DINASTIA: CAPÍTULO IX - SANTOS
Os
hormônios do rapaz entraram em ebulição ao mesmo tempo em que sentia falta do
pai. Salvatore a cada quinze dias viajava até São Paulo e passava os fins de
semana com a família. Contava as dificuldades de seu dia a dia, o trabalho
puxado e que sonhava voltar logo para a família.
Com o
passar do tempo às idas do pai até São Paulo diminuíram e passaram a ser
mensais. O homem mandava cartas e alegava enfrentar muito trabalho e não ter
tempo de viajar, mas que carregava todos no coração e na alma.
Dora,
cada vez mais triste, sentia falta de Salvatore e Pepe não sabia o que fazer
diante da situação. Achava estranha aquela atitude do pai. Salvatore sempre foi
muito ligado a família e o menino pensava que algum problema ocorria.
Como era
o “novo homem da família” começou a trabalhar. Estudava de tarde então acordava
bem cedo para vender jornais. Geralmente acordava antes do galo cantar, fazia
seu café, pegava a bicicleta e partia.
No fim da
manhã voltava para casa e almoçava junto com os familiares. Trocava de roupa e
saía para o colégio. Mesmo com tantas tarefas era um excelente aluno.
Pepe era
um garoto bem maduro para a idade. Assumira a responsabilidade dada pelo pai
levando a sério a história de “homem da casa”. Protegia sua mãe, irmãos, avó e
mandava cartas para o pai contando como estava a vida. Pedia para que Salvatore fosse até
São Paulo ver a mãe que sofria de saudades.
Além
disso, havia Constância, a bela espanhola que cuidava de Antonieta e perturbava
o rapaz. Constância sabia que mexia com o italianinho e adorava provocar com decotes
generosos e sorrisos maliciosos.
Um dia
pediu para que Pepe ensinasse a ela a ler e escrever. O menino sentou com a
moça à mesa com seus livros, cadernos, mas não conseguia se concentrar vendo o
decote e principalmente as pernas da espanhola. Constância perguntou se o
menino tinha algum problema e ele respondeu gaguejando que não.
A mulher
então chegou a seu ouvido e disse que estava doida para aprende o a,b,c com o
ragazzo.
Naquela
noite, mais uma vez, Pepe teve que tomar um banho gelado antes de deitar.
Pepe cada
vez enlouquecia mais por causa da bela mulher. Uma noite desceu para beber água
e estava Constância na cozinha com uma camisola curtíssima bebendo água. O
rapaz ao ver a cena ficou paralisado na porta.
A mulher
notou sua presença e perguntou se estava tudo bem. Pepe não falava nada então
Constância pegou a jarra, encheu de água e andou sensualmente até o menino
colocando em sua mão e dando um beijo no seu rosto.
Desejou
boa noite a Pepe e em seu ouvido contou que se ele precisasse de alguma coisa,
qualquer coisa era pra bater em sua porta.
Mais um
banho gelado..
A vida de
Pepe era um turbilhão dividido entre o desejo por Constância e a ausência do
pai que nem carta mais mandava. O homem não aparecia há três meses na casa,
mais de um mês sem mandar cartas e isso preocupava a todos.
Até que
um dia Salvatore apareceu pra visitar.
Foi
recebido com grande festa, exceção de Dora que olhou sério e se retirou. Os
dois se trancaram no quarto do casal e Pepe resolveu ouvir a conversa colando o
ouvido na porta.
Ouviu
Dora cobrar a presença do marido, queria explicações por seus sumiços e
Salvatore alegava que o trabalho lhe consumia. Dora perguntava se tinha mulher
na história e o italiano se indignava respondendo que vivia só para a esposa e
os filhos.
Pepe
ouviu a mãe chorando e o pai dizendo que iria um pouco para o lado de fora
tomar ar. O rapaz em vez de correr para não ser visto pelo pai ficou ali, em
pé, esperando que abrisse a porta.
Salvatore
abriu e deu de cara com Pepe. Perguntou se o rapaz estava ouvindo a conversa,
completando que aquilo era muito feio e o menino respondeu que estava sendo
homem como o pai pediu e esperava que o pai estivesse fazendo o mesmo.
Salvatore
perguntou a Pepe “que audácia era aquela” quando o menino deu as costas e se
retirou.
O clima
estava pesado na casa para Salvatore que naquela noite mesmo despediu-se de
todos para voltar a Santos prometendo que voltaria
à casa com mais frequência.
Depois
que o pai partiu Pepe tomou uma decisão.
Naquela noite
deitou, não conseguiu dormir e levantou. Encheu de coragem e bateu na porta de
Constância.
