ERA DA VIOLÊNCIA 2: CAPÍTULO XXV (2° PARTE) - JOGOS DA PAZ EM TEMPOS DE GUERRA
Continuando...
Anoiteceu e Rui de Santo Cristo
estava dentro de um carro estacionado em uma rua vazia. O policial tinha um
semblante sério, fechado. Tomou uma cerveja enquanto ouvia rádio. Tocava Tony
Tornado cantando “Br-3”.
Ninguém mais na rua, apenas Rui e
Tony Tornado. Rui parecia que esperava alguém.
Sim. Ele esperava.
Um ônibus apareceu e apenas uma
pessoa desceu dele. Era Yolanda. Ao perceber a presença da mulher Rui ligou o
carro. Ligou e esperou. Esperou que ela
atravessasse a rua.
Yolanda atravessou e Rui não
pensou duas vezes. Acelerou o carro e foi de encontro a Yolanda lhe atropelando.
A mulher voou por cima do carro e caiu do outro lado. Rui parou o veículo e
desceu. Foi conferir.
Chegou perto do corpo e deu um
chute para virá-lo. Yolanda estava com os olhos abertos e saía sangue de sua
boca. Estava morta.
Rui de Santo Cristo olhou por uns
segundos o corpo de Yolanda no chão e comentou “Eu gostei mesmo de você, de
verdade”.
Voltou ao carro e partiu ao som de
“A gente morre na Br-3”.
Não se sabe se realmente Rodrigo
Saldanha tinha provas contra os Cachorros Velozes, a questão é que nessa o
homem faturou três milhões de reais e a questão maior é que a polícia estava
sim de olho neles.
A polícia iniciou uma operação
chamada “Operação Carrocinha” prendendo os Cachorros Velozes. Rui foi levado
pela polícia em casa na frente de Fernanda que perguntava o que estava
acontecendo e o homem respondia que era um engano. Galalite foi levado com a
filha chorando abraçada a mãe e João sentado no sofá recebeu voz de prisão
respondendo “Podem me levar, estou morto”.
As investigações não chegaram a
mim, até porque eu não fazia parte do grupo. Mas aproveitei para relatar que as
histórias que eu contava no blog eram reais, dos Cachorros Velozes. Também não
chegou em Rubinho Barreto.
É mais difícil chegar nos poderosos mesmo.
João Arcanjo e Rui de Santo Cristo
se encontraram na delegacia e João partiu pra cima pra agredi-lo. A polícia
interveio e João gritava que Rui era o cabeça de tudo. O chefe dos Cachorros.
Rui devolvia e gritava que João era corno, tinha perdido a mulher pra ele e por
isso queria se vingar.
Enquanto isso eu acompanhava tudo
de fora com Juliana. Voltara a trabalhar com meu amor e ela no congresso
tentava abrir uma CPI mista sobre os esquadrões da morte.
A grande maioria dos homens do
esquadrão, entre eles João e Rui, foram libertados poucos dias depois.
Galalite, talvez por ser mais pobre e a justiça não ser tão “justa” ficou
preso. Mas Rui prometeu mexer os pauzinhos para soltá-lo.
No mesmo dia, com a ajuda de Rui,
Galalite foi solto.
Fernanda voltara pra casa de
Rodrigo e Rui foi buscar a amante. Rodrigo lhe atendeu e perguntou como fora a
passagem do genro pela cadeia. Rui engoliu em seco respondendo que fazia parte
do passado. Rodrigo, rindo, ironizou “Só espero que não faça do futuro”.
Fernanda apareceu e Rodrigo deixou
os dois a sós. Rui pediu que Fernanda voltasse pra casa e a mulher respondeu
que iria, precisavam conversar.
Foram para a casa de Rui de Santo
Cristo e foderam. Depois Fernanda comentou com Rui “Eu vou deixar você”.
O policial perguntou qual era o
problema e a mulher respondeu “Eu amo o João. Tentei lutar contra isso, mas não
dá, é mais forte que eu e vou voltar pra ele”.
Rui tentou argumentar que a mulher
não sentia amor e sim pena. Fernanda respondeu que era amor e pediu que ele não
tentasse impedir.
O policial sorriu e disse “Somos
adultos. Queria você, mas se você não quer só posso lamentar e desejar que você
seja feliz”. Fernanda sorriu e acariciou o rosto de Rui falando “Você é um cara
legal, merece muito ser feliz”. Rui respondeu que ela também merecia e iria
para a sala deixá-la a vontade para arrumar suas coisas.
Rui saiu, foi para a sala e ligou
o som colocando Janis Joplin enquanto Fernanda fazia a mala. Sentou no sofá e
bebeu um copo de uísque enquanto a mulher estava no quarto.
