XIX - O inferno
Procuraram Lucas por todo o morro e não encontraram. Lucas tomara “chá de sumiço” ninguém tinha notícias dele.
Jéssica procurou Mayara e perguntou se ela tinha notícias do irmão. Mayara respondeu que não e que a últma vez que teve notícias do rapaz foi quando pegou taxi com ele. Jéssica perguntou quando foi e Mayara respondeu que mais ou menos vinte dias antes.
Jéssica calculou e percebeu que foi o período que Lucas ficou mais introspectivo, calado. Agradeceu a Mayara que pediu que ela contasse qualquer novidade.
Procurou em seu ponto de taxi e os outros taxistas responderam que não tinham notícias de Lucas. Hospitais, IML nada. Jéssica decidiu voltar ao morro e procurar onde devia desde o início.
Jéssica foi até a boca de fumo para surpresa de Mariano. O irmão perguntou o que Jéssica fazia ali e ela quis saber onde estava Lucas.
Mariano se fez de desentendido e contou a irmã que não teve contato com o irmão desde que ele saiu do presídio. Jéssica gritou pedindo que Mariano não mentisse para ela e o traficante respondeu que não mentia.
Jéssica muito séria falou para Mariano que se descobrisse que ele mentia se veria com ela.
Saiu da boca e foi pra casa rezar com Dora por Lucas.
Enquanto Jéssica procurava desesperadamente por ele Lucas entrava em um pequeno hotel daqueles bem vagabundos na Lapa acompanhado de uma mulher.
Entrou com o atendente perguntando quando ele pagaria o aluguel. Lucas respondeu ao homem não se preocupasse que no dia seguinte acertaria tudo.
Subiu com a mulher e entrou no quarto. O quarto estava um lixo, todo bagunçado. Havia rachaduras na parede, ratos e baratas passeando, goteiras e cheiro de mofo.
Lucas e a mulher estavam visivelmente drogados. A mulher ria e falava que nunca estivera em um quarto com um homem famoso. Lucas respondeu que não era mais famoso, queria mais é que todos lhe esquecessem.
Lucas abriu um pacote repleto de cocaína e falou que iriam se divertir muito naquela noite. A mulher riu e pegou no rosto de Lucas falando que assim se apaixonava. Lucas passou o dedo na droga e depois no nariz da mulher deixando o mesmo branco e se beijaram.
Drogaram-se e transaram a noite toda. Lucas continuava dirigindo o taxi e todo dinheiro que ganhava gastava com drogas. Subia o morro do Dendê de madrugada em um horário que sabia que Dora e Jéssica não lhe veriam para comprar.
Às vezes comprava com o irmão e ia embora, em outras ficava no morro cheirando com Mariano.
Já chegara a informação em Jéssica desse hábito de Lucas e ela ficou atenta para a próxima vez que o irmão fosse.
Uma noite dormia quando bateram na janela avisando que Lucas
estava na favela. Jéssica colocou uma roupa e foi ao alto do morro encontrar os irmãos.
Foi até a boca de fumo e encontrou Lucas e Mariano usando drogas. Entrou furiosa esmurrando Mariano falando que ele era um mentiroso e destruía as pessoas. Os traficantes apontaram seus fuzis para Jéssica e ela corajosa foi para frente de um mandando que atirasse.
Mariano mandou que seus comparsas abaixassem as armas e Jéssica virou para o irmão mandando que Deus tivesse piedade de sua alma ruim.
Mariano respondeu que não era ruim, a vida lhe fez assim e Jéssica discordou falando que nós que escolhíamos nossos caminhos, ele escolheu o caminho do mal e pagaria por isso.
Puxou Lucas para o lado de fora para conversar. Perguntou pela TV de plasma e o home theater e Lucas sem encarar a irmã nos olhos respondeu que sabia de nada.
Jéssica desolada perguntava a Lucas “por quê?” e Lucas olhando pro chão nada respondia. A mulher com lágrimas nos olhos falou que fez tudo por ele, ficou ao seu lado quando todos lhe abandonaram e ele devolveu com aquela punhalada lhe traindo.
Lucas pediu desculpas e Jéssica respondeu que não poderia fazer nada mais por Lucas e que se ele resolvesse lutar e tentar de verdade ser uma pessoa melhor sabia onde lhe encontrar.
Virou as costas e caminhou em direção a sua casa. Enquanto andava gritou que Lucas avisasse a Mariano que o irmão morreu pra ela.
Não demorou muito para que Mariano não morresse apenas pra ela.
