O TEATRO COMO VOZ


*Coluna publicada no blog ouro de Tolo em 31/8/2014


Como alguns de vocês já sabem estou tentando embarcar em novos projetos em minha vida. Deixei um pouco o samba-enredo de lado e estou investindo numa carreira teatral.

Acho que todo mundo já fez teatro alguma vez na vida. Seja aquele teatro na escolinha ou até mesmo as brincadeiras de criança como polícia e ladrão, brincadeiras onde interpretamos personagens.

Sempre participei dessas brincadeiras e por ser filho único tinha que usar e abusar da imaginação para brincar. Pegava bonecos como do homem aranha, superman e Falcon e criava histórias.

Paralelo a isso fazia teatro no maternal. Fiz um burrinho numa história que não lembro direito, mas me lembro do palco e eu nele. No ginásio também fiz teatro, faculdade e assim foi indo até chegar nesse momento.

Fazer teatro me ajudou a superar timidez. Ainda sou tímido, mas posso dizer hoje que sou um “tímido normal”. Eu era extremamente tímido, com dificuldades de interação, comunicação e o teatro ajudou a acabar com isso.

O teatro me deu voz.

Mas não é a única maneira de dar voz.

O teatro é antigo, muito mais antigo que imaginamos. Segundo a Enciclopédia Britannica, a palavra teatro deriva do grego theaomai (θεάομαι) - olhar com atenção, perceber, contemplar (1990, vol. 28:515).

Theaomai não significa ver no sentido comum, mas sim ter uma experiência intensa, envolvente, meditativa, inquiridora, a fim de descobrir o significado mais profundo; uma cuidadosa e deliberada visão que interpreta seu objeto (Theological Dictionary of the New Testament vol.5:pg.315,706).

Teatro é isso. É intensidade, envolve, mas mais do que isso, dá voz. Teatro é a voz do seu tempo é  forma de uma era se expressar e se perpetuar sendo conhecida por outras eras.

Shakespeare morreu muito antes que algum de nós pensasse em nascer, mas é presente em nossas vidas, é real e palpável. Conhecemos muito da idade média, dos séculos XVI e XVII por causa dele. No teatro rimos, nos divertimos, nos entretemos e lutamos, criticamos, resistimos como o teatro do oprimido de Augusto Boal, como “Arena canta Zumbi” ou as peças políticas de Dias Gomes e Gianfrancesco Guarnieri.

Dramaturgo brinca de ser Deus. Cria histórias, personagens e suas vidas. Além disso brinca de gato e rato seja com um censor de um governo ditatorial seja com a face de um pretenso governo democrático que esconde mazelas que acabam surgindo em palcos.

Teatro expõe a sociedade e seus porões, expõe o maior dos porões como a mente humana. O ser humano e seus mistérios sendo desnudados através do buraco da fechadura como Nelson Rodrigues fez brilhantemente no século XX.

O pai de família acima de qualquer suspeita que tem vida dupla, a mãe, os filhos, a família sendo exposta sem dó nem piedade e se incomodando com o fato. Vaias ensurdecedoras eram dadas na sonoridade de uma confissão de culpa.

Sim. Somos todos culpados. Todos nós deixamos de ser inocentes ao nascer.
Uma arte tão antiga e tão ativa que sempre se renova. O contato direto entre palco e plateia, entre personagem e público, entre a história contada e a história do seu tempo.

Teatro é a voz  que todos deviam um dia tentar ouvir.

Eu estou tentando.     

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