INOCÊNCIA PERDIDA
*Conto publicado na coluna "O buraco da fechadura" do blog "Ouro de Tolo" em 10/8/2013
Alice levava uma vida normal. Recém chegada a
adolescência estudava em um colégio público perto de casa e a tarde fazia curso
gratuito de informática. A menina adorava computadores e sonhava trabalhar no
ramo.
Começava a se interessar pelos menininhos tendo um em
especial que chamava sua atenção na sala de aula, mas tímida não se declarava e
ia as nuvens por qualquer sorriso que ele desse. Só que ao mesmo tempo em que
se interessava pelo sexo oposto ainda brincava de bonecas nessa mistura de
menina e mulher, exalava ainda inocência e pureza.
Filha única de Ramiro e Teônia tinha uma relação um
tanto áspera com a mãe, fria onde não se entendiam muito bem. Com o pai era ao
contrário, Ramiro era seu melhor amigo, com o pai se abria e contava seus
medos, anseios e amores, foi Ramiro que soube primeiro quando a menina
menstruou e comprou seu primeiro absorvente.
Ramiro era um poeta. Gostava de declamar poesias nos
bares que frequentava, alcoólatra vivia de bicos e com isso tinha que aturar as
reclamações da esposa que lhe chamava de vagabundo e que não conseguia dar uma
vida decente para as duas. Alice consolava o pai pedindo para que ele não
ligasse para a mãe e Ramiro respondia que já se acostumara e que um dia os
poetas e loucos dominariam o planeta.
Apesar de todos os problemas que o homem tinha Alice
nutria pelo pai grande orgulho e amor e ela era seu xodó. Não eram raras as
vezes que Ramiro chegava em casa, até mesmo bêbado, com uma rosa na mão para
entregar a sua filha querida.
Mas a vida começava a cobrar os abusos de Ramiro com a
saúde. O homem contraiu cirrose e coube a Teônia a incumbência de botar
dinheiro em casa vendendo empadinhas. Ramiro não conseguia sair mais de casa,
mal conseguia levantar da cama e era cada vez mais humilhado pela mulher. O
homem se entristecia e Alice pedia que tivesse calma deitando-se na cama e
abraçando o pai.
Era um amor tão grande que nem mesmo a morte era capaz
de separar e ela não foi mesmo. Depois de alguns meses de sofrimento Ramiro
enfim descansou. Poucas pessoas foram até seu enterro e Alice chorava a perda
não só de seu pai, mas do melhor amigo.
Teônia de forma fria assistia o caixão do marido descer
a sepultura e depois olhou sério para Alice dizendo que teriam que se entender.
Alice abaixou os olhos e respondeu tudo bem e que não seria problema para a
mãe. Teônia falou que esperava que não fosse mesmo e chamou a filha para voltar
pra casa e ajudá-la a fazer as empadas.
A relação delas não melhorou muito, mas não tinha
brigas. Era frieza, um certo distanciamento. Alice sentia falta do pai, de suas
conversas e risadas. Não tinha nada disso com Teônia e parecia demorar mais a
se acostumar com a perda, ao contrário de sua mãe.
Teônia deixou a vida continuar, aos poucos começou a
sair pra se divertir e frequentar um forró que tinha perto de casa. Muitas vezes Alice dormiu sozinha em casa com
a mãe chegando apenas de manhã e bêbada contando como se divertira.
Um dia ela chegou com uma novidade em casa. Chegou de
braços dados com um homem e apresentou a Alice como Gomes, seu novo namorado.
Alice sentiu um frio na espinha ao cumprimentar o homem e Teônia pediu que a
filha botasse mais um prato na mesa.
Com o
tempo Gomes não saía mais da casa delas até que se mudou pra lá de mala e cuia.
Alice se incomodava com aquela situação, mas aprendera que o silêncio era seu
novo melhor amigo. Não eram raras as vezes que pegava o casal transando e se
constrangia com a cena, deitava na cama e chorava de saudades do pai.
Notava que
Gomes lhe olhava de modo diferente, não apenas como namorado da mãe e isso
incomodava. Não tinha com quem conversar sobre a situação, não confiava em
nenhum dos seus amigos de colégio muito menos em sua mãe.
Uma noite
estava deitada perto de dormir quando sentiu sua porta abrir. Gomes sentou em
sua cama e perguntou se ela estava bem. Alice nervosa debaixo das cobertas
respondeu que sim. O homem então debruçou se sobre ela e deu um beijo em seu
rosto desejando boa noite. Encostou tudo seu corpo sobre o dela e alisou suas
pernas antes de ir embora.
