ERA DA VIOLÊNCIA 2: CAPÍTULO XXII - RELAÇÕES RUINDO
Cara, vou te dizer, foi uma cagada
dos infernos. A sala foi pelos ares. Muito fogo, fumaça, pessoas desesperadas
correndo de um lado para o outro. O caos. Menos para uma pessoa.
Guilherme.
Sim, meu filho escapou dessa.
Enquanto sua sala explodia o moleque estava no banheiro cagando e com fones nos
ouvidos escutando músicas. Ele não viu nada, não ouviu nada, não soube de nada.
Santa cagada.
Quando saiu do banheiro Guilherme
viu a movimentação e perguntou o que ocorria. Uma das pessoas que corria para o
local respondeu “Explodiram a 201”. Guilherme gritou “Puta que pariu!! É a
minha sala!!” e correu para ela.
Chegando lá viu o cenário de
guerra. Os bombeiros chegaram rapidamente e com jatos de água apagaram o fogo.
“Heróis” entraram na sala enfrentando o fogo para salvar as vítimas, Apenas
duas ou três escaparam com vida. Todos mortos.
Guilherme pegou o celular e me
ligou. Atendi e do outro lado da linha meu filho disse “Pai, calma, tenho uma
coisa pra te contar, mas se mantenha calmo”.
Calmo? Calma é o caralho. Em cinco
minutos cheguei à faculdade.
Chegando fui direito à frente da
sala e encontrei Guilherme. Dei um abraço no meu filho e assustado perguntei
como ele estava. Guilherme respondeu “Bem, eu estava no banheiro na hora, não
vi nada”.
Em transe vi a ação dos bombeiros
tirando os copos da sala. Meio que me dividi em dois mundos, duas eras. Me
lembrei dos bombeiros resgatando corpos no metrô e salvando pessoas ou tirando
corpos. Tudo isso enquanto eu acalentava o corpo de minha filha.
Olhava estático, como se não
estivesse ali. Não, não podia perder mais um filho. Não podia perder mais um
filho pra violência. Perder dois filhos do mesmo modo seria crueldade demais.
Juliana chegou logo depois, me
abraçou e nem senti. Continuava olhando para dentro da sala como se visse o
trem do metrô. Ela abraçou nosso filho que pedia que minha ex se acalmasse que
estava tudo bem.
Só saí do transe na hora que
Juliana comentou com Guilherme “Isso é coisa mandada, esse atentado foi
direcionado a alguém”.
Olhei para Juliana e perguntei
“Como?”. Juliana respondeu “Isso foi um atentado Beto, foi para alguém”.
Ali eu me tocava da situação, tudo
ficava claro. Olhei para Juliana e Guilherme e saí andando. Juliana gritou por
mim, mas continuei andando sem dar atenção.
Eu sabia muito bem aonde iria.
Batei forte na porta de uma casa.
Soquei com raiva até que o dono dela abrisse. Era Rui de Santo Cristo.
O homem abriu perguntando se eu
iria tirar o pai da forca. Empurrei Rui violentamente contra da parede e lhe
prendi lá com meu braço em seu pescoço respondendo “Não, mas eu vou botar um
filho da puta lá”.
Rui perguntou o que havia e
respondi “Você sabe muito bem do que to falando!!”. O Policial gritava “Sei de
nada porra!! O que ta acontecendo?” e respondi “Você explodiu a sala de aula do
meu filho porra!!”.
O homem jurou que não foi ele.
Gritava “Eu não fiz nada porra!!”. Eu respondia que não acreditava nele e
ficamos nessa até que Rui gritou “Não fui eu!! Eu não aceitei o serviço!!”.
Pedi para que ele repetisse e Rui
repetiu “Eu não aceitei o serviço”. Zonzo, soltei o policial e pedi que ele me
explicasse. Entre tosses e dizeres como “Você tem pegada hein? Puta que pariu”
ele me contou.
Rui abriu o bico “Me contactaram
sim para fazer o serviço, mas respondi que não podia, que você era meu
camarada. Na certa outro pegou o serviço”.
Perguntei quem tentou lhe
contratar e Rui ficou quieto. Peguei de novo o homem lhe empurrando na parede e
colocando o braço em seu pescoço e ele respondeu “Donato Barreto”.
