NEVER CAN SAY GOODBYE
*Conto publicado no blog Ouro de Tolo em 22/9/2012
Esse é o nome de uma famosa música americana dos anos 70, a era disco. Foi gravada pelos Jackson 5, Gloria Gaynor e por diversos artistas. É a música preferida do personagem principal dessa história.
Jardel
era um cara cinquentão já. Trabalhara anos como executivo de uma multinacional
e cansou da vida, cansou da rotina. Encerrou um casamento de trinta anos, com
três filhos já criados e deixou a empresa recebendo uma boa bolada.
Começava
uma nova vida. Alugou um apartamento de frente para o mar de Ipanema, começou a
cuidar da saúde acordando cedo todas as manhãs para fazer cooper, na volta
tomava água de coco em um quiosque e reparava nas menininhas.
Conheceu
uma galera mais nova e se tornou adepto do voley de praia e do futvoley, com
certo atraso Jardel entrava para a “geração saúde”.
Mas desde
pequeno Jardel se acostumara a trabalhar e não conseguia ficar parado, mas
também não queria mais saber de escritórios. Tinha um bom dinheiro no banco e
queria utilizá-lo de alguma forma, pensou, pensou e decidiu unir o útil ao
agradável.
Adorava
música, principalmente dos anos 70. Gloria Gaynor, Donna Summer, Barry White,
Stevie Wonder, Bee Gees, tudo que envolvia aquela época. Soube que uma boate estava a venda perto de
sua casa, consultou suas finanças e viu que dava.
Comprou a
boate, reformou e transformou a casa dando-lhe estilo anos 70, deu o nome de
“night fever” ao local.
E a Night
Fever foi um sucesso. A casa “bombou” todos os dias frequentada por cinquentões
saudosos e pela juventude curiosa querendo saber mais sobre aquele estilo de
música e de vida.
Jardel,
dono da boate, ia todos os dias não só para trabalhar como para se divertir.
Jardel revivia seus tempos de “os embalos de sábado a noite” e se acabava na
pista de dança. Todos paravam para vê-lo e aplaudir.
Jardel
vivia a vida que pediu a Deus. Passava o dia na praia, se divertindo,
praticando esportes e de noite ganhava dinheiro e aproveitava a solteirice em
sua própria boate. Nem os problemas com a ex mulher que lhe importunava dia e
noite pedindo dinheiro e coisas para os filhos tirava seu bom humor.
E
aproveitava para “tirar o atraso” depois de trinta anos de casado. Cada noite
era uma mulher diferente, as vezes várias em festinhas que realizava com amigos
no apê de Ipanema. Bebida e viagra correndo a solta e de manhã enquanto todos
os amigos curtiam ressaca ele cheio de disposição corria até o Arpoador e voltava.
Mas
Jardel era um romântico a moda antiga, começava a sentir falta de uma relação
mais séria. As vezes lembrava de Elisa, seu amor do fim dos anos 70, um louco e forte amor
interrompido pela ida de Elisa para Europa. Na época da tristeza pela perda do
grande amor que Jardel conheceu aquela que seria sua esposa.
Sentia
falta de Elisa, de um amor como Elisa, era o que faltava pra felicidade ser
completa.
Uma noite
bebia uísque com amigos no bar da boate quando reparou em uma loira linda
dançando com grupo de amigos. Jardel perguntou se alguém conhecia e o barman
respondeu que ela estivera na casa na noite anterior. Jardel comentou que
estava na boate e não viu aquela gracinha por lá.
O homem
bebia o uísque e olhava a pista de dança, a menina reparou nos olhares e
envergonhada tentava não revidar. Em determinado momento Jardel mandou que o
garçom servisse o grupo gratuitamente no que quisessem e ela com copo na mão
ergueu a mesma agradecendo.
Depois de
um tempo Jardel foi para a pista e perguntou se ela não queria dançar. O DJ
percebendo a aproximação colocou “never can say goodbye”. A menina sorriu e sem
jeito disse que adorava essa música. Jardel então estendeu a mão e falou “vem”.
Dançaram
e depois sentaram pra conversar. Descobriu que ela se chamava Lucinha e era
estudante. Tinha mãe brasileira, mas
nasceu e foi criada fora e voltando ao Rio de Janeiro há apenas um ano. Jardel
se encantou com a moça, queria conhecê-la melhor.
No fim da
noite se ofereceu para levar a moça em casa, mas Lucinha achou melhor não. Deu
um beijo no rosto de Jardel e foi embora com o grupo que chegou. O homem ficou
lá sozinho no meio da pista de dança plantado. Nunca uma mulher recusara a
carona, estava apaixonado.
Percebeu
que um dos amigos de Lucinha ficou na boate, já bêbado e colou no rapaz para
pegar informações dela. O garoto disse que lhe conhecia há pouco tempo, mas
Jardel encheu o moleque de uísque e sua memória melhorou do nada.
Descobriu
onde Lucinha estudava e apareceu lá com um buquê de flores na porta da sala de
aula. A menina assustada escondeu o rosto de vergonha quando ele pediu licença
e entrou para entregar enquanto a turma aplaudia.
Saíram
pra comer pastel e tomar caldo de cana em uma lanchonete próxima e Jardel
contou que pensara na moça o dia todo e nem conseguira dormir. Lucinha
respondeu que também pensara muito nele, mas aquilo não poderia ser levado a
sério, eram muito diferentes.