Alguns
dias depois Teônia contou que teria que fazer uma viagem pra ajudar a irmã
doente e que Alice ficaria tomando conta da casa com Gomes. A menina se
apavorou e pediu que a mãe não lhe deixasse sozinha e a levasse junto. Teônia
recusou pedido e mandou que a filha parasse de besteira que já era bem
grandinha pra ficar agarrada a saia da mãe e ainda teria Gomes pra ajudá-la no
que quisesse.
Mas Gomes
não queria ajudar Alice em nada, muito pelo contrário. Os primeiros dias com
Teônia viajando foram tranqüilos, mas no terceiro dia ela chegou em casa e viu
o padrasto bebendo com um homem.
Gomes já
embriagado chamou Alice até a sala e pediu que ela pegasse uma cerveja na
geladeira. A menina apavorada foi até a cozinha pegar a bebida rezando a Deus
que nada de mal acontecesse a ela. Chegou com a cerveja na sala e Gomes pediu que
servisse ao amigo e ele.
Alice
serviu ao homem e depois enchendo o copo de Gomes ouviu o padrasto comentar com
o amigo que a enteada era muito bonita. Puxou Alice para perto dele e colocou a
mão por debaixo de sua saia fazendo a menina chorar.
O amigo
respondeu que realmente a menina era linda e Gomes com a mão dentro da calcinha
de Alice perguntou se não era uma boa verem se ela tinha mais qualidades além
da beleza. Levantou e puxou Alice para o quarto acompanhado do amigo. A menina
apenas chorava baixinho e Gomes dizia pra ela ficar calma e lhe visse como um
pai.
Os dois
homens abusaram de Alice e no fim a menina chorava nua deitada na cama. Gomes
colocava a calça e falava que Alice nem precisava ser avisada para que não
contasse essa história a ninguém, principalmente Teônia e que se contasse
morreria.
A vida de
Alice virou um inferno. Quase todas as noites Gomes passava pelo quarto dela e
abusava da enteada que tinha apenas quatorze anos de idade. Sem ter vontade
Alice virou amante do padrasto e mesmo com Teônia já voltado de viagem sempre
era procurada.
Até que um
dia Teônia entrou no quarto da filha e pegou em flagrante Gomes em cima de
Alice.
A mulher
deu um grito e partiu pra cima da filha acusando de ter seduzido seu marido.
Alice apenas tentava se defender enquanto Gomes vestia-se e saía tranquilamente
do quarto. A menina pedia desculpas mesmo sem ter culpa de nada e Teônia
furiosa mandou que ela arrumasse suas coisas e fosse embora da casa.
Alice
chorando implorava piedade a mãe por não ter para onde ir, mas Teônia
transtornada apontava para a porta e gritava “rua”.
Alice não
teve alternativa a partiu daquela casa.
Vagou pela
rua desamparada, sem ter pra onde ir quando viu um taxista. Estava com fome e
pediu dinheiro ao homem para comprar algo. O taxista olhou Alice de cima a
baixo e disse que lhe daria dinheiro sim, mas queria algo em troca.
Alice foi
obrigada a transar com o taxista em troca de dinheiro e no fim o homem deu a
grana e disse que tinha um lugar bom para levá-la onde ganharia muito dinheiro.
Alice já imaginando o que era e sem alternativa aceitou.
O taxista
levou Alice até um bordel e entrou com a moça chamando por dona Lu. Uma senhora
apareceu e o homem disse que tinha encomenda pra ela. A mulher chegou perto de
Alice que parecia um bicho do mato e olhou seu cabelo, suas unhas, dentes e
perguntou quantos anos ela tinha.
Alice
respondeu que tinha quatorze e o taxista na hora emendou que era novinha, mas
entendia do riscado. Dona Lu olhou um pouco mais para Alice e disse que
arrumaria uma identidade falsa pra ela dando um dinheiro ao taxista pela
“encomenda”.
Mandou que
algumas meninas levassem Alice para o segundo andar e dessem um banho com esfregão
nela além de roupas novas, queria a menina um “brinco” para os homens que chegassem
mais tarde.
Alice foi
levada e durante o banho mostrava-se muito assustada falando nada. As meninas
tentavam tranquilizar dizendo que o primeiro dia era mais difícil, mas logo ela
se acostumaria e ganharia muito dinheiro.
Alice
desceu parecendo outra. Estava linda e logo chamou a atenção dos homens do
bordel. Um homem logo se interessou e levou a menina para o quarto. No local
Alice deitou na cama nua e fechou os
olhos com o homem em cima arfando como um porco. Quando ele saiu a menina
contou o dinheiro e viu que valia a pena.