Soltei Rui, gritei “Filho da puta”
e fui embora sem nem perguntar porque ele não me contara antes que queriam
matar meu filho. Rui passou a mão no pescoço sorrindo,
pegou o telefone e ligou dizendo “Ele caiu”.
Do outro lado da linha Rubinho
Barreto jogava pôquer em um cassino clandestino e respondeu “Ótimo”. O
empresário desligou, acendeu um charuto e disse ao restante da mesa “Vamos
aumentar as apostas que sinto que o dia está favorável a mim”.
Corri até a casa de Donato e ele
não estava. Flávia me atendeu na porta e disse que ele saíra de táxi. Logo
imaginei “Scarface” e fui embora. Quando saí Flávia pegou o telefone e disse
“Ele acabou de sair daqui”.
Eu sabia onde era o motel que
Scarface e Donato faziam meinha e fui direto lá. Na recepção perguntei o quarto
que eles estavam. O recepcionista não queria me contar, mas depois que dei uma
grana ele respondeu. Subi furioso. Eu ia acabar com aquele filho da puta.
Bati na porta e Scarface abriu. Se
assustou com minha presença e perguntou o que eu queria. Perguntei “Cadê o
deputado?” e o taxista respondeu que sabia de deputado nenhum. Empurrei
Scarface e entrei no quarto encontrando Donato nu em cima da cama.
O deputado ficou apavorado. Donato
tentou se explicar dizendo que não era nada daquilo que eu estava pensando, mas
não dei ouvidos. Saquei a arma e disparei quatro vezes contra Donato lhe
matando.
Donato estava morto na cama quando
Scarface chegou próximo a mim e olhou o deputado, depois a mim, olhou novamente
o deputado e de novo a mim e gritou “Você ta maluco?”.
Respondi “Esse filho da puta
tentou matar meu filho!!”. Scarface ficou puto e gritou “Você matou minha
galinha dos ovos de ouro porra!! E comigo junto!!Quer me foder me beija porra!!”.
Eu antes que respondesse alguma coisa ouvi a sirene da polícia e Scarface
comentou “Fodeu!!”.
Ficamos os dois sem saber o que
fazer e Scarface comentou “Sei de uma saída aqui que ninguém conhece, vamos
lá”. Saímos por uma porta lateral e depois cada um foi para seu lado.
Achei que dessa forma tinha
escapado, mas não.
Scarface não quis escapar tanto.
De propósito deixou que a polícia lhe visse e parasse. O filho da puta levantou
as mãos e disse “Não fiz nada, mas sei quem fez”.
Foi para a delegacia e me
entregou. Pior, disse que além de ter matado Donato ainda matei o juiz.
Rapaz. Eu com anos de malandragem
e convivendo com os maiores casca grossas da cidade caí como um patinho. Rubinho
estava puto com o irmão por causa da roubalheira e decidiu se livrar dele.
Soube da minha briga com Donato e
das juras que fizemos um ao outro. O que ele pensou então? Se livrar de nós
dois de uma vez só.
Contratou Rui que explodiu a sala
de meu filho. Tentou se livrar dos três, também de Guilherme que era uma pedra
em seu sapato, mas desse não conseguiu. Mas nada seria melhor para ele que o
irmão morrer e eu ser acusado e voltando a mofar em um presídio.
Confesso. O plano era muito bom.
No enterro no dia seguinte Rubinho
Barreto fingia consternação enquanto era consolado pelas pessoas. Flávia falsamente
chorava quando Rubinho lhe abraçou e disse “Estamos livres”. Juliana e
Guilherme olhavam o caixão abaixar e meu filho perguntou “Você acham mesmo que
meu pai tem algo a ver com isso?” Juliana respondeu “Não sei, mas está tudo mal
explicado”. Guilherme foi ao lado de Celina e abraçou a menina que chorava
copiosamente a morte do pai.
Saindo do enterro Guilherme
caminhou junto a mãe e perguntou “Você confia no Rubinho?”. Juliana perguntou
porque aquilo e o garoto emendou “Ele não é confiável mãe, abra o olho”. Andou
mais rápido para se juntar a Celina e Juliana caminhou sozinha pensando no que
o filho dissera até que Rubinho se juntou a ela.
