho. Um bom compositor e cantor que sempre falou mal de uma
parceria, tinha verdadeiro ódio por ela, xingava, brigava com amigos por se
aproximarem dela, levava a disputa com eles para o lado da guerra e no fim se
juntou a esse grupo que tinha nojo.
Tudo por
ordem de seu padrinho que sempre combateu essa parceria, fez de tudo para que
ela fosse aniquilada e agora se rendeu e colocou seu pupilo para assinar com
eles.
Quanto
custa um homem? Não sei. Não sou romântico nesse aspecto e acredito que
realmente todo mundo tenha seu preço. Mas tenho o orgulho de não saber qual é o
meu por nunca chegarem nem perto dele.
Pra que
eu me venda, para que eu traia amigos, posições, pensamentos têm que ser muito
caro. Para que eu chegue em casa e não tenha hombridade de olhar nos olhos da
minha filha tem que ser muito dinheiro, mas muito mesmo. No mínimo um que mude
o futuro dela.
Enquanto
não chegam a esse preço posso bater no peito e dizer. Não traio amigo, não
traio pensamento, não traio valores. Não viro amigo de quem não gosto, não me
sujeito, não me deprecio em troca de trinta moedas. Ganhei sambas nas escolas
que EU QUIS GANHAR, ganhei os prêmios QUE EU QUERIA TER sem nunca me vender, me
rebaixar, me prostituir, bajular.
Não
freqüento escolas de samba o ano inteiro, não vou a festinhas de alas, não sou
simpático quando não quero ser ou com quem não quero. Sou tímido, caseiro,
introvertido com quem não conheço e não vou fazer festinha pra ninguém só por
interesses, visando disputas de samba. Posso errar elogiando alguém, mas se
elogio é porque naquele momento achei que merecesse, não pra ganhar na frente.
Só falo “sou seu fã” e “tamos juntos” com quem sou fã e quero estar junto
mesmo.
Sou amigo
de 99,99% dos compositores com quem já concorri. Por isso já fiz sambas com
quase todos eles. Por causa disso nunca cuspi pro alto pra depois não cair na
minha testa. Por causa disso nunca passei pelo constrangimento que passa agora
Mané Toquinho.
Na minha
opinião ficar em camarote presidencial é merda, ganhar pulseirinha pra ir a
camarotes ou mesas é merda, tendo dinheiro eu compro, não tendo fico em pé.
Ganhar samba-enredo é legal, mas tenho ambições muito maiores para minha vida e
se tenho é porque sou maior que isso. Sou maior que uma vida de compositor de
samba-enredo.
Ganhei
samba pra cacete em 16 anos, só um no especial, mas tenho exatamente a
quantidade de vitórias e sucesso no samba que corresponde a meus valores e
pensamentos e isso é meu maior orgulho no carnaval.
Aliás,
curioso que tem gente que não me valoriza da forma que mereço e todos os anos
se surpreende com os sambas que faço parte. Das duas uma. Sou um cara
imprevisível ou são muito burros e apenas vivem em seus mundinhos.
Pequenos
poderes conquistados por pequenas pessoas.
Mas
enfim, qual o preço do homem? De alguns vinte mil reais. Dinheiro que já ganhou
uma vez e durou nem dois meses. Pobre Mané Toquinho, desse jeito terá que
continuar “invadindo” parceria dos outros.
Mas assim
segue a vida. Primavera para alguns, inverno para outros.
Cada um
tem a estação que merece.
Não é a primeira vez que leio esse texto. Nem a primeira vez que me identifico tanto com ele e com o seu autor. Só digo uma coisa, Poeta: Orgulho de ser seu parceiro na PORTELA, em plena primavera da Escola. É hora de colhermos as flores.
ResponderExcluirOrgulho é meu poeta, vamos colher as flores
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