O traficante se sentia cada vez mais poderoso e parou de ajudar seus companheiros na cadeia e pagar a proteção da polícia. Sentia-se imortal e que nada pudesse lhe atingir. Grande engano, por mais poderoso e temido que é um traficante ele tem prazo de validade.
Em algum momento será preso ou morto. Em algum momento o inimigo lhe acerta ou é traído. Em algum momento apesar do dinheiro e do poder a conta é cobrada e é mostrado que aquele tipo de vida não compensa.
Uma conspiração foi feita pelas costas de Mariano. Tcheco, seu principal aliado foi fortalecido pelos policiais corruptos e outros traficantes da facção de Mariano para que lhe traísse.
Uma noite Mariano estava sozinho na boca sentado e cheirando quando Tcheco entrou e pediu que o traficante fosse para o lado de fora porque precisavam conversar.
Mariano perguntou qual era o problema e Tcheco respondeu que era nada demais, mas que preferia falar do lado de fora. Mariano concordou e acompanhou Tcheco.
Ao sair Mariano encontrou o bando e perguntou o que acontecia. Tcheco respondeu que era hora de morrer. Deu um soco em Mariano que caiu no chão.
Mariano no chão olhou para o bando que apontou seus fuzis para ele e atirou.
Atiraram umas cem vezes massacrando Mariano. No fim Tcheco deu a ordem de parar e que o Dendê tinha um novo comando dando rajadas para o alto.
Decidiram dar fim a Mariano com requintes de crueldade. Esquartejaram o corpo do traficante espalhando pelo morro e jogaram futebol com sua cabeça para mostrar quem mandava.
Ao contrário de Mariano que implantou uma política de boa convivência na favela Tcheco implantou o terror. Proibiu os bailes funk na comunidade e colocou toque de recolher a partir das dez da noite e quem fosse visto perambulando depois desse horário sofreria punições.
Tcheco decidiu perseguir quem foi aliado de Mariano e expulsou Jéssica e Rubens do morro. Em uma manhã chuvosa o casal junto com Sophia foi obrigado a desocupar sua casa na favela com bandidos armados vigiando a saída.
Dessa forma, com essa animosidade Lucas subiu o morro.
Lucas não sabia que Mariano fora assassinado e subiu o Dendê tranquilamente como se nada ocorrera. Entrou na boca e encontrou Tcheco, perguntou por Mariano e se tinha chegado “algo de bom” na favela.
Tcheco chegou perto de Lucas sorrindo e lhe deu um tapa na cara. Lucas perguntou o que estava acontecendo e Tcheco gritou que seu irmão caiu e quem mandava ali era ele.
Lucas assustado continuava sem entender quando Tcheco pegou um caderninho com anotações da boca e mostrou uma dívida de Lucas perguntando como ele pagaria. Lucas respondeu que não tinha dinheiro e Tcheco lhe deu um soco.
Com Lucas caído no chão Tcheco perguntou de novo como o rapaz lhe pagaria.
Lucas disse novamente que não tinha dinheiro e Tcheco mandou que os outros traficantes surrassem Lucas.
Bateram em Lucas a noite toda. Ele desmaiava e jogavam água gelada em seu rosto para que acordasse e apanhanhasse mais. No fim Tcheco disse a Lucas que sabia que ele deixara uma “namoradinha” na favela e que se ele não arrumasse o dinheiro em vinte e quatro horas barbarizaria Dora e depois lhe acenderia no microondas.
Microondas é o termo usado por traficantes para o assassinato em que são colocados pneus na vítima e ela é incendiada.
Lucas arrebentado e desesperado desceu o Dendê pensando em alguma forma de salvar Dora. A única alternativa que escontrou foi vender o taxi. Vendeu o carro por um preço bem mais barato tomado pelo desespero e subiu a favela com a quantia que devia.
Tcheco contou o dinheiro e viu que estava certo. Deu um soco em Lucas e mandou que ele nunca mais pisasse no Dendê senão morreria. Lucas ouviu a ordem e foi embora.
Ele nasceu, foi criado e levou o nome do Dendê para o mundo e agora estava proibido de pisar na comunidade.
Descendo a favela encontrou com Dora que surpresa e feliz correu ao seu encontro e lhe abraçou perguntando se tinha voltado pra ficar. Lucas pediu que Dora não lhe apertasse e nesse momento a moça viu que ele estava machucado.
Dora falou que Lucas devia cuidar daqueles ferimentos e convidou para que fosse a sua casa. Lucas respondeu que não podia e tinha que ir embora da favela e Dora respondeu que pelo menos ele fosse a sua casa fazer curativos.