Fernanda saiu do quarto com a mala
e disse para Rui que iria embora. O policial se levantou e falou “Tenho um
último pedido”. Fernanda perguntou qual era e Rui respondeu “Uma última dança”.
A mulher relutou e Rui insistiu
“Uma última dança, apenas mais uma e você vai embora ser feliz”. Fernanda
concordou e se abraçaram pra dançar ao som de Janis Joplin.
Enquanto dançavam Rui tirou sua
arma da cintura e atirou na barriga de Fernanda. A mulher sentiu o impacto,
passou a mão na barriga sentindo o sangue e começou a cair pedindo ajuda. Rui
olhava para ela e falou “Desculpe Fernanda. Nada pessoal, mas era preciso”.
Fernanda caiu no chão, levantou a
mão pedindo ajuda e Rui sentou no sofá voltando a beber esperando que a mulher
morresse ao som de “Cry baby”.
Fernanda morreu. Rui colocou seu
corpo dentro de um saco plástico preto e depois no porta malas do carro. Vagou
pelo Rio de Janeiro até deixar o corpo em uma praia da Ilha do Governador.
Deixou passar vinte e quatro horas e deu queixa do desaparecimento em uma
delegacia.
Fotos de Fernanda foram
espalhadas. Rodrigo Saldanha desesperado procurava pela filha e eu ajudava João
Arcanjo nas buscas. Três dias depois encontraram o corpo da mulher, já em
decomposição, na praia.
Foi um desespero. João ensandecido
queria se jogar no mar e morrer. Gritava “Duas não!! Perder dois amores não
Deus!!” se referindo a Fernanda e Luciana. Rui chorava em um canto e Rodrigo
Saldanha sentou na areia com olhar vago. Nunca tinha visto o policial daquela
forma. Era o baque final no homem que assim perdia seu terceiro filho.
O enterro foi bastante triste. Eu
consolava um desesperado João Arcanjo enquanto Juliana tentava consolar
Rodrigo. Rui mostrava tristeza, semblante fechado, mas achei mais frio que o
normal para alguém que perdera a mulher.
Em determinado momento Rui de
Santo Cristo se aproximou de nós e disse para João Arcanjo “Ela te amava, ia
voltar pra você”. João começou a chorar compulsivamente e Rui chorou junto lhe
abraçando. João aceitou o abraço e ficaram os dois ali enquanto eu ia embora
com Juliana que amparava Rodrigo. O policial não dizia uma palavra, mas nem precisava.
Juliana levou Rodrigo para casa.
Entraram, se sentaram e Juliana fez carinho em sua mão. Rodrigo então comentou
“Eu só chorei uma vez na vida até hoje. Quando Gabriel morreu. Eu disse para
todos que não tinha filho, me tranquei no quarto e chorei. Chorei a morte de
meu filho”.
Juliana apertava sua mão, beijava
e Rodrigo continuou “Agora perdi meu terceiro filho. Por quê Deus? Por quê? Eu
só tenho a você agora Juliana”. O homem começou a chorar e Juliana lhe abraçou.
Ficaram um longo abraçados e estabelecendo uma relação entre pai e filha.
Alguns dias se passaram e eu
estava sozinho em casa quando a campainha tocou. Abri a porta e dei de cara com
Bia. Dei um abraço em minha querida amiga, tempo que não lhe via. Perguntei
como ela estava e que novidade era aquela de me procurar.
Bia comentou “Eu fui procurada por
uma pessoa que precisava muito chegar a você e não sabia como, soube por uma
conhecida em comum que eu era sua amiga e me procurou. Ela está aqui pra falar
com você”.
Perguntei quem era e Bia pediu que
a mulher entrasse. A mulher, com jeito tímido, entrou e disse.
“Você não me conhece, mas já ouviu
falar de mim, me chamo Yolanda”.
Respondi que ouvira sim e pedi que
as duas se sentassem. Yolanda, nervosa, comentou “Era pra eu
estar morta. Se ele não fosse tão arrogante, não pensasse só em si e prestasse
atenção no que os outros dizem eu estaria morta”.
Perguntei “Ele quem?” e ela voltou
no tempo. Yolanda e Rui estavam em um quarto. Ele andava agitado pelo local e
ela na cama contou animada “Minha irmã gêmea Yoná chega amanhã de São Paulo,
anos que não vejo a minha irmã”. Rui não deu ouvidos e comentou “Já sei como
pegar o João de vez. Fotos anônimas. Vou mandar para Fernanda”. Irritada
Yolanda perguntou “Ouviu nada que eu disse né?”.
Rui se aproximou da mulher, deu um
beijo em sua testa e respondeu “Depois amor, vamos elaborar o plano”.
