ERA DA VIOLÊNCIA 2: CAPÍTULO XXIII - AMORES E CONFLITOS
Enquanto Juliana entrava em minha
casa tarde da noite paramédicos entravam no hospital a toda com João Arcanjo na
maca. O homem estava em coma, com respirador e perdendo muito sangue. Entrou na
mesma hora na sala de cirurgia e Galalite e Rui ficaram na recepção.
Galalite puxou Rui em um canto e
perguntou “O que ta pegando malandro? Você não ia ajudar o cara, ia deixar
morrer, por quê?”. Rui desconversou “Eu nunca faria isso, o cara é meu
parceiro”.
Galalite continuou “Porra, eu vi
cara, se eu não me mexo ele tava morto agora. Tem alguma parada acontecendo e
eu quero saber o que é”. Um policial se aproximou da dupla que desconversou.
Rui se apresentou como colega do policial e disse que estava de folga com um
amigo e percebeu o homem baleado pedindo ajuda. Completou afirmando que não viu
quem atirou.
O policial pegava as informações
de Galalite e Rui enquanto João lutava pela vida.
Ao mesmo tempo Juliana me contava
tudo o que ocorreu, tudo o que viu. Eu ouvi e lamentei “Sinto muito Ju, eu não
esperava”. Juliana respirou fundo e respondeu “Guilherme estava certo e eu acho
que o Rubinho esconde mais coisas, algo podre”.
Juliana ficou me olhando e perguntei
o que ocorria. Ela me respondeu “Eu sempre tenho a impressão que você esconde
alguma coisa”.
Não entendi o que ela quis dizer e
Juliana repetiu “Você Gilberto. Parece que guarda segredos contigo. Você me
passa a impressão que sempre sabe de tudo que ocorre, mas me esconde, por
quê?”.
Falei que ela estava enganada e
minha ex sentou-se ao meu lado “Eu conheço você há tantos anos e parece que
conheço tão pouco”. Tentei mudar de assunto e disse “Você tem que ficar em cima
do Rubinho mesmo, jogar às claras com ele”. Juliana me interrompeu “Não estamos
mais falando do Rubinho e sim de nós”.
Perguntei o que tinha “nós” e
Juliana me beijou. Me beijou de surpresa, me deixando sem ação. No fim levantei
e disse que não podia.
Juliana perguntou qual era o problema
e sem olhar para ela respondi que já era tarde e era melhor que fosse embora.
Juliana levantou, me puxou e disse que não iria. Pedi por favor.
Juliana falou “A gente tinha se
acertado, iria voltar e de repente você pegou nojo por mim, desprezo, foi na
minha casa e disse que não me queria mais, do nada. Por todos esses anos eu
pensei porque você fez isso se é tão nítido que me ama!”.
Eu me meti numa sinuca de bico.
Juliana estava decidida. Eu tentava desviar, não olhava pra ela. Juliana me
puxou pelo colarinho e pediu “Diz que não me ama”. Respondi que não amava, ela
pediu que eu falasse olhando para seus olhos.
Eu olhei e disse “Eu não te amo”.
Juliana pediu que eu repetisse. Com lágrimas nos olhos falei “Eu te amo” e
beijei o meu amor.
Num ímpeto beijei e depois me
separei dela pedindo para ir embora. Juliana transtornada
começou a socar meu peito e gritar “Você quer me deixar Louca!! Me diz o que
está acontecendo!!”. Eu perdia que ela parasse, mas ela continuava até que não
aguentei e gritei “Nós somos irmãos!!”.
O silêncio tomou conta de minha
sala. Depois de um tempo Juliana, ainda tentando se recuperar, perguntou “Como
que é?”. Eu senti um alívio, como se um peso saísse das minhas costas e
respondi “Nós somos irmãos Juliana”.
Minha ex se sentou e contei toda a
história “Eu estava feliz Ju, nós tínhamos reatado e eu amava muito você. Só
que li o diário de minha mãe e nela havia um estupro relatado. Seu pai estuprou
a minha mãe”.
Juliana, quase catatônica,
respondia “Não pode ser” e eu continuei “Fiz os exames de DNA, com cabelo do
meu pai, o homem que me criou, de seu pai e deu que eu era filho do senador”.
