O SAMBA-ENREDO COMO DETALHE
Semana
passada abordei a contratação do carnavalesco Paulo Barros pela Unidos da
Tijuca e passei bem de passagem por aquilo que realmente é a minha área. O
samba-enredo.
Disse que
a mudança de escola do carnavalesco traria mudanças nas agremiações envolvidas
nessa troca. Paulo Barros tem uma característica parecida com a de Joãosinho
Trinta que é ter o carnaval muito mais visual que auditivo.
Explico.
O impacto
vem do trabalho do carnavalesco. Alegorias, fantasias, comissão de frente no
caso de Paulo Barros e as pessoas assistem as escolas que eles fazem parte para
ver seus trabalhos. Eles são as grandes estrelas.
Por
coincidência ou não, acredito que não seja, os sambas viram apenas detalhes em
suas escolas. O nível dos sambas cai, se torna muitas vezes inexpressivo como
arte e apenas uma peça na engrenagem para o carnavalesco brilhar.
A era
João 30 na Beija-Flor ficou marcada por sua genialidade, o impacto de suas
alegorias, o Cristo Mendigo e pouco pelos sambas. Tivemos sambas marcantes como
em 1976, 1978, mas a grande maioria sambas inexpressivos.
Em 1989
mesmo, o samba daquele carnaval histórico da Beija-Flor é muito inferior ao
desfile em si.
A
Beija-Flor veio desabrochar em samba-enredo depois da saída de Joãosinho.
Começou com o lindo samba em homenagem a Bidu Sayão em 1995 e depois com uma
bela sequência do fim dos anos 90 até meados da primeira década do século sob o
comando da comissão de carnaval capitaneada por Laíla.
A mesma
coisa ocorreu com a Unidos da Tijuca. A agremiação do Borel não era uma escola
que disputava campeonatos, mas sempre vinha com belos sambas. Caiu em 1998 e
voltou no ano seguinte ao especial com um dos melhores sambas da história do
grupo de acesso. “O dono da Terra”.
Em
2003 veio com o grande samba do ano
falando dos Agudás e no ano seguinte começou a era Paulo Barros.
O grande
samba de 2003 não funcionou e o samba que ninguém lembra de 2004 conduziu a
Tijuca a um histórico vice campeonato. Depois disso a Tijuca sempre brigou por
campeonatos com três títulos, alguns vices campeonatos e nenhum samba marcante.
Me lembro
de alguns versos do samba da Tijuca de 2010, nenhum de 2012 e nenhum desse
campeonato de 2014. Carnaval que faz apenas um mês.
Mas
lembro muito bem do carro do DNA de 2004 e da comissão de frente de 2010.
Como será
agora?
A ala de
compositores da Unidos da Tijuca voltará a ser o que era? Livre das amarras de
Paulo Barros? Acontecerá o mesmo que ocorreu com a Beija-Flor depois da era
Joãosinho Trinta?
E o que
acontecerá com a tradicional e valorosa ala de compositores da Mocidade
Independente de Padre Miguel?
A
Mocidade é conhecida por produzir grandes sambas de enredo. É verdade que nesse
século não vem correspondendo essa tradição, mas para 2014 mesmo fez um dos
grandes sambas do ano.
É um
desafio. Assim como todo desafio que citei na coluna anterior do carnavalesco
chegar em uma escola com identidade própria tem uma ala de compositores com
identidade própria e muita história. Ela se sujeitará a ser só um detalhe para
Paulo Barros brilhar?
O gênero
samba-enredo passa por transformações. Decidia campeonatos, como decidiu em
2013, mas de artista principal da festa virou coadjuvante. Culpa de muitas
coisas como pausterização através de compositores que fazem para muitas
escolas, falta de renovação, valorização de super carnavalescos e a forma da
disputa de hoje em dia.
Tem
escolas de samba dos carnavalescos e tem escolas de samba que parecem
Capitanias Hereditárias. Compositores se tornando bi, tri, tetra, pentacampeões
de samba nas escolas as tomando praticamente como um feudo e algumas vezes o negócio até passando de pai
para filho como nas Capitanias.
Na
maioria das vezes esses compositores são bem sucedidos e dão aquilo que a
escola necessita. Mas é uma situação imediata, que serve para aquele instante.
Quando as
escolas percebem as alas de compositores estão esvaziadas, enfraquecidas e a
agremiação tem que rezar pro tal compositor não falhar nem morrer.
Porque
isso ocorrendo vai lembrar aquele comercial do Tigre em que socam um cara
dentro do caixão em seu velório para que ele acordasse e resolvesse um problema
de encanamento.
Vai ter
presidente de escola de samba socando peito de compositor no caixão para que
ele acorde e faça o samba da escola porque não tem mais ninguém pra fazer.
Ou não
né? Como eu disse o samba virou um detalhe.
E isso
não merece nota 10.
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