Yolanda me contou essa história e
disse “Ele não prestou atenção que eu tinha uma irmã gêmea e matou a Yoná
pensando que fosse eu! Desgraçado! Eu quero acabar com ele!”. Perguntei porque
ele queria matá-la e Yolanda respondeu “Porque eu sei demais”.
Bia pediu que Yolanda me contasse
e ela abriu o jogo todo.
Voltemos no tempo então.
Paulo Arcanjo, pai de João e
Inácio de Santo Cristo, pai de Rui, bebiam cerveja em um bar na Baixada
Fluminense. Inácio estava reticente “Isso vai dar merda Paulo”. Paulo bebeu
mais um gole de cerveja e respondeu “Merda? Que merda? É um plano perfeito e
vamos faturar um bom dinheiro!”. Inácio olhou para os lados e comentou baixinho
“Mas é seu filho pô”.
Paulo respondeu “E você acha que
eu quero mal pro meu filho? Essa grana é para o futuro dele,
do seu também. Meu pai é mão de vaca, só vai me arrumar dinheiro com algo
assim”. Inácio repetia que daria merda Paulo perguntou “Não vai dar merda, você
tem o cara pra isso?.
Inácio respondeu que sim, tinha um
policial conhecido e acima de qualquer suspeita. Paulo sorriu e disse “Ótimo,
vamos executar o plano”.
A verdade era essa. Paulo Arcanjo,
pai de João, organizara o sequestro do próprio filho tendo Inácio de Santo
Cristo como parceiro do crime.
Mas a coisa não saía como a dupla
planejou. O pai de Paulo não se manifestava e o homem teve que apelar. De um
orelhão ligou para Inácio e disse “Meu pai não ta ajudando. Teremos que
apelar”. Inácio do outro lado da linha perguntou o que fazer e Paulo,
friamente, respondeu “Pontinha da orelha, corte a ponta da orelha dele”. Inácio
perguntou “Ta maluco? Porra é seu filho!”. Paulo deu a ordem “É só parte de uma
orelha, com cirurgia se dá um jeito, precisamos da grana”.
Aí o plano funcionou. Salvador
Arcanjo entrou em ação e o resgate foi pago. Só que a ganância de Inácio falou
mais alto e o homem deu uma parcela bem menor para os outros membros da
quadrilha. Paulo alegava que era impossível, ele tinha visto o pai colocar o
dinheiro no saco plástico e Inácio perguntou “Quer perguntar pra ele o valor
exato?”.
Paulo não quis perguntar, traria
suspeita pra cima dele e ficou com o que lhe foi dado, mas nem todo mundo
aceitou.
Uma noite Rui estava de castigo no
quarto quando bateram na porta. Um homem de farda perguntou por Inácio e este
quando viu o homem se assustou e disse “você?”. O homem gritava perguntando por
sua grana e o resto da história vocês já sabem.
O que vocês não sabem é que depois
da chacina enquanto se escondia pra sobreviver Rui viu o rosto do homem que
acabou com sua família. O homem que era sócio de Paulo e Inácio no sequestro.
Rui viu o rosto de Rodrigo
Saldanha.
Sim. Rodrigo Saldanha era o
responsável por toda a desgraça na vida de Rui de Santo Cristo, por sua
tragédia, pelo fim de sua família. Rui se livrou da morte, mas a morte não saiu
de dentro dele. Chorando com o corpo da mãe sobre o colo e olhando o corpo do
pai e de seus irmãos Rui prometeu “Eu vou me vingar, eu vou fazer esse
desgraçado pagar por tudo que fez”.
A vida de Rui de Santo Cristo a
partir dali foi dedicada a se vingar de Rodrigo Saldanha e de todos que fizeram
seu pai morrer.
Começou por Paulo Arcanjo. De moto
e com capacete o jovem Rui de Santo Cristo fuzilou o pai do melhor amigo.
Depois decidiu que destruiria Rodrigo Saldanha, mas aos poucos.
Rui decidira que matar Rodrigo
seria muito fácil, primeiro tinha que fazer o homem sofrer.
Descobriu o envolvimento de
Gabriel com drogas e junto com comparsas matou o filho de Rodrigo. Depois na
faculdade conheceu Luciana, a quem seu grande amigo se interessou e viu ali uma
ponte pra continuar atrás de seu objetivo.
Chegou em Galalite e pediu
“Preciso de uns caras barra pesadas pra fazer um serviço. Nós não podemos
participar, eles não podem me ver”.