Juliana lembrou que nós transamos
depois que eu soube e respondi “Sim, quando eu estava na mansão me recuperando.
Eu ia te contar tudo naquela noite, mas você me mandou embora, me ameaçou de
prisão”.
“Sim, eu por mais que te amasse
não iria ficar com você sendo um fugitivo. Mas você sabia e transou comigo,
como pôde? Nós tivemos dois filhos sendo irmãos Gilberto!!”. Gritou minha ex.
Respondi que eles eram sadios e
Juliana se levantou confusa e me acusando “Você transou comigo sabendo que era
meu irmão, você é um monstro”. Tentei me defender dizendo “Eu te amava Juliana,
sempre te amei. Você acha que foi fácil pra mim te amar em silêncio esses anos todos? Ficar
em silêncio com esse peso nos ombros?”.
Juliana comentou que precisava ir
embora. Eu tentei que ela ficasse, peguei em seu braço e ela soltou dizendo
“Não me toca, preciso ir embora”.
Dessa forma ela foi. Eu fiquei ali
sozinho sem saber o que fazer, sem saber o que pensar. Liguei o som e coloquei
a nossa música. Ouvia e me lembrava de Juliana, mulher que eu amava e
provavelmente perdera pra sempre naquele momento.
Eu não era muito de chorar. Mas
naquele momento não teve como. Comecei a chorar pensando na minha vida, em tudo
que eu perdera. Não era fácil.
No hospital João Arcanjo
continuava lutando contra a morte. Galalite e Rui esperavam sentados na
recepção quando Fernanda e Rodrigo chegaram. Fernanda abraçou Rui de Santo
Cristo e Rodrigo perguntou o que acontecera.
Rui respondeu que estava com
Galalite e passou numa rua onde encontraram João baleado e pedindo ajuda.
Rodrigo perguntou onde tinha sido e o policial respondeu “Em Honório Gurgel”.
Rodrigo perguntou “Mas vocês moram longe do bairro, como foram se encontrar
lá?”.
Rodrigo não era bobo e Rui teve
que rebolar “Uma coincidência. Uma feliz coincidência porque se não fosse isso
ele estava morto, não é Galalite?”.
O homem, ressabiado com tudo que
ocorria, só balançou a cabeça positivamente para Rui e
Rodrigo. Naquele momento o médico apareceu e perguntou se Fernanda era a esposa
de João.
Ela respondeu que sim e o médico
contou “Seu marido passou por cirurgia para retirada das balas. Uma no braço
direito e outra no peito que por sorte não pegou em nenhum órgão vital. Mas ele
está em coma e seu estado ainda é crítico”.
Fernanda perguntou qual seria o
procedimento a partir de então e o médico respondeu “Faremos o possível para
que ele esteja bem logo, quanto a vocês, rezem”.
Assim que o médico disse isso eu
cheguei no hospital. Não consegui nem “curtir” minha fossa tendo que ir ver o
que ocorria. Fernanda me viu e me abraçou. Perguntei o que acontecia e ela me
explicou.
Sentei ao lado de Rui, Galalite e
pedi a verdade. Rui respondeu baixinho que tinha dado cagada no serviço e
Galalite pediu explicações do que vinha ocorrendo, todo mundo parecia com
segredos. Rui respondeu “Fica na tua que ta pra entrar muito dinheiro para
você. Ta precisando não ta? Fica na tua”.
Levantei para beber água e Rodrigo
se aproximou dizendo que queria falar comigo. Fui até um canto com o policial
que me falou “Essa história ta muito estranha. Esse encontro casual em Honório
Gurgel, me diga o que você sabe”.
Respondi “Juro que não sei de
nada, tava tendo uma DR com minha ex quando o Galalite me ligou contando o que
ocorreu”. Rodrigo disse “Acredito em você, em relação a esse caso, mas você
sabe que o que ocorreu hoje é muito maior do que aparenta”.
Continuei falando que não sabia de
nada e Rodrigo continuou “Vocês fazem parte dos Cachorros velozes, eu já sei
disso, só não tenho ainda como provar”.
