NICO CARIOCA
*Nos 25 anos que criei esse personagem republico conto da coluna "O buraco da fechadura" do blog "Ouro de Tolo" de 14/12/2013.
A empregada da casa dos Mourão de Souza
varria a sala da mansão da família cantando o clássico de Luis Melodia
“Lava roupa todo dia, que agonia” enquanto todos dormiam ainda na
residência. Estendeu umas roupas e foi para o jardim catar as folhas que caíam das árvores daquela manhã de outono.
Com um saco de lixo e uma pá recolhia as
folhas reclamando que devia pedir aumento salarial quando viu o
patriarca da família, Jece Mourão de Souza, boiando na piscina. Deu bom
dia a ele passando direto e com cara de estranhamento voltou, reparando
que o homem estava morto.
Deu um grito de pavor e em poucos
minutos a PM, a Civil, o BOPE, exército, marinha, aeronáutica, Interpol,
Cia, KGB, Comandos em Ação estavam todos lá, fora a imprensa ávida por
sangue. Jece Mourão de Souza era um dos maiores empresários da área da
mineração do mundo, estando na lista dos dez homens mais ricos do
planeta e evidente que essa notícia ganharia repercussão internacional.
Todos os órgãos de imprensa estavam à
frente da mansão tentando alguma informação. Ninguém da família queria
conversar, apenas a empregada que quase escondida com tantos microfones a
sua volta contava do susto que tomou quando descobriu que o patrão
tinha “cantado pra subir”.
Todas as televisões da cidade estavam
ligadas em telejornais contando o caso, inclusive a do bar de seu
Joaquim. Os frequentadores prestavam atenção e arriscavam palpites do
que acontecera; menos Nico Carioca e Rambo que contavam moedinhas para
pagar o pão com manteiga e café com leite que consumiram.
Nico Carioca é o “herói” de nosso conto,
detetive um tanto quanto fracassado e desajeitado. Fã número 1 de Dick
Tracy Nico costumava se vestir igual ao detetive americano com um
chamativo terno amarelo, chapéu amarelo e gravata vermelha e tinha uma
sala em um prédio velho em Copacabana aonde atendia seus clientes.
Mas há tempos Nico não recebia nenhum
cliente, então começou a se virar como podia. Arrumou emprego como babá
de cachorros e todos os dias passeava com vários pela Zona Sul. Rambo
era seu auxiliar e de Rambo não tinha nada. Era um rapaz magrinho e com
óculos fundo de garrafa que não abandonava Nico nem naquele momento
difícil.
Nico e Rambo nem prestavam atenção na
tv. Conseguiram juntar as moedas e pagaram o consumido, Nico pediu que
Rambo desse uma faxina na sala e foi ao encontro de seus “bebês” passear
com eles.
Na praia de Copacabana com muita
dificuldade era conduzido por cinco cachorros enormes e tentava
segurá-los pela corrente presa às coleiras .
Um dos cachorros se soltou e Nico entregou a corrente a um menino que
foi arrastado pelos cachorros. Nico corria atrás do animal gritando
“Rex” e o encontrou entrando no mar.
Pegou o cachorro pedindo que ele não
fugisse mais quando notou que o animal descobrira algo no fundo.
Aproximou-se da água e comentou “mas o que é isso?”. Alguns minutos
depois o caso “Jece Mourão de Souza” saía do ar para mostrar um Nico
Carioca todo orgulhoso contando à imprensa que encontrara o corpo de
Ulysses Guimarães.
Dia intenso para a imprensa brasileira.
Nico e Rambo festejavam na sala
brindando com água da bica em copo descartável e Nico se vangloriava de
ser o melhor detetive do planeta e que a miséria acabaria quando bateram
na porta. Nico pediu que Rambo atendesse a porta e ele atendeu entrando
uma morena misteriosa, altura dos cinquenta anos de idade e Nico pediu
que se sentasse.
Perguntou qual era o problema e ela
respondeu se chamar Jaqueline Mourão de Souza e que ele devia ter
acompanhado o caso de seu marido pela TV. Nico respondeu não e Jaqueline
contou que seu marido fora assassinado e queria que ele pegasse o caso.
Jaqueline contou em pormenores o que ocorrera e o detetive topou o caso
pedindo seu endereço para conversar com os moradores da casa.
Nico foi até a mansão dos Mourão de
Souza e reuniu todos à sala. Moravam lá Jaqueline, Vitinho que era filho
do casal, Edu irmão da vítima, o mordomo e a empregada que encontrou o
empresário morto.