A
espanhola abriu a porta e perguntou se o rapaz queria alguma coisa. Pepe
respirou fundo e deu um beijo na mulher. Após o beijo Constância perguntou o
que significava aquilo e cabisbaixo Pepe pediu desculpas.
Constância
puxou o rapaz e lhe beijou. Com ele dentro do quarto fechou a porta e trancou.
Dessa
forma os dois fizeram amor, a primeira vez de Pepe.
Quase
amanhecendo Pepe saiu do quarto de Constância e desceu ao primeiro andar da
casa, mas não foi vender jornais como sempre. Pegou papel, lápis e escreveu uma
carta deixando sobre a mesa.
Pegou a
mala que estava encostada na mesa, abriu a porta de casa, respirou fundo e foi
embora.
Quando
Dora acordou viu a carta de seu bambino contando que fora a Santos atrás do
pai.
Pepe
juntara um dinheiro com a venda dos jornais e dessa forma conseguiu comprar uma
passagem para Santos. Embarcou no trem e assim como Salvatore anos antes se
impressionou com a viagem e tudo aquilo que viu no caminho.
O menino
tinha esperança de dias melhores, ter sua família de volta.
Chegou em
Santos e tinha como referência apenas uma carta do pai que levou que mostrava o
endereço que ele estava. Menino esperto saiu perguntando pela rua até que
encontrasse a pensão que estava hospedado.
Perguntou
ao balconista por Salvatore Granata se apresentando como filho dele. O homem
com cara de entediado sem deixar de ler o jornal respondeu que ele estava em um
bar próximo.
Pepe
então se encaminhou para lá e encontrou o pai sentado com alguns homens e
mulheres, inclusive uma em seu colo, bebendo e cantando.
Ao ver o
pai naquela situação Pepe gritou “papa” e Salvatore tomou um susto tão grande
ao ver o filho que deixou a mulher cair no chão.
Salvatore
andou até o filho e perguntou o que ele fazia ali. Pepe devolveu perguntando se
era aquele seu trabalho em Santos e Salvatore pegou o menino pelo braço levando
até a pensão dizendo que aquele não era lugar pra ele.
Chegando
ao quarto da pensão Pepe mais uma vez perguntou se era aquele seu trabalho em
Santos e Salvatore respondeu que era seu dia de folga e não devia satisfações
ao filho, pois, o adulto ali era ele. Pepe devolveu respondendo que devia sim
porque sua mãe estava sofrendo em São Paulo por sua causa enquanto ele estava
com uma mulher da vida no colo.
Salvatore levantou a mão espalmada para bater
no filho e Pepe
sem fraquejar disse que amava o pai, mas se levasse o tapa perderia todo o
respeito que tinha por ele.
Realmente
Pepe se transformara em um adulto.
Salvatore
abaixou o braço e mandou que o filho fosse embora e voltasse para São Paulo
cuidar da família. Pepe respondeu que Oscar já tinha idade para isso, que o pai
não reparara, mas o irmão também crescera.
O pai
emendou dizendo que ali não era lugar para ele, ele tinha que continuar
estudando, perto da família e o levaria pra estação para comprar passagem e ele
voltar. Pepe respondeu que não iria e se fosse forçado a entrar no trem
desceria no meio do caminho e voltaria pra Santos.
Resignado
Salvatore sentou na cama e perguntou o que o filho queria. Pepe olhou uma cama
de solteiro ao lado e perguntou se estava vaga. O pai respondeu que sim então
Pepe jogou sua mala sobre a cama e contou que aquela cama agora era dele.
Salvatore
olhou o filho espantado, sem dizer nada e Pepe emendou que trabalharia com o
pai, os dois juntos conseguiriam juntam dinheiro para montar um negócio em São
Paulo e voltarem para a capital.
Salvatore
perguntou se o filho estava louco e o rapaz respondeu que não, era um Granata.
Nesse momento Salvatore sorriu, levantou e abraçou o filho. Sentiu imenso
orgulho do garoto e viu nitidamente seu sangue quente, italiano percorrendo nas
veias de Pepe.
Salvatore
levou Pepe até o porto e conseguiu emprego para o filho. Dessa forma os dois
começaram a trabalhar juntos acordando bem cedo e indo ao porto descarregar os
navios.
Juntavam
dinheiro como Pepe planejara e sempre que podia o menino mandava cartas para a
família contando como estavam as coisas. Uma vez por mês pelo menos pai e filho
iam para São Paulo visitar a família.
Pepe
dessa forma aproveitava para matar as saudades de Constância. Ninguém na casa
desconfiava do caso deles. A relação de Salvatore e Dora também melhorara desde
que o filho partira para trabalhar com o pai.