Jardel
pediu uma chance, mas ela repetia que conhecia sua fama, era mulherengo, amante
da noite, de esportes e ela não era nada disso. Mas ele insistiu e pediu que
ela fosse à boate de noite. Lucinha relutou um pouco, mas acabou topando.
Jardel
chegou cedo na “Night Fever” e ansioso esperava pela chegada de Lucinha. Nada
da menina chegar até que viu o grupo que ela estava na noite anterior entrar na
casa.
Ele
correu ao encontro na esperança de encontrar a amada, mas ela não estava.
Perguntou aos jovens por ela que responderam que ficou em casa estudando.
Jardel se frustrou, mas numa atitude desesperada perguntou se alguém tinha seu
endereço, por sorte uma das meninas tinha.
Jardel
pediu que o gerente tomasse conta de tudo e pegou o carro debaixo de uma chuva
torrencial para ir atrás de Lucinha.
Todo
molhado tocou o interfone e ninguém atendia. Viu a portaria abandonada e
conseguiu entrar tocando insistentemente a campainha até que ela abrisse.
Lucinha
abriu e deu de cara com Jardel todo molhado pedindo que não batesse com a porta
na cara dele. Lucinha então beijou o empresário e lhe puxou para dentro.
Na manhã
seguinte Jardel acordou recebendo café da manhã na cama e rindo dizendo se
sentir especial. Lucinha pediu que ele não se acostumasse porque aquilo era
exclusivo para primeira noite. Jardel deu um beijo na amada e prometeu que
todas as noites deles seriam como a primeira.
Viviam um
grande caso de amor daqueles que procuramos por toda a vida. Jardel apaixonado
nem ia mais a boate dedicando suas noites a cozinhar para Lucinha. Passeavam,
iam ao Arpoador, praia, jantares românticos a luz de vela e noites cheias de
amor.
Um dia
Lucinha contou ao amado que sua mãe estava no Brasil que queria que ele
conhecesse. Jardel fingiu-se envergonhado e respondeu que não sabia como agir,
muito tempo que não conhecia mãe de pretendente, Lucinha mandou que ele parasse
de bobeira e não se preocupasse que sua mãe era “dez”.
Marcaram
jantar para aquela noite e Jardel parecia uma menina indo ao primeiro baile de
tão nervoso. Não sabia que roupa escolher, o que falar, precisou da ajuda de
amigos para se produzir. Enquanto Jardel escolhia a roupa eles falavam que o
amigo estava muito mudado.
A noite
chegou e Jardel comprou flores para dar a sogra, no meio do caminho recebeu
telefonema de Lucinha perguntando por ele e Jardel respondeu que já estava
chegando. A namorada contou que já estava com a mãe no local só lhe esperando. Entrou
no restaurante com o buquê.
Lucinha
levantou e deu um beijo no namorado pedindo para a mãe levantar. Quando a
senhora levantou o impacto.
Jardel:
Elisa !!
Elisa:
Jardel !!
Sim, a
mãe de Lucinha era Elisa, o antigo amor de Jardel.
Lucinha
sem entender perguntou se eles já se conheciam e Elisa respondeu que sim,
Jardel era seu pai.
O mundo
de Jardel e Lucinha desabava. Jardel sentou com palpitações no coração
perguntando que história era aquela e Elisa respondeu que quando chegou na
Europa se descobriu grávida, mas não queria contar a Jardel por considerá-lo um
irresponsável na época e decidindo criar a filha sozinha.
Jardel
ficou estático, não sabia o que dizer. Aquele novo e grande amor era na verdade
sua filha. Lucinha tomando ciência da gravidade da situação começou um choro
compulsivo, doído. Jardel tentou falar
alguma coisa, mas a menina saiu correndo. Tentou ir atrás, mas Elisa impediu
dizendo que ela iria.
Aquela
notícia foi o começo de um pesadelo para Jardel. Não viu mais Elisa nem
Lucinha, parou de sair de casa para seus esportes e de ir a boate colocando a
casa a venda. Não queria mais sair da cama, deixou a barba crescer, bebia dia e
noite. Queria morrer.
Uma noite
os amigos foram até sua casa e insistiram que Jardel não podia se entregar
daquela maneira e o convenceram a ir até a boate.
Chegando
lá o homem sentou em um canto e ficou quieto, não conseguia mais se divertir,
aquele não era mais ambiente para ele que só pensava em Lucinha.
Notou que
Lucinha estava na boate sentada com amigos. A menina tinha um semblante triste,
quieta o tempo todo e depois de um tempo notou a presença de Jardel, ficaram se
olhando sem ter coragem de dizer nada.
Até que o DJ
colocou “never can say goodbye”.
Jardel não
aguentou e se encaminhou para a pista de dança. Lucinha fez o mesmo e os dois
ficaram frente a frente chorando, sem falar nada.
Do nada
começam a dançar abraçados. Um abraço bem apertado onde um queria sentir o mais
próximo possível o corpo do outro. Tentar assim esmagar toda aquela tristeza e
saudade que viveria para sempre a partir dali entre os dois.
A dança
mais triste de suas vidas, com as lágrimas se misturando a letra e a melodia.
Never can
say goodbye...
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