POLÍCIA PARA QUEM PRECISA


*Coluna publicada no blog Ouro de Tolo em 27/4/2014

O caso de repercussão dessa semana é o do dançarino DG do programa “Esquenta” da Rede Globo. Ele apareceu morto no morro do Pavão Pavãozinho, Rio de Janeiro. Teria sido morto por policiais da UPP que lhe confundiram com um traficante.

UPP, Unidade de Polícia Pacificadora, menina dos olhos do governo Sergio Cabral / Pezão. Programa criado para a recuperação de território ocupado por traficantes. Através desse programa 37 comunidades do Rio de Janeiro foram livradas do tráfico de drogas.

Na teoria tudo bem feito. Devolve cidadania ao morador de favela, seu direito de ir e vir. Tira o morador das mãos de bandidos e leva o estado até lá com patrulhamento policial, saneamento básico, educação, infra-estrutura e sem trocar um tiro, uma coisa planejada, bem feita, tudo pra dar certo.

Como eu disse perfeito na teoria. 

Mas a vida não é só teoria.

Porque o caso desse dançarino do Esquenta não é o primeiro. Para quem não se lembra tivemos o Amarildo que até hoje não apareceu e com certeza devemos ter muitos casos parecidos. Há denúncias de abusos policiais, a permanência do tráfico de drogas, volta de traficantes a essas favelas e assim a população dessas comunidades que foram salvas pelas UPPs acabam se voltando contra elas.

Por quê isso acontece?

O problema não é da UPP, como eu disse o projeto é bom. Também não acho que seja do comando da polícia, da tão alegada e real criminalidade, de estruturas arcaicas (concordo que sejam), nada disso, é mais profundo e nítido.

O problema é a polícia como um todo e como a polícia faz parte da sociedade é da sociedade.

Todos perceberam já que o sistema policial brasileiro está falido. Não é preciso ser nenhum gênio para perceber e que não serão projetos como a UPP que irão resolver. Fala-se muito que a resolução do problema vem da “educação”, mas isso é muito vago também.

Educação escolar? De valores? Pode ser, mas como se faz isso? Como começa? Melhor dizendo, a quem interessa que isso ocorra?

Do fundo do coração. Existe interesse da sociedade em uma polícia honesta?

A UPP não dará certo pelo mesmo motivo que nada dá certo. Falta caráter e não só a polícia, mas a sociedade. A carreira policial não é fácil, são muitos riscos, muito stress para salário que é uma piada.

O cara sai de casa tendo que sustentar uma família ganhando uma merreca pra trocar tiro com traficante, bandidos de todas as espécies. Muitas vezes esse cara divide espaço de vizinhança com esses bandidos. Mora em favelas dominadas pelo tráfico, anda de ônibus correndo risco desse ser invadido por bandidos e ser fuzilado ao ser descoberto em que trabalha, tenho conhecidos que morreram assim.

Tipo de trabalho que endurece a pessoa, que seduz pelas facilidades em detrimento do que a honestidade não lhe dá. Tem que ser muito honesto, muito íntegro pra não se deixar levar.

Mas o honesto no Brasil é sinônimo de otário.

Daí nasce o policial corrupto e covarde. o que sai chutando porta de gente de família, que acharca, bate, humilha, mata, some, se impõe perante o fraco e é conivente com o forte. Uma polícia despreparada e preconceituosa que é cruel com o pobre e o preto. Que dá medo, que assusta, que eu não gosto de encontrar de madrugada na rua quando devia gostar já que foi feita pra me proteger.

Reflexo de uma sociedade também preconceituosa, racista, que em sua maioria não liga quando ocorre merda em favela, quando entram sem mandato em barraco e batem num pai na frente dos filhos, quando dão dura em crioulo de madrugada na rua e tapa na cara dele.

Que aplaude Capitão Nascimento quando bota favelado no “saco”, mas pede justiça quando a ação chega na classe média, no asfalto.

Fazem sinal de paz, pombas com as mãos, passeatas pela paz na maioria das vezes quando a bosta respinga no asfalto. Pedem mudança comportamental da polícia, citam Titãs como eu citei no título da coluna, mas refaço a pergunta.    

A quem interessa uma polícia honesta?

A quem interessa uma polícia que leva em cana o cara que bebe e dirige? O mesmo cara que reclama de corruptos, mas segue perfil da lei seca pra fugir de blitz? A quem interessa policial que não deixa o garoto de classe média fumar seu baseado na Lapa? A qual pai interessa buscar filho em delegacia de madrugada porque pichou, fez rachas? Mesmo pai que diz se preocupar com a violência e seu filho de madrugada na rua sem pensar que ele pode ser o autor.

Nós temos um grave desvio de caráter porque queremos justiça sim, mas para os outros, pra gente pedimos “uma aliviada”. Interesses sempre vêm antes da justiça. Petistas acusam a oposição, oposição a petistas e nenhum lado se preocupa com o país e sim ferrar o outro.

Um lado quer CPI da Petrobras pra ferrar o governo em ano eleitoral, o governo tenta barrar a investigação e quer colocar outros casos de corrupção pra ferrar a oposição que aí não aceita. Ninguém quer investigar nada e sim ferrar o inimigo. O Brasil é isso. Um preocupado em ferrar o outro e se dar bem no fim.  

E a polícia é esse pitbull treinado pra atacar o inimigo, mas que sacrificamos quando morde a nossa perna lhe acusando de ser o responsável por aquilo que lhe treinamos.

A polícia do Brasil tem que acabar. É, isso mesmo, acabar. Tem que acabar e recomeçar do zero, com nova estrutura, forma de reconhecimento e valores assim como nossa sociedade.

Polícia para quem precisa.


Para todos nós que de forma direta ou não temos pólvora na mão.  

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