Eu estava em casa pensando naquela
situação toda, estar voltando a ser um assassino quando tocaram minha
campainha. Atendi e eram uns policiais perguntando se eu era o Gilberto
Martins. Respondi que sim e pediram que eu acompanhasse. Perguntei se estava
detido e responderam “Ainda não”.
Na delegacia com o Dr Eduardo
Feitosa como meu advogado fui interrogado. O delegado comentou que eu fora
acusado pelo assassinato do deputado Donato Barreto e respondi que estava na
faculdade de meu filho que pegara fogo.
Perguntou sobre a briga que
tivemos, as ameaças e falei “Foi da boca pra fora doutor, imagine se todos
cumprissem as ameaças que fizessem”.
No fim fui liberado por falta de
provas.
Em outro canto da cidade Rui e
Scarface estavam dentro do táxi parado. Scarface comentou “Fiz tudo o pedido,
inclusive entregando a cabeça do Gilberto”. Rui respondeu “To sabendo” e
entregou uma maleta para Scarface contando “Presentinho do Dr Rubinho para
você”.
Scarface abriu. Tinha muita, muita
grana dentro e o taxista comentou “Nada mal”. Rui sorriu e disse “Agora você
pode voltar pros Estados Unidos e matar o presidente americano”.
Scarface retrucou “Era o mínimo
que você podia fazer depois de matarem o Donato, aquela bicha me dava muito
dinheiro”. Rui apenas respondeu “Boa viagem”.
Scarface se mandou e isso acabou
ajudando na minha situação. A polícia chegou a certeza que ele matara Donato e
fugira para não responder pelo crime. Mas eu sabia que estavam de olho em mim,
não podia dar mole.
Primeira coisa que fiz foi me
afastar dos “Cachorros velozes”. Eu estava no olho do furacão, para me darem um
flagrante numa ação deles era mole. João Arcanjo foi a minha casa dizer que
tinha serviço para a noite, mas recusei.
Ele perguntou “Agora que você
tirou a ferrugem da arma vai parar?”. Respondi que era melhor, até mais
prudente para eles, João lamentou e eu comentei “Cara, você não precisa mais
disso. Ta com grana, voltou com a mulher, para com isso”.
João simplesmente respondeu “Não
dá”.
É. Não dava. Tinha entrado no
sangue dele.
Enquanto eu me despedia de João
Juliana iria tocar a campainha, mas abri a porta bem no momento. Eles se
cumprimentaram e Juliana comentou “Se quiser volto em outra hora”. João disse
que já estava de saída e que ela não se preocupasse.
João Arcanjo foi embora e comentei
com minha ex “Que surpresa”. Juliana perguntou se podia entrar e fiz sinal para
que entrasse.
Fiz um café para ela que sentou.
Perguntei se tinha ocorrido algo e Juliana retrucou “Eu que pergunto isso”. Me
fiz de desentendido e minha ex falou “Coisas estranhas vem acontecendo e eu
quero que você me conte”. Perguntei porque eu saberia e ela contou “Você sempre
está envolvido quando ocorrem coisas estranhas”.
Pensei bem e falei “Nada demais,
nada que deva te preocupar”. Juliana então se lembrou dos dizeres de Guilherme
e me contou. No fim perguntou “O Rubinho tem feito algo de errado?”.
Respondi que só ela poderia
descobrir. Juliana bebeu um pouco do café e perguntou “Você não vai me contar
né?”. Olhei para ela, peguei sua mão e respondi “Se tiver algo pra descobrir
você que tem que fazer isso”.
Eu não iria me meter, sobraria pra
mim. Mas me fazia bem saber que Juliana começava a acordar e desconfiar de quem
era seu marido.
Em casa Rubinho falava ao telefone
com Flávia quando Juliana chegou. O homem disfarçou desligando e minha ex
perguntou com quem ele falava. Rubinho respondeu “Com Sérgio Timóteo. A vida
tem que continuar, mesmo com a morte de meu irmão”.