Nico perfilou a todos e andando de um
lado para o outro disse que o assassino estava naquela sala. Olhou bem
um a um e Edu bêbado respondeu “não olhe assim que me apaixono”. Nico
perguntou ao grupo se ele era sempre assim e o mordomo respondeu que ele
sempre se apaixonava mesmo. Nico olhou bem para o mordomo e comentou
“interessante ter um mordomo, mordomo sempre é o culpado”. O mordomo
respondeu “seria óbvio demais senhor detetive, odeio clichês”.
Nico ia saindo da casa quando a
empregada correu atrás dizendo que tinha uma informação a ele. Nico
perguntou qual era e ela respondeu que o empresário tinha uma amante
chamada Kátia Flávia, ex surfista e ex garota de Ipanema que virava a
cabeça do empresário. Nico achou interessante e achou ainda mais
interessante o fato da amante ser quatro vezes viúva.
Nico com sua roupa de Dick Tracy pegou
sua cadeira de praia e rumou a Ipanema. Sentou na areia e ficou lendo
jornal para achar Kátia Flávia e achou a mulher saindo da água.
E ela era como na música de Fausto
Fawcett, uma loiraça belzebu provocante. Nico ficou de queixo caído com a
beleza da mulher e tremendo voltou a ler o jornal. Kátia Flávia passou
por ele e em seu ouvido disse que se queria vigiá-la que pelo menos não
botasse o jornal de cabeça para baixo. Nico notou a besteira e levantou
dizendo que tinha algumas perguntas para fazer a ela. Kátia perguntou se
ele não queria ir à sua casa. Ela tomaria um banho, ficaria seca e
contaria tudo que ele queria.
Algumas horas depois estavam nus na cama
debaixo de uma coberta Nico com cara de satisfação e Kátia Flávia
dizendo que ele podia perguntar. Nico quis saber de seu caso com o
empresário morto e as suspeitas que caíam sobre ela. Kátia respondeu que
era inocente e não ganhava nada com sua morte, apenas Jaqueline que era
beneficiada de um seguro .
O telefone de Nico tocou, ele atendeu e era Rambo informando sobre mais uma morte na mansão.
Nico correu para a casa que já estava
cheia de policiais e a empregada levou o detetive até um dos banheiros
do local. Ali Nico encontrou Edu morto com a cabeça na privada e coçou o
queixo dizendo ter um serial killer naquela casa. O delegado da região
mandou que Nico voltasse a cuidar de cachorros porque aquele caso era
pra profissionais e o detetive revidou dizendo que encontraria o
assassino antes dele.
Saiu do banheiro e encontrou quarto de
Vitinho aberto. Foi até a porta e viu o menino compenetrado usando o
computador. Perguntou ao adolescente se ele sabia do que ocorrera e
Vitinho sem tirar os olhos da tela respondeu que seu tio morrera, assim
como o pai. Nico perguntou se aquilo não lhe abalava e olhando para a
tela ele respondeu que um dia todos morreriam mesmo.
Nico saiu e foi para a sala intrigado
com aquela rápida conversa e comentou com o mordomo que aquele garoto
não era normal. O mordomo respondeu que Vitinho era uma caixa preta e
guardava muitos mistérios. Nico perguntou o que o mordomo quis dizer com
aquilo e o mesmo desconversou e saiu.
Nico tinha várias pontas para ligar. A
amante quatro vezes viúva, a esposa beneficiada por um seguro, o filho
que guardava segredos. Todos naquela história poderiam ser o assassino e
ele investigava o caso com afinco. Comentou com Rambo que o mordomo
poderia ser chave para desvendar o mistério e começaram a lhe seguir. Em
uma noite viram o homem entrar em uma boate gay e entraram atrás.
De longe viram o mordomo se embebedar e
paquerar rapazes e quando já estava bem bêbado Nico disse a Rambo que
era hora de se aproximarem e arrancar tudo do mordomo. Nico chegou nele e
cumprimentou. O mordomo espantado falou que não sabia que Nico gostava
da “fruta” e o detetive respondeu que tinha muitas coisas em segredo ali
e que gostaria de saber alguns.
O mordomo respondeu que tinha que ir ao
banheiro e depois contaria tudo que Nico quisesse e saiu. Nico pediu um
drinque, recebeu várias cantadas e ouviu um grito.
Correu ao local e viu o mordomo caído
esfaqueado. Morte instantânea. Nico agachado ao lado do corpo dizia que
aquele caso era mais perigoso que imaginava e Rambo chegou correndo
perguntando o que aconteceu. Nico respondeu que tinham mais uma morte
pra investigar. O detetive voltou à mansão e contou à empregada o que
ocorrera. A mulher se chocou e Nico pediu para revistar o quarto do
mordomo recebendo a permissão.
Revistou o quarto todo do homem e
encontrou um gravador. Colocou pra tocar e enquanto ouvia percebia que
ali tinha pistas importantes. Subiu até o escritório de Jece.