Mais uma vez disse que não sabia
de nada e que sua imaginação era fértil quando Rodrigo comentou “Até acredito
que seu envolvimento não seja tão grande assim. Desde seu começo na vida
criminal você foi mais de acompanhar a ação do que realizar. Mas você tem algum
envolvimento sim e acho melhor me contar antes que eu descubra”.
O cerco estava se fechando.
Percebia que Rodrigo estava cada vez mais próximo da verdade, mas preferi falar
nada e apenas agradeci me afastando.
Enquanto isso Juliana chegava em
casa. Perguntou por Rubinho a empregada que comentou que ele ainda não chegara.
A minha ex pediu que ela ajudasse em uma coisa e a mulher perguntou em que.
Juliana respondeu “Venha ao meu quarto”.
Quando Rubinho chegou encontrou
duas malas cheias na porta de casa e Juliana sentada no sofá da sala. Perguntou
se a mulher estava com insônia e Juliana respondeu “Não, até estou com sono,
mas estava te esperando”.
Rubinho perguntou qual era o
problema, a esposa nunca fora de ficar lhe esperando e Juliana respondeu “Você,
você é o problema. Está vendo essas malas? São suas”.
O empresário perguntou que
brincadeira era aquela e Juliana respondeu que não era brincadeira nenhuma “Eu
vi você se encontrando no carro com a vagabunda da Flávia. Foram a um motel trepar e nem deixaram o
Donato esfriar direito no caixão. Seu próprio irmão, o marido dela”.
Rubinho riu e perguntou “É isso?”
Juliana respondeu “Sim, é isso”. O empresário então pegou suas malas no chão e
disse “Depois mando alguém pegar o resto”.
Foi a vez de Juliana rir e
comentar “Tantos anos de casados e é isso que você tem a dizer. Nem tentou me
convencer do contrário”. Rubinho respondeu “Esse casamento deu o que tinha que
dar. É até um alívio para mim que você tenha descoberto tudo”. Rubinho abriu a
porta e completou “Além do mais você é muito ruim de cama”.
Fechou a porta indo embora com
Juliana levantando e aos berros lhe chamando de canalha e cachorro. Minha ex
logo depois voltou a se sentar e começou a chorar. Tudo o que vinha acontecendo
doía. Principalmente saber que era minha irmã.
Rubinho foi direto à casa do irmão,
onde a viúva ainda morava. Tocou a campainha com as malas na mão e Flávia
atendeu. A mulher perguntou o que significava aquilo e Rubinho respondeu
“Terminei com Juliana, vim morar com você”.
Flávia riu e Rubinho perguntou o
motivo da graça. A mulher respondeu e perguntou “Seu irmão, meu marido acabou
de morrer, o que você acha que vão dizer?”. Rubinho respondeu que não
interessava o que os outros diriam e Flávia continuou “Minha filha está em
casa, você acha que ela vai pensar o que?”. Rubinho respondeu “Fale a verdade,
que nos amamos”.
Flávia pediu “Vai para um hotel e
vamos esperar a poeira baixar, temos toda uma vida pela frente”.
Rubinho concordou, beijou a mulher
e se despediu indo embora. Flávia ficou sorrindo na porta e comentou baixinho
“Imbecil”.
Na manhã seguinte Fernanda dormia sozinha
na recepção do hospital quando o médico deu a boa notícia que João se
recuperava. O homem acordou e aos poucos foi melhorando. Já fora de perigo e
conversando normalmente eu fui visitá-lo.
Entrei no quarto e perguntei como
ele estava. O farmacêutico riu e respondeu “Eu vi um túnel, caminhei pelo túnel
e vi uma luz”. Rindo perguntei “Não era um trem vindo ao contrário?”. João
Arcanjo gargalhando respondeu “Devia ser”.
Conversamos durante um tempo e
falei com João “Cara, eu já tinha te avisado. Isso que ocorreu foi mais um
aviso, está na hora de parar”. João só me ouvia e continuei “Você tem uma
esposa maravilhosa e que te ama. Sai dessa, vai viver sua vida, ter filhos,
você já tem uma grana legal”.
João ouviu a tudo, respirou fundo
e me disse “Você tem razão, ta na hora de parar”. Sorri e falei “É isso, é isso
aí”. João continuou “Realmente já tenho um bom dinheiro, algumas farmácias
espalhadas por aí. Não tem porque continuar. Vou sair, me recuperar totalmente,
fazer fisioterapia em meu braço e viver minha vida”.
