A DISPUTA DE SAMBA-ENREDO
*Coluna publicada no blog Ouro de Tolo em 14/9/2014
Ano
passado comecei no meu blog a divulgar alguns dos meus sambas preferidos das
escolas do grupo especial do Rio de Janeiro. Esse ano devido a uma série de
assuntos e compromissos só pude fazer agora em setembro com as disputas
entrando na reta final.
Ao
contrário dos outros anos só parei para ouvir os sambas nessa noite que faço a
coluna. Os aficionados por sambas correm para os sites especializados para
ouvir assim que eles surgem, eu já fui assim.
Agora sou
do tipo que só para pra ouvir em setembro.
Tem
coisas interessantes nos que ouvi até agora. Na São Clemente gostei dos sambas
do Alexandre Araújo e do Victor Alves, na Vila os sambas de Macaco Branco,
Tonico da Vila e Alexandre Valle. Mangueira gostei do samba do Lequinho e
gostei muito do samba do Cadu. Na Beija-Flor dos sambas de Serginho Aguiar e
Samir Trindade, Imperatriz achei a disputa nivelada.
Ainda não
ouvi Portela, Tijuca, Salgueiro, a recém saída fornada da Mocidade e Grande Rio
que ninguém ainda ouviu. Não vou falar da União da Ilha por estar envolvido no
concurso e gostei do samba da Viradouro, mas desse falarei mais quando tivermos
todos os sambas.
Ouvi os
sambas pensando em fazer uma coluna analisando essas escolas e suas safras.
Diria que na São Clemente achei o samba do Alexandre animado, no estilo antigo
da escola assim como do Cadu remete aos anos 80 da Mangueira, mas a medida que
ouvia os sambas concorrentes das escolas ia cansando.
Não por
culpa dos compositores. Já falei várias vezes e repito que o gênero
samba-enredo é o gênero musical de maior qualidade no país hoje.
Os sambas
em si não me cansam. Me cansa o tudo em volta deles.
Os
enredos não ajudam o que acabam padronizando e pausterizando os sambas. Tem os
afros de sempre com tudo aquilo que samba afro pede, tem clichês que são
necessários porque ao contrário de uma música comum o compositor de
samba-enredo participa de uma competição então nem sempre arriscar vale a pena
e tem aquela coisa curiosa de ser talvez o único trabalho do mundo em que boa
parte daqueles que exercem não sabem fazer.
Imagine
você entrar num avião e ser conduzido por um piloto que não sabe pilotar? Fazer
uma cirurgia em que o médico não sabe operar? O cara ser médico ou piloto porque
tem dinheiro apenas e assim conseguiu aquela nomenclatura?
Assim são
muitos compositores de samba-enredo. Assim são as parcerias de samba-enredo
hoje em dia, todas, se não tiver dinheiro pra investir não chega a lugar nenhum
e fica esse constrangimento velado de todo mundo saber que o cara não escreve,
ele saber que todo mundo sabe que ele não escreve e assim a coisa continuar.
Compositor
de samba enredo que é uma raça esquisita. Uma raça que se ferra, gosta de se
ferrar e pede pra se ferrar porque se já não bastasse todos os gastos que são
impostos inventou agora o vídeo clip e pelo que vi esse ano esses vídeo clips
estão cada vez mais incrementados virando curtas metragens.
Vai
chegar a hora que esse clip será obrigatório e ele irá reclamar.
Compositor
de samba enredo é uma raça esquisita e desunida. Trata o amigo do ano inteiro
como inimigo só porque está em outra parceria, gasta o que tem e o que não tem,
deixa a vaidade exacerbar assinando samba que nem sabe como foi feito e em vez
de se tocar que uma escola de samba só existe entre agosto e outubro por causa
dele tentando assim criar uma união, uma contenção de despesas e aumento de
qualidade faz o inverso.
As
disputas estão cada vez mais caras, mais “espetaculares”. Tudo isso eu falei
numa coluna recente que tratava o momento atual dos concursos como uma bolha.
Faltou dizer o que vou dizer agora.
Que as
disputas de samba enredo deviam acabar.
Qual a
solução? Não sei. Se eu tivesse a solução entraria pra história do samba. Não
tenho, mas sei que alguma coisa tem que ser feita. As despesas estão altas e
poucos são os milionários que participam de concursos. O que temos hoje são
compositores na maior parte das vezes de classe média que se juntam a alguns
mais abastados, mas não ricos, pra fazer uma parceria. Só que as despesas vão
aumentando, aumentando a cada ano, o monstro tendo que se alimentado até que
uma hora o recurso vai acabar.
Várias
escolas perceberam isso, que as disputas terão um limite de existência e já
buscam novas soluções. A primeira foi das reedições que deram certo por algum
tempo, mas cansaram, agora várias escolas andam encomendando sambas.
Começou
com as escolas da Intendente Magalhães que tinham prejuízo em seus concursos de
samba e chegou ao grupo de acesso onde desde o ano passado algumas escolas já
utilizam esse meio de chegar ao seu samba. Uma hora chegará ao especial.
Não
chegou ainda porque as escolas do grupo especial ainda são presas aos concursos
como fonte de renda. Não deviam. Várias delas tiveram quadras reformadas, são
marcas expressivas e poderiam sim arrecadar bem o ano inteiro sem depender de
enredos patrocinados e concursos de samba. Basta um pouco de marketing.
Se formos
analisar que até alguns anos atrás achávamos que nenhuma escola sobreviveria sem
bicheiros chegamos a conclusão que elas podem sim ser auto sustentáveis como
uma empresa.
Acho sim
que uma hora essa bolha irá explodir e acho também que a sugestão que darei não
irá ocorrer, é utopia. Mas se eu fosse presidente de uma escola de samba nunca
faria concurso e faria isso que direi.
A ala de
compositores seria uma ala de verdade. Com um número de compositores pré
definido. Alguns deles, por suas histórias, seriam fixos, outros convidados
desses fixos e de vez em quando abriria concurso para entrar na ala. Mesmo
entrando na ala teria que passar por estágio de dois anos fazendo sambas de
quadra e participando da vida da escola.
Essa ala
de compositores seria a responsável pelo samba. O samba seria da ala de
compositores, sem nome de compositor assinando e o dinheiro do direito de arena
seria da escola que daria um prêmio em dinheiro para os compositores dessa ala.
Sem ter
nome assinando, sem ter grande quantidade de dinheiro para receber só
participaria quem realmente gosta de compor ou da agremiação.
Isso não
vai acontecer porque a vaidade sempre irá prevalecer. Infelizmente no meio do
samba ainda não há espaço para o “Bom
senso”, mas é bom começar a repensar o sistema das escolhas de samba antes que
a bolha estoure.
E ela vai
estourar.
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