SER PAI..


*Coluna publicada no blog Ouro de Tolo em 6/10/2013 e atualizada para meu blog em 11/10/2013


É padecer no paraíso? Não sei, dizem que esse ditado serve para mãe, mas te garanto que ser pai também não é fácil.

Desde semana passada eu já tinha planejado a coluna desse domingo. Seria uma coluna amena onde eu trataria da estreia da Bia, minha filha mais velha, no Maracanã. Logo após o jogo com o Botafogo, uma amiga no twitter propôs “Por quê você não leva a Bia para o jogo contra o Criciúma? Jogo de pouco apelo, em um domingo a tarde, com promoção de ingressos?”.  Sim, era o cenário ideal, o que eu queria pra levá-la ao Maracanã. Por que não?

Planejei. Vou levá-la e contar domingo no Ouro de Tolo como foi a experiência tal qual fiz em meu blog contando sobre sua primeira vez no cinema.

Mas a vida sempre nos surpreende, armadilhas aparecem e infelizmente tive que mudar o teor da coluna.

Sexta, portanto dois dias antes do tal jogo o meu mais novo, Gabriel passou mal. A princípio era uma diarreia e bastaria que ele tomasse soro e tudo ficaria bem. Eu já passei por isso, a Bia passou por isso e seria a vez do Gabriel. Me deu pena porque seria apenas com cinquenta dias, mas faz parte da vida.

Só que um telefonema na noite daquela mesma sexta mudou tudo. Era de Renata, a companheira de Michele dizendo que ele ficaria internado e sem previsão de alta. O caso era sério.

Pronto. Perdi a minha paz.

Todo mundo que tem filhos pronuncia a mesma coisa “Que aconteça comigo, não com meu filho”. Parece clichê, piegas, mas é verdade. Eu mesmo pensava assim antes.

Mas comecei a mudar quando a Bia, ainda com meses, tomou um tombo na casa da avó. Um tombo de nada, que nem fez que ficasse internada, mas eu fiquei sem notícias e me desesperei sem saber o que ocorria.

Mesmo desespero que senti sexta quando soube da internação. Meu Deus, ele é tão pequenininho e já ficando internado. Por quê? Lembrei logo da via Crucis que passei com minha mãe e pensei “De novo não”.

Pois é, mais uma via Crucis começava. No dia seguinte estava eu de manhã na UPA (Unidade de Pronto Atendimento). Ele foi muito bem cuidado, bem acarinhado no hospital e comprovei isso naquela manhã. Só que é impactante ver seu filho, um serzinho tão pequenino numa cama de hospital não ocupando nem ¼ dela. Todo furadinho, com veias saltando e um tubo saindo de seu pé o ligando a uma máquina que lhe transferia soro e antibiótico.

A gente tem o costume de ver isso com adultos, não com uma criança de cinquenta dias.

Pois ele estava passando por isso. Peguei em meu colo e sentei no sofá lhe fazendo carinho e dizendo que tudo daria certo. Assim foi pela manhã toda. Por um momento pegava no colo, no outro deixava na cama. Até que enfermeiras chegaram pra lhe coletar sangue.

Amigos. Não é fácil. Conheço inúmeros adultos que odeiam ser furados, fazer exame de sangue, que desmaiam num momento desses e lá estava o molecão tão novinho chorando, tendo as pernas seguradas por enfermeiras e eu segurando seus finos bracinhos enquanto tentavam achar uma veia e fazer o exame.

Com lágrimas nos olhos virei o rosto no momento para não ver. Dei sorte porque conseguiram atingir a veia de primeira e fazer o exame. Com a mãe no meu lugar tiveram que repetir esse sofrimento três vezes.

Eu falava baixinho no ouvido dele “Quando você for um fortão de academia e estiver cheio de mulheres vou contar a história do dia de hoje e vamos rir disso”.

Muito sofrimento pra uma criança só. Para um bebezinho.

Ele não saiu no sábado. Também não saiu no domingo. Naquele dia voltava pra casa e fiquei sabendo que o Flamengo vencia o tal jogo que era pra eu ver com a Bia por 3x0. Imaginei tudo o que perdi. O congraçamento que teria com minha filha, a vibração com os gols, o elo eterno que seria criado. Acabou 4x1 e nunca fiquei tão triste ao saber de uma vitória do Flamengo e tão preocupado com um filho.