Lucas acabou aceitando e indo com Dora.
Entrando na casa perguntou por Damião e Dora respondeu que estava trabalhando. Dora pediu que Lucas se sentasse que pegaria metiolate e band aid.
Lucas sentou e Dora se aproximou. Passou metiolate no canto de sua boca e band aid. Chegou com o corpo muito próximo de Lucas que lhe beijou.
Dora correspondeu o beijo e o mesmo foi aumentando de intensidade. Lucas pegou no seio de Dora que mandou que o rapaz parasse.
Dora também era evangélica e mesmo namorando os dois nunca foram para cama. Dora queria se manter virgem para o casamento.
Lucas não parou e jogou Dora no sofá. Jogou-se em cima dela e Dora gritava desesperada. Lucas abriu sua blusa e beijava seu corpo quando Damião entrou na sala e puxou Lucas lhe dando um soco.
Dora se cobria chorando e envergonhava enquanto Damião gritava mandando Lucas embora da casa. Lucas furioso gritou “eu perdi meu taxi por causa dessa piranha!!” e foi embora enquanto Damião consolava sua irmã.
Lucas voltou para o hotel e não conseguiu abrir a porta do quarto. Desceu e contou ao atendente que não conseguia abrir.
O homem respondeu que a fechadura fora trocada devido a sua falta de pagamentos e que ele fosse embora. Lucas tentou argumentar que estava com dinheiro, sobrou um pouco da venda do taxi e pagaria, mas o homem não lhe deu ouvidos e mandou que se retirasse.
Lucas vagou com aquele dinheiro na mão. Foi até a Vila Mimosa e arrumou uma prostituta para transar.
Transou com ela e lhe deu um dinheiro para que comprasse drogas.
Deu bastante dinheiro e ela comprou. Voltaram para o lado debaixo da casa e Lucas ficou bebendo e cheirando com a prostituta. A mulher acabou chamando outras que compartilharam com o rapaz.
Uma delas deu idéia para que fossem para outro lugar e Lucas concordou indo com quatro mulheres para o quarto de um hotel próximo.
Lucas bebeu e cheirou a noite toda com as mulheres e adormeceu.
Quando acordou não tinha mais mulher nenhuma. Acordou com uma grande dor de cabeça e levantou. Pegou sua calça e dentro dela a carteira.
Foi o momento que percebeu que não tinha nada.
Lucas se desesperou. Procurou pelo quarto todo e não achou o dinheiro.
Lembrou-se das mulheres e percebeu que foi assaltado.
Desceu e o dono do hotel lhe perguntou pelo pagamento. Lucas respondeu que não tinha e foi obrigado a fazer faxina no local para pagar sua dívida.
Perambulou sem rumo pela cidade, sem dinheiro. Ele achava que tinha encontrado o fundo do poço quando foi preso, mas parecia que o fundo não tinha fim. Sem dinheiro, sem emprego, sem ninguém mais pra lhe estender a mão Lucas passava por um momento dramático.
Com fome, sem ter onde ficar e desesperado para se drogar Lucas viu a chuva começar a cair e molhar o seu rosto. Cansado do dia que teve, cansado da vida que tinha viu um grupo dormindo embaixo de um viaduto e se aproximou.
Pediu licença e perguntou se podia ficar ali. Um homem virou para ele e perguntou “Você não é o..” antes que completasse por vergonha Lucas respondeu que não, apenas era parecido.
O homem permitu que ele ficasse e Lucas se sentou. Arrumou um papelão e deitou-se em cima. Olhava para cima, pro viaduto e viu ali um simbolismo. Os carros passando em cima e ele embaixo. Começou a chorar com suas lágrimas molhando o rosto enquanto a chuva molhava o chão.
O homem se aproximou com um cachimbo e mandou Lucas fumar que aquilo aliviaria sua tensão. Lucas perguntou o que era e o homem respondeu “crack”.
Lucas ficou ressabiado sem saber se aceitava, mas seu corpo sentia necessidade de drogas e acabou aceitando.
Lucas pela primeira vez fumava uma pedra de crack e assim conhecia o inferno.
Lucas não conseguiu emprego fixo e se virava com “bicos” arrumando um trabalho aqui e outro lá. Gostou de usar crack, abandonou as outras drogas e todo o dinheiro que conseguia gastava comprando pedras.
