A MÚSICA E O POETA
*Coluna publicada no blog Ouro de Tolo dia 3/3/2013
A música
Uma coisa
que sempre os amantes do carnaval, dos desfiles de escolas de samba falam é que
o samba-enredo não é mais o mesmo. Piorou muito ao longo dos anos e hoje só
temos sambas descartáveis.
De uma
certa forma é verdade. Realmente não temos mais sambas como eram feitos até os
anos oitenta quando sambas antológicos eram produzidos com forte demanda. Mas
isso é verdade até a página três.
Explicarei
o motivo.
Sim, não
encontramos mais grandes sambas com a facilidade de outrora, mas também não
encontramos grandes músicas de MPB, grandes rocks, grandes canções sertanejas,
baianas, frevos, hip hop, rap, toadas, músicas gaúchas e acredite, até funk já
teve mais qualidade.
E por quê
isso ocorre?
Muito
simples caro leitor. Temos dois motivos para isso. O primeiro é que realmente o
nível caiu mesmo e não foi só aqui, é no mundo inteiro. Você não vê mais bandas
de rock como antigamente, um Rolling Stones continua sendo uma das maiores
atrações mundiais, um Guns N`Roses mesmo com Axl Rose gordo, bigodudo parecendo
o Leôncio do Pica Pau também.
Com
músicas românticas planetárias também recorremos ao passado, se queremos algo
de qualidade e no geral.
E não só
no ramo musical, as artes em geral estão assim. Os filmes de antigamente eram
melhores, peças de teatro era melhores, livros eram melhores e bastava um tom,
não cinquenta para se transformarem em best seller.
Vamos
agora ao segundo motivo e pra mim o mais forte que se chama “memória afetiva”.
Quando eu entro no youtube e procuro vídeo com música antiga tenho curiosidade
de olhar os comentários e sempre leio “nesse tempo que era bom, éramos todos
inocentes, não existia drogas, violência, era feliz e não sabia”.
Pasmem.
Eu já li comentários desses no filme “O último americano virgem” que é um dos
principais em promiscuidade dos anos 80
e já li em comentários de vídeos dos anos 90 comentários como “esse
tempo que era bom, não se faz mais música dessa maneira” e são comentários em
músicas que todo mundo com mais de trinta anos torce o nariz e diz que ali que
começou a degringolar.
Ainda vou
ver comentário em vídeo da famosa cena da piscina do polêmico filme “Rio
Babilônia” coisas como “Nesse época que era bom. Tudo mais inocente, sem sexo,
drogas. Eu era feliz e não sabia”.
Como
tenho certeza que em 2030 alguma criança ou adolescente de hoje vai ouvir
“lelek lek lek”, “camaro amarelo” e fazer esse mesmo tipo de comentários.
Nesse
tipo de coisa a vida é legal com a gente. Nossa memória afetiva apaga as coisas
ruins que vimos e ouvimos e só deixam as boas lembranças. Músicas e filmes são
eternizados porque nos lembram momentos felizes, pessoas a quem sentimos falta,
nossas primeiras lembranças.
Amamos
músicas dos anos 80 esquecendo que tinha coisa como Sarajane e “vamos abrir a
roda, enlarguecer”. Anos 70 sem lembrar de Gretchen e a “melo do piripiri” ou
exaltar os samba-enredo esquecendo da Beija-Flor falando do PIS PASEP e também
do FUNRURAL.
Voltando
a 2013 escrevo uma coisa que escrevi no twitter meses atrás achando que criaria
uma polêmica e quase todo mundo concordou para minha surpresa.
Disse,
como disse no começo dessa coluna que realmente não se faz mais sambas-enredo
como antigamente, mas o samba-enredo hoje é o gênero musical de mais qualidade
no país.
Sim caro
leitor, vamos debater isso. Quais são os maiores sucessos da MPB hoje? Difícil
achar né, até uma revelação é difícil achar. Os grandes foram consumidos pela
preguiça em seus pedestais e novos não surgiram.
Quais são
os grandes pagodes de hoje? Thiaguinho cantando “ousadia e alegria”? To fora,
sertanejos de sucesso? “Eu quero tchu, eu quero tcha”, “camaro amarelo”, “ai se
eu te pego”, “baraberê”.
Funk com
suas músicas chulas que tratam mulher como pedaço de carne em açougue ou com o
novo hit “lelek lek lek” que não tem pornografia, incitação a violência, mas
assim como alguns sertanejos citados acima decidiu criar um novo dialeto.
Axé é
aquela coisa de sempre. Bom pra adolescente que quer pegar todas, pra dançar,
mas pra quem já passou dos trinta é enjoativo.
Não sobra
muita coisa né?
Sobra o
samba-enredo que realmente passou uma fase muito ruim com seus enredos CEPs
patrocinados, sinopses gigantes e engessadas e o carnaval se transformando
deixando o lado auditivo e indo para o visual. O carnaval deixou de ser dos
compositores, cantores, passistas e ritmistas e passou a ser dos carnavalescos
e suas alegorias gigantes.
Essas
coisas não mudaram, continuaram iguais, mas alguns compositores resolveram
ousar, sair do esquema padrão dos sambas e trazer coisas interessantes e
diferentes. Começou na disputa do Salgueiro em 2009, no enredo do “Tambor” com
a parceria do Edgar Filho. O Salgueiro não escolheu o samba e com um samba
comum foi campeão do carnaval.