Ganhou
muito dinheiro naquele dia e nos dias seguintes. Logo pôde sair e comprar
roupas novas, perfumes, joias. Alice era linda, jovem, atraía muito os homens e
com o tempo aprendeu a usar esse poder arrancando deles o que queria.
Virou
amante de políticos, empresários, artistas, a preferida da casa causando ciúme nas
outras meninas.
E lá
conheceu o amor.
Uma noite
um de seus amantes mostrou o filho, um rapaz tímido que mal conseguia tirar os
olhos do chão. O homem disse que seu filho era virgem e queria que tivesse sua
primeira noite com ela. Alice sorriu e contou que seria um prazer pegando pela
mão o menino e levando para o segundo andar.
Entraram
no quarto e o menino ficou sentado sem reação. Alice ficou apenas de calcinha e
sutiã e começou a beijar o pescoço do menino, abraçá-lo por trás e ele pediu
calma perguntando se não conversariam antes.
Alice se
surpreendeu, nunca ninguém pedira pra conversar e concordou. Sentou-se ao seu
lado e perguntou seu nome. O menino respondeu que era Rogério e perguntou o de
Alice que respondeu.
Os dois
conversaram por um tempo e Rogério mostrou-se uma agradável companhia. O papo
foi tão bom que esqueceram de transar e na saída Rogério contou a menina que
não se preocupasse que contaria ao pai que ela foi maravilhosa.
Alice já
estava há algum tempinho naquela vida, já era descolada, tinha auto estima
elevada, mas ainda era uma menina e se encantou com o rapaz.
Rogério
voltou mais vezes e eles batiam papo. O rapaz contava da sua vida e Alice
também se abriu como no tempo que conversava com o pai. Nunca mais confiara em
ninguém, mas sentia essa confiança em Rogério. Contou todos os detalhes, os
abusos que sofrera do padrasto e Rogério indignado falava que ele merecia
morrer.
Uma noite
o rapaz se despedia de Alice que falou “espera”. Rogério se virou e ela lhe
beijou, o primeiro beijo da vida de Rogério e por incrível que pareça também de
Alice. Depois do beijo a menina pegou a mão do rapaz e disse “vem”. Conduziu
até a cama e pela primeira vez Rogério transava, pela primeira vez Alice fazia
amor.
Começaram
a namorar enquanto Alice vivia aquela vida dupla. A menina começara a recuperar
o frescor, a inocência perdida e não queria mais aquela vida, queria ficar com
Rogério.
O rapaz
também não aguentava mais ver seu amor deitando-se com outros homens e chegou
na casa puxando Alice para um canto contando que iriam fugir. Ela não entendeu
o que ele queria e Rogério contou que tinha muito dinheiro guardado e iria
tirá-la de lá naquela noite.
A menina
se apoiou completamente tonta na parede e Rogério se assustou perguntando se
ela não queria. Alice sorriu e respondeu “claro que sim”. Rogério passou a mão
no rosto da namorada e falou “no final da noite”.
E no final
da noite Alice pulou a janela e entrou no carro de Rogério para ser feliz. O
carro partiu e por coincidência no caminho tinha o bairro que ela morou com a
mãe. Alice pediu que Rogério passasse na rua que morava e quando passaram
devagarzinho viram Teônia saindo da residência dando um beijo em Gomes.
Alice
pediu que Rogério parasse e esperasse um pouco que ela já voltaria. Rogério
perguntou o que a namorada iria fazer e ela mandou que
confiasse.
Alice bateu
na porta de sua antiga casa e Gomes abriu a porta. O homem se assustou com a
enteada na porta e Alice perguntou “posso entrar?”.
Antes que
Gomes respondesse algo Alice entrou e fechou a porta. O homem perguntou o que
ela queria e Alice respondeu “fiquei com saudades” dando um beijo em
Gomes.
Gomes
correspondeu ao beijo e tentou levar a menina para o sofá. Ela respondeu que
não queria ali, queria no quarto da mãe onde nunca fizeram. Gomes deu um
sorriso e falou “safada”.
Foram até
o quarto se beijando e Alice sentou-se na cama de frente a Gomes. Abriu o zíper
da calça do homem enquanto Gomes falava “vai safada, faz sua especialidade”.
Depois
disso ouviu-se um imenso e terrível grito, de uma dor alucinante. Gomes caía no
chão encharcado de sangue enquanto Alice levantava com sangue na boca limpando
a mesma na colcha da mãe e dizendo “você nunca mais estupra ninguém seu
desgraçado e se quiser achar seu pênis ele caiu embaixo da cama”.
Alice saiu
da casa deixando o homem se esvair em sangue no quarto, entrou no carro e disse
a Rogério “agora podemos ir”.
A vingança
é um prato que se morde frio.
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