Com o tempo não conseguia mais trabalhar devido o crack e começou a perambular pela “crackolândia” para tentar conseguir a droga. Usava e depois ficava com outros crackeiros parecendo um zumbi naquele local que mais lembrava um “umbral”. Lucas não tinha mais vida.
Ele usava drogas há um bom tempo, mas crack era diferente, uma droga que vicia rapidamente e seu efeito era devastador e foi assim com Lucas que se tornou viciado e precisava de dinheiro para manter seu vício.
Começou a assaltar. No começo pequenos furtos onde pegava bolsas e saía correndo. Com o tempo arrumou arma de fogo e assaltava mercadinhos, bancas de jornal, lanchonetes. Lucas que um dia assaltou para salvar sua irmã agora assaltava pra alimentar seu vício.
Pensou aonde poderia conseguir um bom dinheiro e se lembrou de Mayara indo até sua casa.
Lucas se escondeu no outro lado da rua pensando na melhor forma de invadir a casa e roubar. Sentou-se encostado no muro de uma casa e passou a tarde observando.
No fim da tarde viu Mayara, Jonas e Jonatan saindo da casa. Viu os três, mas se imaginou no lugar de Jonas junto com sua ex e seu filho feliz entrando em um carro para passear.
Por alguns segundos caiu na real e sentiu pena de si. Era ele pra estar lá e não Jonas a quem considerava um traidor por estar roubando sua mulher, filho e sua vida. Lucas não tinha que estar ali tentando roubar, tinha que estar em cima de um palco ou na televisão mostrando sua arte.
Lucas chorou vendo Jonas colocar Jonatan no banco de trás e dando um beijo em Mayara antes de entrar no carro. O carro partiu e Lucas ficou sem reação quando um homem passou e jogou uma nota de cinco reais nele.
Era isso. Lucas tinha virado mendigo, tinha aspecto de mendigo. Sentindo-se humilhado, acabado pra vida desistiu do assalto e voltou pra crackolândia.
Lá usou os cinco reais para comprar pedra e fumou crack.
Mas ele queria mais e saiu vagando pelas ruas pedindo dinheiro para as pessoas que lhe negavam. Viu um homem negro de costas e tocou em seu ombro pedindo dinheiro. Quando o homem se virou Lucas tomou um susto. Era Balão.
Lucas com olhos esbugalhados e sob efeito do crack gritava que o pai não podia estar ali, estava morto e Balão perguntava se o filho não tinha vergonha do que se transformara. Lucas tentou argumentar quando ouviu o choro de uma mulher que saiu de trás de Balão. Era Jurema.
Lucas pediu desculpas para a mãe enquanto Balão mandou que Lucas se afastasse dela. O rapaz foi para trás de costas e esbarrou em um homem, Virou-se para trás pra pedir desculpas e viu Wilson que lhe chamou de assassino.
Lucas botou as mãos na cabeça tonto com aquela situação enquanto Mariano lhe falava que tinha cocaína da boa pra lhe vender. Lucas começou a gritar que eles estavam mortos quando Léo apareceu.
Lucas se ajoelhou na frente de Léo pedindo perdão por tudo e Léo mandou que ele levantasse. Lucas levantou e Léo disse que não era a ele que tinha que pedir perdão, mas para si mesmo.
Lucas contou chorando a Léo que não aguentava mais e Léo respondeu que só ele poderia mudar o seu destino. Naquele momento Lucas viu Balão, Jurema, Mariano e Wilson andarem atrás dele e desesperado correu pro meio da rua sendo atropelado.
Lucas caiu no chão e o motorista nervoso desceu do carro perguntando se ele estava bem e que era louco de andar na rua daquela maneira.
Lucas se contorcia de dor quando o motorista se abaixou surpreso e falou “Peraí, eu conheço você!!”.
Lucas aproveitou a distração do motorista, pegou sua carteira e saiu correndo com o motorista gritando “pega ladrão”.
Uma viatura da polícia passou no momento e o motorista contou que fora assaltado apontando para Lucas correndo. A polícia ligou a sirene e acelerou rapidamente chegando a Lucas.
Lucas foi preso e rapidamente a imprensa ficou sabendo e apareceu na delegacia para tirar fotos do rapaz. Lucas que sempre foi conhecido por sua vaidade e corpo atlético foi preso vestindo farrapos, com cabelo, barba grande, corpo magro e olhar assustado.
Tentaram arrancar alguma declaração dele. Mas não conseguiram. Lucas voltava a mídia da pior forma possível.
E pior, como estava em condicional voltaria ao presídio para cumprir sua pena.
Lucas conheceu o inferno e não conseguia mais sair dele.
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