Rui passou todas as instruções e
Galalite encontrou os caras. O bandido mostrou a foto de uma mulher e disse a
eles “Vocês precisam dar um fim nela, mas não quero execução pura e
simplesmente. Vocês têm que fazer de um modo que pareça assalto, sequestro
relâmpago, qualquer parada”. O líder dos homens olhava a foto e perguntou
“Bonitinha, pode esculachar?”. Galalite respondeu que eles poderiam fazer o que
quisessem, mas ela teria que estar morta no fim.
O bandido riu e comentou “Pode
deixar chefia, eu como essa bucetinha e depois encho de tiros”.
Era Luciana.
Os homens já esperavam Luciana no
posto de conveniência. Ela não foi a pessoa errada na hora errada e depois
ficou fácil para Rui organizar a vingança e caçar um a um com os detalhes de
cada bandido dado por Galalite. Galalite não pôde participar da chacina contra
os bandidos por esses conhecê-lo. Inventou uma desculpa e não foi.
Deu tudo certo. Rui matou a filha
de Rodrigo, saiu como herói e ainda envolveu João Arcanjo na criminalidade.
Mas João era reticente. Ainda não
tinha aceitado entrar pro crime. Aí Rui de Santo Cristo incendiou a farmácia do
homem para ganhá-lo de vez.
Rui de Santo Cristo precisava de
João Arcanjo por perto, precisava através dele entrar no seio da família
Saldanha e assim chegar a terceira vítima. Fernanda.
Yolanda contou “Rui queria separar
João da Fernanda, mas eu não imaginava que fosse para ficar com ela. Até então
eu pensava que ele queria a desgraça de João ainda pela vingança em relação ao Paulo.
Mas depois, quando vi Rui e Fernanda juntos, percebi que na verdade ele queria
dar fim ao terceiro filho do Rodrigo”.
Perguntei se ela achava que Rui
matara Fernanda e a mulher respondeu “Tenho certeza. Rui está por traz de tudo
que ocorreu esse tempo todo e outra. Foi o Rui que explodiu a sala do seu
filho, mas a mando de Rubinho que queria se livrar de Donato, você matou o cara
errado”.
Estarrecido botei as mãos na
cabeça e não acreditava no que ouvia. Tudo fez parte de uma vingança cruel e
sórdida em que inocentes pagaram. Lamentei “Gabriel, Luciana, Fernanda. Eles
eram tão inocentes quanto Rui”.
Bia pegou minha mão e disse que
era melhor que eu ligasse para João Arcanjo.
Liguei. João foi até a minha casa
e estranhou a presença de Yolanda. A mulher, chorando, pediu desculpas e disse
que precisava lhe contar uma história. Contou a mesma história.
João Arcanjo ficou incrédulo como
eu. Ficamos em silêncio um tempo e João comentou “Esse cara me odeia”. Yolanda
respondeu que não “Você era o cara errado no lugar errado, se meteu no meio da
vingança”. João sacudiu e Yolanda e perguntou como ela pôde fazer tudo aquilo com ele.
Chorando ela respondeu “Os crimes já tinham ocorrido e eu te seduzi porque
amava Rui. Era louca por ele”.
João soltou Yolanda e perguntou
“Ele matou os três filhos do Rodrigo. O que falta agora? Matar o velho?”. Bia
olhou séria pra mim e respondeu “Ainda falta uma, uma filha”.
Naquele instante levantei a
cabeça, olhei Bia e meu corpo gelou. Balbuciei “Juliana”.
João não entendeu porque citei
Juliana e nervoso liguei para seu celular. Estava fora de área. Levantei e disse
que precisava ir à mansão. João respondeu que iria atrás de Rui e assim saímos.
Tentava falar com ela pelo celular
e não conseguia, prosseguia fora de área.
Entrando na mansão Guilherme apareceu
e disse que sua mãe saíra e inclusive esquecera o celular em casa. Perguntou se
ocorrera alguma coisa, mas saí sem responder.
Vaguei pela cidade sem sinal
nenhum dela. Desesperado pediu uma luz quando Lucinho surgiu ao meu lado no
carro e disse “Segue pra Linha Vermelha”.
Perguntei porque e ele respondeu
“Não discute, vai”. Peguei a Linha Vermelha e estava um engarrafamento
monstruoso. Lucinho, sem me olhar e apenas olhando para frente disse “Desce e
corre”.
Pronto, me desesperei e desci do
carro correndo para frente do engarrafamento. Encontrei uma ambulância, um
carro do corpo dos bombeiros e uma pessoa sendo tirada de um carro capotado.
Era Juliana.
Continua..
ERA DA VIOLÊNCIA 2 (CAPÍTULO ANTERIOR)
JOGOS DA PAZ EM TEMPOS DE GUERRA (1° PARTE)
LINK RELACIONADO (LIVRO ANTERIOR)
Comentários
Postar um comentário