Entrou no escritório sem que ninguém
notasse e bateu na parede em vários lugares até que encontrou uma
passagem secreta. Abriu a passagem e viu ali uma sala repleta de ouro,
muito ouro em estátuas, prataria, quadros valiosíssimos, uma fortuna
escondida pelo dono da casa e no fundo um cofre.
O cofre estava aberto e dentro tinha
pastas com documentos e o que mais interessava a Nico. Dvds e mais dvds,
colocou na TV do escritório e a maioria mostrava filmes caseiros gays e
um especificamente uma briga em que Jece se envolvera. Nico estava
próximo de solucionar o caso.
Jaqueline preparou uma mega festa de
aniversário e a casa estava cheia de convidados. Nico e Rambo estavam
presentes com o detetive na esperança de ali encerrar o caso. Enquanto
todos se divertiam Nico andava pela casa procurando a solução, alguma
pista para encontrar o assassino.
Olhava a todos os presentes. Jaqueline
Mourão de Souza, Vitinho, Kátia Flávia que estranhamente estava aos
risos com a viúva e a empregada que tensa servia os convidados. Nico
virou para comentar com Rambo sobre suas suspeitas, mas seu auxiliar já
sumira atrás de salgadinho.
Uma banda tocava no jardim músicas da
Jovem Guarda e Nico em um canto observava comendo risole e tomando
guaraná quando Kátia Flávia passou por ele dizendo que estava lindo e
lhe apertou a bunda. Aquela mulher desconcentrava Nico, que no fundo
torcia para ela não ser a assassina.
Entrou na casa para ver se descobria
alguma coisa e ouviu uma discussão vinda do segundo andar. Antes que
tivesse qualquer reação a luz na casa acabou e ouviu um barulho de tiro.
Sabia que vinha do segundo andar e subiu correndo. Viu o vulto de uma
pessoa toda de preto e mandou a pessoa parar. Ela não obedeceu e subiu
para o terraço. Nico foi atrás e dessa forma os dois pararam no lugar
que era bem alto.
Nico com medo de altura pediu que a
pessoa vestida com roupa ninja e rosto coberto parasse quando ele
apontou a arma ao detetive. Nico pediu calma e se atracou com o
assassino. Os dois lutaram ferozmente pela arma na beira do terraço até
que mais um tiro foi disparado acertando de raspão o braço de Nico. No
mesmo momento o assassino se desequilibrou e caiu do terraço.
Nico desceu correndo as escadas enquanto
as pessoas se juntavam em volta do assassino, que agonizava. Nico se
aproximou do homem, ajoelhou a seu lado e tirou sua máscara tomando um
susto.
Era seu auxiliar Rambo e a pessoa morta
no segundo andar era Vitinho. Nico perguntou a Rambo “por quê” e Rambo
pediu que Nico realizasse seu último desejo. Nico perguntou qual era e
Rambo puxou o rosto do detetive lhe dando um beijo na boca e
morrendo.Nico levantou cheio de nojo e dizendo as pessoas que não teve
culpa, o outro que lhe beijou. Jaqueline perguntou o que acontecia.
Nico respondeu que Vitinho tinha um
relacionamento homossexual e o pai descobriu achando vídeos caseiros em
que ele transava com um homem com máscara. Vitinho se sentiu ameaçado e
junto com o amante matou o pai e todos aqueles que ameaçaram seu
segredo. Entre eles o mordomo que gravou um das brigas e nessa gravação
falavam da passagem secreta. O amante matou o mordomo na boate gay para
proteger Vitinho.
Jaqueline espantada ouvia a
tudo e Nico completou que só não imaginava que o amante fosse seu amigo
Rambo e contou que Vitinho estava no segundo andar morto.
Jaqueline deu um grito desesperado e
correu atrás do filho. Nico pegou um risole e comentou com a empregada
que talvez fosse melhor ir embora e cobrar em outro momento o dinheiro
pela solução do caso. Andou um pouco e soltou um “ai” dizendo que era
melhor passar antes em um hospital.
Alguns dias depois Nico andava com os
cachorros pela praia, mas agora era um pouco diferente. Virara uma
celebridade e com dificuldades dava autógrafo e tirava fotos com
populares quando um carrão encostou ao seu lado.
Ele se aproximou do carro e a pessoa que
estava dentro abaixou o vidro. Era Kátia Flávia que perguntou se ele
passearia com cachorros ou preferia passear com ela. Nico olhou para
aquela mulher linda, para os cachorros e soltou os animais mandando que
eles corressem para a liberdade. Entrou no carro e Kátia deu a partida
com o carro sumindo pelas ruas de Copacabana.
Seu nome é Carioca. Nico Carioca.
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