Posso dizer que não está sendo fácil. Até o momento que escrevo essa coluna o sofrimento não acabou, mas já foi pior. Na segunda-feira cogitaram que ele poderia estar com leucemia e meningite. Vocês têm noção do que é saber que seu filho pode ter uma coisa dessas?

Pesquisar no google sobre essas doenças? Possibilidade de escapar? É horrível, doído, tenso. Recebi muita solidariedade nesse momento de dor e raiva. Sim, raiva porque o médico disse essas coisas no “chute”, sem exames nem nada. Estudam seis anos para dar pitacos, falar coisas que qualquer um sem fazer medicina pode fazer e ainda reclamam dos cubanos!

O médico do hospital Loreto, para onde ele foi transferido segunda, chegou a dar certeza da meningite só porque ele estava com pescoço durinho e cabeça pra traz. Esqueceu de perguntar pra Michele, mãe do Gabriel, se ele era curioso e gostava de olhar as coisas e por isso praticava tal gesto.

No dia seguinte fui ao hospital, peguei em meu colo e fiz carinho no seu queixo. Quando alguém faz isso ele abre um pequeno sorriso que cria covinhas em sua bochecha. Aquele jeito de menino pidão, carente e com covinhas na bochecha me lembraram um grande personagem do cinema. Ferris Buller de “Curtindo a vida adoidado”.

Aproveitei e disse “Ferris. Já descobri todos os seus planos. Desista de pegar a Ferrari, pare com essa ceninha e trate de ficar bom para irmos pra casa que a mim você não engana mais”.

Meu Ferris. Meu anjo Gabriel.

As doenças graves foram descartadas uma a uma. Ele está com uma forte infecção intestinal que vem sendo controlada e ele melhora a cada dia. Tem duas hérnias também, uma no umbigo e outra no saquinho. A do umbigo se não sumir até os três anos de idade terá que ser operada, do saquinho ainda não sei o procedimento. Mas pelo menos não são aquelas doenças malditas.

Esse ano de 2013 não vem sendo fácil e eu até semana passada brincava que envelheci alguns anos esse ano. Depois dessa semana do Biel internado, depois da segunda-feira com possibilidade real de doenças graves posso dizer que envelheci ainda mais.

Ainda não consegui sorrir direito nesses últimos dias. Não consegui me sentir feliz. O aspecto mais fechado e sério que 2013 me deu aprofundou nesse fim de setembro negro. Não perdi o sono, mas isso não quer dizer que descanse.

E acho que nunca mais vou descansar. Com filhos não tem como, sempre serão nossas criancinhas de cinquenta dias. Só quero que eles não sofram apenas isso.

E se eu não vou mais descansar, ter sossego, que pelo menos tenha o alívio de ter o Gabriel de volta pra casa.

Isso ainda não aconteceu. Hoje tenho a certeza que vai acontecer porque Deus não vai me dar outra tragédia, não mereço isso e porque todas as noites estou sonhando com a minha mãe e sei que ela está presente e protegendo a mim, a Bia e principalmente ao Biel nesse momento.

Ela está aqui. Ela que vem secando minhas lágrimas na hora que choro sozinho e ela que vai pegá-lo no colo e trazer de volta ao seu berço.   

E desse berço ele não vai mais sair para hospitais. Vai sair para a vida.

E pensar que durante a gestação duvidei se gostaria do Gabriel igual gosto da Bia, achava impossível. A vida sempre dá um jeito, sempre responde essa pergunta.

Coluna sobre o Maracanã? Ela virá, muitas virão e o Gabriel estará comigo e com a Bia.

Quem tem que vencer a partida agora é o Gabriel.

E ele vai marcar esse gol.


Ps. Quero agradecer a todos os amigos que vem rezando, orando, exercendo sua fé qualquer que seja pedindo pela recuperação do Gabriel. Muitos amigos como o dono desse blog e gente que nem conheço. Muito obrigado mesmo, bom saber que somos queridos. Queria agradecer pessoalmente a cada um de vocês. Como não posso agradeço em forma de coluna.   

ATUALIZAÇÃO

 
Gabriel voltou para casa segunda-feira. Obrigado a todos pelas orações e corrente positiva. A cada dia ele está melhor e muito graças a você e por seu espírito guerreiro. O sufoco acabou, mas que sufoco... 

 

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