O VINAGRE AZEDOU?
*Coluna publicada no blog Brasil Decide em 23/6/2013
Semana
passada fiz texto para o blog falando da “Revolta do vinagre”. O movimento que
começara de uma forma tímida em São Paulo exigindo que as tarifas de transporte
público voltassem ao preço anterior e a maior confusão que provocava era
atrapalhar o trânsito paulistano na volta pra casa.
Quando o
texto foi publicado a coisa já aumentara de tamanho, mas nem tanto. Graças a PM
de São Paulo que se excedeu e tratou como bandidos pessoas que só gritavam por
seus direitos a repercussão aumentou. Pessoas de imprensa foram atingidas o que
fez a grande mídia que antes era contra as manifestações não saber para qual
direção ir. Os protestos em São Paulo aumentaram ganhando solidariedade de
outras cidades do país e um jornalista foi preso por estar com vinagre.
Era a
“Revolta do vinagre” que ganhou apoio da população.
Já era
algo de proporção, mas a proporção que ganhou na última semana foi do tamanho
que ninguém imaginava, muito menos eu quando escrevi a coluna. O que era para
ser mais um protesto como tantos existentes no Brasil se tornou um dos maiores
acontecimentos de nossa vida democrática. Algo que será contado nos livros de
história.
A
segunda-feira já foi de surpresa quando em várias cidades do país centenas de
milhares de pessoas foram as ruas protestar como não víamos desde as “diretas
já” e o impeachment de Fernando Collor. Rio, São Paulo, Belo Horizonte, Porto
Alegre, Brasília, todos nas ruas protestando.
Tudo
muito surpreendente e bonito. O povo mostrando que acordara, tinha voz e
conseguia colocar governantes na parede.
A “primavera brasileira”, uma revolução a caminho com alguns problemas e
com esses problemas fadada ao fracasso ou coisa pior.
Dois
problemas sérios de cara. O primeiro a falta de foco. Cada um que foi para a
rua levar seu legítimo protesto tinha um pensamento diferente. Todos os
protestos justos, coerentes com um povo que apanha calado desde seu nascedouro,
mas sem foco não se consegue nada.
O foco
inicial era a tarifa. Justa, importante, mas pequena perto de tantas questões
importantes para o Brasil. Os protestos da segunda-feira onde até o teto do
congresso os manifestantes conseguiram chegar foram importantes. Tanto que a
mídia se voltou a seu favor e no dia seguinte os governos sentiram a pressão e
diminuíram as tarifas mostrando que a voz do povo, a população na rua, adianta
sim.
Mas qual
seria o passo seguinte? Voltar todos pra casa porque abaixaram passagens em
vinte centavos? Pouco né pra tamanha mobilização e mostra de força. Qual seria
o foco então?
Combate a
Copa? Justo, mas meio tarde queridão. Os gastos já foram feitos, a
“cagalhopança” já aconteceu. Boicotar a Copa agora é pedir pra cair de quatro e
morrer pastando. É a única forma de recuperar um pouco o dinheiro investido
nessa farra. Jogar contra a Copa agora é dar adeus a esse dinheiro. Era pra ter
sido feito em 2007, não foi e agora mesmo que temos que torcer pra Copa ser um
sucesso.
Mais
hospitais? Escolas? Bons motivos também, mas não serão feitos de um dia para o
outro. Vão ficar nas ruas até fazer? Mesma coisa combate a corrupção. É uma coisa
muito abstrata para pedir. Qual seria a medida para estancar e fazer a
população sair da rua?
Movimento
legítimo, de dar orgulho que foi aumentando a cada dia a ponto de termos um
milhão de pessoas nas ruas do Rio de Janeiro quinta, trezentos mil em São
Paulo, mais ou menos dois milhões juntando o Brasil inteiro, coisa linda de
ver, emocionante.
Mas sem
foco, sem lideranças que mostrassem a cara, falassem o que queriam dos
políticos e dispostos a negociar com governos. Tirando o pessoal do MPL que se satisfez
com a descida da tarifa não sobrou nenhuma liderança para um movimento de
milhões que se disse apartidário, mas na verdade era antipartidário já que
vaiou e expulsou quem tentou se chegar com bandeira política.
Idiotice
porque se pegar imagens de momentos históricos desse país, de mobilização, em
todos tem bandeiras políticas. Partidos políticos têm seu lado ruim, corrupção,
cretinices, troca de interesses, mas são fundamentais em uma democracia. O
único regime de governo onde não existem partidos políticos é o ditatorial.
Continuando.
Sem partidos políticos, sindicatos, movimentos estudantis organizados,
lideranças expressivas. Únicas lideranças que apareceram foram em facebook
usando máscaras ridículas de filmes de Hollywood. População cada vez mais nas
ruas cada vez mais revoltada sem ninguém pra orientar. No que daria?
Capitão
Nascimento respondeu isso em Tropa de Elite ao lhe mostrarem a vontade do Papa
de ficar no Cantagalo.
E deu o
que ele falou no filme. Deu no segundo problema que eu disse acima.