No ano
seguinte dois grandes sambas surgiram. Vila Isabel e Imperatriz Leopoldinense.
Foram para a avenida e o “mar de fiéis”, apelido que ficou conhecido o samba da
Imperatriz ganhou todos os prêmios e as notas 10.
Em 2012
surgiram mais dois grandes sambas. Da Vila sobre Angola e o da Portela, o
“Barcelona dos sambas” que ganhou oito prêmios no total.
E esse
ano de novo as duas escolas.
Só que
algo de diferente ocorreu esse ano. O samba da Vila que eu tanto já comentei
aqui foi o principal responsável pelo título da escola. Transformou-se no samba
campeão na avenida mais importante dos últimos anos e ganhará hoje a maior
consagração que um samba-enredo pode receber que é ser cantado em um estádio de
futebol no Flamengo x Botafogo.
Ouçam
esses sambas e verão que o nível voltou a crescer e tenho certeza que para o
carnaval 2014 mais sambas de grande qualidade surgirão através do fator “Vila
2013”. Os compositores viram que compensa ousar, fugir das sinopses e usar
criatividade e não apenas serem “funcionais”.
Samba-enredo
não precisa ser como camisinha e jogado na lixeira após o ato. Sim, ele tem que
funcionar para a escola, mas antes de tudo ele é uma música e espero
ansiosamente há anos alguém me convencer que uma música de qualidade pode
ajudar menos que uma inferior a um desfile.
Disco de
carnaval não vai mais vender um milhão de cópias, esqueçam, como nenhum gênero
terá mais facilidade para chegar nessa marca. Além da pirataria hoje existe uma
enorme facilidade em baixar músicas na internet. O que pode ocorrer sim é uma
divulgação maior, uma maior vontade da Liesa, Globo que compra esse produto,
enfim, dos organizadores em geral de mostrar os sambas, sua qualidade.
Para que
a maioria das pessoas não sejam pegas de surpresa durante o carnaval com a
existência de um grande samba que nós da área sabemos desde agosto que existe.
Repito,
reitero sem medo nenhum. O samba-enredo é hoje o ritmo de maior qualidade do
país e a prova é que ninguém consegue me mostrar uma música produzida no país
em 2013 melhor que o samba da Vila ou 2012 melhor que o samba da Portela.
Que as
outras escolas entendam isso e não fiquem pra trás das que estão ousando, chega
de samba camisinha. Queremos mais sambas de verdade.
O poeta
Ano
passado fiz uma coluna para ele na passagem de seu aniversário. Hoje não posso
deixar em branco ainda mais que a coluna é publicada no dia exato e mais ainda,
ele faz 60 anos.
Zico é o
maior ídolo de uma legião de apaixonados que mesmo mais de vinte anos depois de
sua saída do clube parece que lhe venera cada vez mais. Zico é meu maior ídolo
e meu orgulho dele ser esse ídolo é enorme e acredito que seja pelo mesmo
motivo que é de todos. Ídolo maior e que emociona gente até de que não lhe viu
jogar.
Fazer
gols, dar grandes lançamentos, liderar um grande esquadrão, ganhar todos os
títulos possíveis por um clube já fariam de Zico ídolo como o Flamengo teve
muitos e outros clubes também, mas Zico vai além disso.
Zico é o
avô, o pai, o tio, o irmão, o filho, o melhor amigo que todo mundo queria ter.
Um homem que tem a mídia em cima dele há quarenta anos e nunca foi pego em
noitadas, traindo, chegando bêbado em treino ou acompanhado de traficantes.
Sempre foi um homem correto, de bem, íntegro, honesto, com palavras fortes,
contundentes, mas nunca ofensivas. Sempre respeitou os adversários e por isso
adversários lhe respeitam.
E
principalmente. Apesar de ser chamado de Deus pela torcida do Flamengo é um
ídolo humano. Não destrata seu fã, lhe trata com todo carinho e respeito que
merece e faz com que esse fã seja mais fã ainda.
Feliz
aniversário Galinho de Quintino, nenhum presente que a torcida do Flamengo lhe
der hoje chegará perto de todos os presentes que você já nos deu. Temos orgulho
sim de nosso ex-jogador, mas principalmente do homem.
Podem
falar que ele não ganhou títulos pela seleção, que perdeu pênalti contra a
França, não importa. Tenho pena porque essas pessoas não sabem que é Zico de
verdade, não viveram Zico. Zico é nosso pai, é nosso filho mais querido. É a
forma humana do orgulho que sentimos de nosso clube que não é só o mais popular
do Brasil. É o clube do preto, branco, rico, favelado, velhos e jovens.
Flamengo é miscigenação, é sincretismo, é vida.
E Zico
tem muito disso, do Flamengo ser essa força da natureza. Zico é arte, Zico
emociona.
Zico
tratava o futebol como uma poesia. Fez versos em campo, rimas em gols e tratava
a bola como sua musa, namorada.
Poetas
vivem para sempre e você é imortal.
Parabéns
poeta, parabéns camisa 10 da Gávea.
Portela
Essa
semana foi lançada chapa de oposição na Portela para eleições presidenciais, a
“Portela verdade”. Que com a “Portela verdade” a verdadeira Portela volte. O
samba precisa disso.
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