Abri um largo sorriso e mexi no
cabelo de João brincando com ele. Depois comentei “Você é um cara legal, tem
uma história sofrida, merece ser feliz e espero que agora seja”.
João agradeceu e respondeu “Te
desejo o mesmo com a sua Juliana. Sei que você ama a senadora e ela te ama
também”. Comentei que o nosso caso era mais complicado e João respondeu “Sempre
há um jeito pra tudo”.
Será? Pode até ser, mas para nós
dois não.
Saí do quarto e dei de cara com
Juliana e Guilherme. Constrangida Juliana me cumprimentou e eu respondi. Ela
entrou no quarto e meu filho ficou do lado de fora.
Guilherme me perguntou o que
ocorria e respondi que nada questionando o porque da pergunta. Guilherme
respondeu “Vocês dois estão muito estranhos. Agora que minha mãe se separou
daquele canalha e achei que vocês fossem se acertar fica esse clima”.
Falei que tinha clima nenhum e meu
filho continuou “Ta pensando que sou otário né? Não quer falar tudo bem, mas
alguma coisa está acontecendo”.
Parecia uma romaria no quarto de
João Arcanjo e chegou a vez de Rui de Santo Cristo. O policial perguntou como o
farmacêutico estava e João respondeu que bem. O homem aproveitou e agradeceu a
Rui por ter lhe salvado. Rui respondeu que não precisava agradecer e lembrou “Somos
irmãos, esqueceu?”. João sorriu e Rui continuou “Daqui algum tempo você ta de
novo na ativa. Voltaremos aos trabalhos”.
João comentou com Rui que iria
parar, não iria mais trabalhar com a organização e Rui sorriu dizendo que
depois falariam sobre, mas tinha uma pessoa querendo lhe ver.
João perguntou quem era e Rui
respondeu “Você vai ver, vou chamar”.
Rui saiu e Yolanda entrou. João se
assustou e disse “Yolanda!”. A mulher se aproximou e perguntou como ele estava.
Temeroso João comentou que sua mulher
poderia entrar a qualquer momento e Yolanda pegou na mão do farmacêutico
comentando “Relaxa, ela foi em casa, eu vi saindo”.
João continuou em silêncio e
Yolanda disse que estava com saudades dele. João comentou que também sentia
saudades e a garota de programa prosseguiu “Eu me afastei como você pediu.
Respeitei sua relação, sua tentativa de voltar à sua família, mas eu te amo
João e quando eu soube o que ocorreu só faltou que eu morresse”.
João agradeceu e Yolanda fez
carinho nos cabelos dele dizendo “Você é o homem da minha vida, se você morrer
eu morro junto”.
Algum tempo depois Yolanda saiu do
quarto e caminhou para o lado de fora do hospital. Rui de Santo Cristo correu
ao seu encontro e perguntou “E aí?”. Yolanda continuou andando e respondeu “Caiu”.
Rui caminhou ao lado da mulher e sorrindo deu um tapa na sua bunda.
Os dias se passaram e João foi
para casa. Cem por cento e apenas com uma tipoia no braço que ainda se
recuperava. Fazia fisioterapia e ao mesmo tempo retomava o comando das farmácias.
Uma tarde Fernanda chegou em casa
e encontrou um envelope. Estava direcionado a ela que estranhou o fato de não
estar assinado. Curiosa, decidiu abrir.
Tinha fotos dentro. Fotos de João
Arcanjo com Yolanda. Em vários lugares. Restaurantes, bares, praia, entrando em
um motel. Fotos em que trocavam carinhos, se beijavam e a prova que as fotos
eram atuais era a tipoia no braço de João.
Arrasada, decepcionada, sem chão,
faltavam adjetivos para definir a situação de Fernanda no momento. A mulher começou
a chorar copiosamente quando tocaram a campainha. Ela atendeu e era Rui de
Santo Cristo.
A mulher aos prantos abraçou Rui e
chorou em seus braços. Rui lhe consolava com um sorriso nos lábios.
O plano dera certo.
ERA DA VIOLÊNCIA 2 (CAPÍTULO ANTERIOR)
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