Aproveitando-se de um movimento importante e bonito dos jovens e pessoas
cansadas de desmandos desse país apareceram os vândalos, os bandidos. Aqueles
que estão nem aí para o Brasil, pra sua cidade ou mesmo para quem está ao seu
lado. Gente que não presta, lixo que se aproveitou da ingenuidade ideológica de
pessoas de bem que achavam que apenas na vontade mudariam algo e fizeram a
barbárie. Depredaram, bateram, incendiaram, roubaram, fizeram o terror e
deixaram a população que apoiava o movimento com medo.
Bandidos
com rosto tampado de um lado (quem tem boas intenções não esconde o rosto), do
outro a polícia. Alguns agressivos, bandidos, outros tão povo quanto os que
foram às ruas. Com tantos medos, angústias, ganhando tão mal quanto e tendo que
defender seus empregos e se defender. Policial é tão povo quanto nós
No meio
disso tudo uma população assustada que não sabia o que estava ocorrendo e
governos que se dividiam entre a arbitrariedade como o governador do Rio de
Janeiro Sergio Cabral e a omissão da presidente Dilma.
Do
primeiro não se espera muita coisa boa mesmo. Mas da segunda? Dilma foi uma
guerrilheira, uma mulher que foi torturada por defender ideais. O mínimo que se
esperava era uma reação imediata e sabem o que ela me mostrou? Vai parecer
idiota, mas ela me lembrou o superman em Superman II quando brigando com os
três bandidos que vieram de seu planeta olhou a população e voou indo embora
abandonando a todos.
Dilma
sumiu, se omitiu enquanto o país estava em chamas. Tudo que começou com um
simples vinagre e uma discussão sobre aumento de tarifas em São Paulo. Pode
parecer exagero, mas não é. O regime democrático brasileiro correu riscos
quando gente oportunista, de extrema direita tentou se meter e tirar proveito
da situação começando uma movimentação para a derrubada da presidente e de
demais governantes. A sorte é que os militares estão nem aí pra essas coisas
hoje em dia e a população, mais esclarecida, não embarcou nessa como em 1964.
Dilma
enfim apareceu na quinta fazendo discurso em cadeia nacional de rádio e TV. Não
fez um bom discurso, mas ela não tinha que fazer um bom discurso e nunca é
demais lembrar que o Collor era muito bom neles e em um inflamou o povo contra
ele pedindo que todos fossem as ruas de verde e amarelo.
Mas falou
coisas necessárias. Não partiu para o confronto como alguns queriam. Não
decretou estado de defesa, apenas prestou esclarecimentos sobre o dinheiro
investido da copa, pediu um pacto social, aceleração das reformas políticas e o
mais importante, nas entrelinhas pressionou o congresso para destinar 100% do
dinheiro do petróleo para a educação.
Muita
gente culpa a Dilma, mas há de se entender que ela é uma presidente, não rainha
ou ditadora. Seu poder tem limitações e não é tudo que ela pode fazer. É
preciso cobrar das pessoas certas cada uma das reivindicações. Ela não pode
tirar o Renan Calheiros, não será ela que vai aprovar a PEC 37, ela tem nada a
ver com o projeto da contra gay nem é responsável por tarifas de transporte
público.
Acho a
presidente que menos merecia ser alvo de protestos dessa forma desde a volta do
regime democrático, apesar de também merecer por ser parte desse todo que hoje
as pessoas protestam. Acho também que será reeleita sem problemas. Se o Lula
tendo a crise do mensalão estourando um ano antes da reeleição conseguiu com
folgas ela também conseguirá.
Até mesmo
pela falta de opções. A mesma que faz cada um pensar mil vezes antes de gritar
“Fora Dilma”.
E acho
que ta na hora dos manifestantes darem um passo pra trás como parece
timidamente começar a dar com diminuição das manifestações ontem. Dar um passo
atrás antes que a democracia fique realmente em risco, antes que virem massa de
manobra ou os bandidos travestidos de manifestantes estraguem tudo.
Sim, essa
mistura de traficantes, bandidos comuns, pessoas infiltradas e “guerrilheiros
de Smartphone” que nem sabem o que estão fazendo ali, tiram fotos sorrindo
depois de incendiar um carro e colocam no Instagram.
As
pessoas de bem venceram. Quem foi à rua realmente pra reclamar seus direitos
venceu. Mostrou que esse país pode sim mudar, que eles podem ser ouvidos. Mas
acho melhor por enquanto voltarem pra casa, deixar as ruas, fazer um plano de
medidas que querem para o país e irem protestar realmente pedindo essas mudanças.
Com lideranças de verdade e maturidade política.
Um passo
atrás agora sabendo que tem condições de dar muitos à frente quando preciso.
Política
não é ruim. Se não tivessem crescido ouvindo que política e políticos não
prestam talvez alguns erros não tivessem sido cometidos.
O vinagre
azedou?
De jeito
nenhum. Só precisa ser mais bem preparado.
Porque
ele já mostrou ser um ótimo tempero.
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