Juliana sorriu e Rubinho contou
que tinha que sair, compromissos importantes.
O homem saiu, entrou no carro e
ligou partindo. Juliana também saiu e foi atrás no seu.
Como em um filme americano Rubinho
dirigia seu carro e Juliana perseguia. Rodaram bem pela cidade até que Rubinho
parou. Juliana parou em um local que desse para observar o que ocorria e não
fosse vista.
Algum tempo depois chegou Flávia
em seu carro. A mulher estacionou o veículo e se encaminhou para o carro de
Rubinho. Entrou e deu um beijo apaixonado no homem. Juliana se enfureceu, mas
tentou ficar calma.
Os dois partiram de carro e
Juliana seguiu. Rubinho e Flávia foram até um motel e entraram. Desolada
Juliana assistiu a tudo, mas não entrou. Preferiu ficar no carro pensando e
decidiu ir embora. Já tinha visto tudo que necessitava.
Enquanto isso João Arcanjo se
despedia de Fernanda em casa. Disse que não chegaria tarde quando a mulher
segurou seu braço. João perguntou se algo ocorrera e Fernanda respondeu “Não
vá”.
João se aproximou da mulher, fez
carinho nela e perguntou qual era o problema. Fernanda respondeu “Sensação ruim
João, como se fosse ocorrer algo. Por favor, não vá”.
O farmacêutico tentou tranquilizar
a mulher “Se acalme Fê, não vai acontecer nada”.
Fernanda insistiu. Lembrou de
perdas que teve como de Gabriel e Luciana. João fez novamente carinho na
esposa, beijou sua testa e disse “Juro que não demoro” e se despediu.
João Arcanjo foi se encontrar,
para mais um serviço, com Rui de Santo Cristo e Galalite. Chegou no galpão e
encontrou os outros dois bandidos. Rui olhou o relógio e comentou “Ta
atrasado”. João pediu desculpas e se justificou “Fernanda estava cheia de
coisas, falando em pressentimento, monte de besteiras”.
Rui sorriu e comentou “Olha que eu
acredito nessas coisas, pressentimentos costumam mostrar coisas”. João
respondeu que não acreditava e perguntou por Scarface.
O policial respondeu que Scarface
voltara aos Estados Unidos e eu estava “Com cagaço”. João disse que já sabia de
mim e perguntou “Estamos em três. Tem certeza que não tem riscos?”. Galalite
intercedeu pedindo pelo amor de Deus que João ficasse quieto, pois precisava
muito do dinheiro.
Rui respondeu “Fique tranquilo.
Vamos invadir o barraco de um otário que anda fazendo assaltos em Honório
Gurgel. Os comerciantes do local vão pagar bem”.
João concordou e assim os três
partiram para o tal barraco.
Chegaram no local, ouviram barulho
de televisão e Rui bateu na porta chamando pelo dono do barraco. O homem abriu
a porta e Rui lhe empurrou pra dentro. Os três atiraram matando o sujeito
quando de dentro do barraco apareceu outro homem armado e atirando.
Rui, João e Galalite não esperavam
aquela reação e saíram do barraco pra se protegerem. Continuaram trocando tiros
com o homem até que lhe alvejaram e ele caiu. Rui se aproximou do homem ferido
e lhe executou.
Galalite, furioso, puxou Rui e
gritando perguntou “Você não disse que o cara tava sozinho porra? Quase a gente
se fodeu nessa!!”. Rui tentou se justificar dizendo que pensara realmente
quando os dois perceberam João Arcanjo caído.
Aproximaram-se dele e viram que
João fora baleado. Seu braço direito e seu peito estavam feridos, sangrando e
João balbuciava “Me ajudem, não me deixem morrer”.
Rui de Santo Cristo não ajudou.
Apenas olhou o homem pedir ajuda.
Em outro canto da cidade minha
campainha tocou enquanto eu tentava fazer uma janta. Saí correndo para atender
e quando abri a porta vi uma pessoa conhecida. Apenas disse.
“Juliana”.
ERA DA VIOLÊNCIA 2 (CAPÍTULO ANTERIOR)
LINK RELACIONADO (LIVRO ANTERIOR)
Comentários
Postar um comentário