E
Salvatore e Pepe criaram uma grande amizade que transcendia a relação pai e
filho. Um grande companheirismo e
cumplicidade. Às vezes os dois saíam juntos para beber e jogar sinuca.
Aproveitavam também que com o vai e vem do porto casas de tolerância foram
abertas na região.
Salvatore
sempre respeitou a presença do filho e mesmo quando iam nessas casas nunca
fazia nada, apenas bebia, jogava sinuca e conversa fora. O menino sim que na
flor da idade, de seus dezessete anos era namorador. Tinha várias namoradas não
só no local como pela cidade.
Salvatore
ria e contava que Pepe lembrava a ele quando garoto.
Um ano se
passara desde que Pepe foi trabalhar com o pai e nesse período o italianinho
demonstrou seu interesse pelas espanholas tendo um caso sério com Angelina. A
mulher mais bonita da casa de tolerância.
Não foram
poucas as vezes que o rapaz dormia no lugar com a mulher, mais velha que ele e
aparecia na pensão apenas a tempo de tomar banho e sair pra trabalhar com o
pai.
Mas mesmo
com essa vida boêmia Pepe era responsável e não faltava um dia de trabalho.
Trabalhava carregando muitas vezes sacos pesados de importações que chegavam ao
porto sem reclamar. O suor gerava frutos, dinheiro e o sonho cada vez mais
próximo da volta.
Como já
foi relatado acima Salvatore era muito discreto e Pepe não percebia se o pai
tinha casos ou não. Mas com o tempo chegou a vez do pai ter sumiços, passar
noites fora e Pepe não entender o que acontecia.
Quando
estava com Salvatore perguntava se algo ocorria o italiano desconversava. Só
que acontecia sim.
Salvatore
se apaixonara por uma viúva francesa que conheceu fazendo compras uma vez na
mercearia chamada Lili. A bela francesa esperava pra saber quanto dava as
compras e Salvatore, presente no local, aguardava sua vez.
Na hora
de pagar Lili percebera que não tinha o dinheiro todo e cheia de vergonha disse
ao balconista que devolveria os produtos. Cavalheiro, Salvatore impediu que a
mulher fizesse isso, tirou dinheiro do bolso e pagou a conta.
Lili
agradeceu a gentileza do italiano e ele perguntou se poderia ajudá-la levando
as compras até sua casa. Lili concordou. Os dois foram batendo papo. A francesa
ofereceu uma xícara de café para Salvatore e o homem lhe convidou para um
sorvete.
Do sorvete
nasceu uma amizade e dali um caso. Salvatore estava cada vez mais envolvido com
a mulher a ponto de Pepe viajar sozinho para ver a família em São Paulo por não
encontrar o pai. Para a mãe o rapaz deu a desculpa do pai estar dobrando
trabalho para juntar dinheiro.
Mas Pepe
não era bobo como já deu para perceber. Ao voltar investigou a situação e
descobriu tudo. Um dia bateu na porta da casa da viúva francesa perguntando
pelo pai.
Lili foi
chamar o homem e quando Salvatore saiu de dentro da casa deu de cara com Pepe.
O homem
não sabia o que dizer e o rapaz respondeu que não precisava dizer nada, só
queria ver a verdade.
Pepe foi
embora deixando o pai para trás. Chegou na pensão e escreveu uma carta para a
mãe convidando a ela e seus irmãos para um passeio de fim de semana em Santos. Colocou
um dinheiro junto e disse que era pra pagar as passagens.
Qual não
foi a surpresa de Salvatore abrir a porta de seu quarto na pensão e dar de cara
com Dora, Oscar e Giuliana.
O homem
teve que fingir contentamento enquanto Dora lhe abraçava e dizia feliz por ele
e o filho mandarem dinheiro pra passarem fim de semana juntos. Salvatore
engoliu em seco e respondeu que era uma vontade antiga deles.
A família
inteira saiu para passear e enquanto Dora, Oscar e Giuliana colocavam os pés na
areia da praia Salvatore perguntava a Pepe o que significava aquilo.
Pepe
então mandou que Salvatore se despedisse de Lili, dissesse que foi muito bom
enquanto durou, mas que tinha que voltar para São Paulo.
Salvatore
olhou espantado para o filho que completou “já temos dinheiro suficiente para
montar um pequeno negócio papa, lá é nosso lugar, com nossa família”.
Pepe
olhou profundamente nos olhos do pai e bateu em seu ombro dizendo novamente “a
nossa família”. Depois se juntou aos irmãos e a mãe na praia.
Dessa
forma Salvatore decidiu seguir o que o filho disse. Despediu-se de Lili e
comunicou a Dora que voltariam com eles.
Foi uma
grande festa no seio dos Granata, a família estava toda reunida novamente.
Graças a
Pepe.
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